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Etnomarketing ajuda a dimensionar o mercado, por Susana Costa e Silva e Carolina Martins (Católica Porto)

Por a 28 de Janeiro de 2013 as 15:25

Susana Costa, professora da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa (Porto)

Por Carolina Martins e Susana Costa e Silva, respectivamente, aluna e professora da disciplina de Marketing do Mestrado em Gestão da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, Porto

Hoje em dia, designa-se por etnomarketing a junção entre os estudos etnográficos e o processo de marketing. Desta forma, etnomarketing, tal como Páramo (2004) descreveu, é o processo social que concebe e implementa as três funções do marketing: perceber o consumidor, conquistar clientes e conservá-los por intermediação de uma observação de pessoas no seu ambiente habitual.

Com o mercado saturado, as empresas vêem-se obrigadas a investir em inovação tanto com o objectivo de criar novos produtos/serviços como melhorar os que já têm. Porém, a questão que antecede todas as etapas para colocar um produto/serviço no mercado é: “Que produto vender? ; ou, Que serviço prestar?”. E é nesta pré-fase que entra a etnografia, cujo objecto de estudo são os actuais ou possíveis consumidores. Esta prática dá às empresas a oportunidade de estudar o consumidor nas três fases do processo de consumo: na pré-compra, na compra e no pós-compra.

As empresas começaram a ganhar consciência de que, para vender, é necessário estudar o mercado no próprio mercado, ainda mais nos tempos que correm em que este está em constante movimento e apresenta uma enorme diversidade cultural. Sendo, por isso, necessário para o conhecer interagir com ele. Também é verdade que existe uma multiplicidade de factores que influenciam a compra, que, por sua vez, tende a ser cada vez mais complexa. Tal como Flemming Ostergaard, director de marketing da Lego, disse, “se queres saber como um leão caça, não vais ao Zoo, vais à selva”.

Desta forma, tal como Edwin Colyer defendeu no artigo “Taking a Closer Look at Your Customers”, é importante salientar que as conclusões tiradas de estudos com base em perguntas e respostas, como inquéritos ou focus group, acabam por se distanciar em muito das conclusões de um estudo etnográfico feito no próprio mercado.

Se se perguntar a um estudante universitário com que regularidade lê jornais ou revistas científicas muitos irão responder um número bastante superior à realidade. Mas, se se observar quantos efectivamente consultam jornais ou os procuram na internet, os resultados tenderão a ser mais reais. Seguindo esta linha de pensamento, pode-se mesmo afirmar que a importância desta prática se eleva ao ponto de permitir obter respostas a questões que os próprios consumidores não saberiam responder.

Assim, se se perguntar a um estudante universitário quais os factores que tem em conta na aquisição de um jornal, este irá dar respostas práticas como por exemplo, o “preço”, mas, inconscientemente, pode escolher um jornal em detrimento de outro pela textura do papel ou porque, desde pequeno, viu o pai a lê-lo. Para que estas respostas sejam dadas deve-se determinar como fazer o estudo. Talvez seja necessário ir a casa dos consumidores, às lojas que eles frequentam ou ao local onde o bem é utilizado. Isto obriga a que consideremos a etnografia como um método de pesquisa válido e adequado nalgumas circunstâncias. Esta decisão depende de três factores: objectivo, tempo e budget.

A verdade é que para saber os desejos e valores do consumidor, o que o incentiva a comprar (emoção, motivação, contexto) e qual a relação que o consumidor tem com as marcas, as empresas têm de suportar um custo elevado. Tal como Fabián Echegaray, Director-Geral da Market Analysis, referiu este custo justifica-se pelo tempo que a pesquisa requer e pelos profissionais experientes que é necessário recrutar para tal tarefa. Estes custos devem ser vistos como um investimento de longo prazo. Se for construída a ponte entre o qualitativo e o quantitativo mediante a interpretação de pessoas formadas nas áreas de comportamento humano e marketing, a empresa poderá planear uma estratégia mais assertiva no mercado.

O etnomarketing ajuda a dimensionar o mercado evitando erros comuns nas estratégias de marketing, apresenta de forma clara a segmentação, pois os consumidores tendem a aproximar-se daqueles que consomem as mesmas marcas, e ainda auxilia na decisão do target do produto/serviço. Inúmeros benefícios emergem desta prática fazendo com que empresas, como a Microsoft, se desloquem a casa dos clientes para observá-los a montar o seu novo equipamento informático em vez de chamar à empresa voluntários que provavelmente teriam maior experiência no assunto e não iriam transmitir uma visão real da sociedade.

Outro exemplo é dado pela Toyota que acompanha condutores no dia-a-dia, de forma a observar como conduzem e de que forma utilizam os extras do carro. Outras multinacionais como a Procter&Gamble encontraram no etnomarketing a solução para estudar as necessidades dos clientes dispersos pelos diversos países onde os seus produtos são comercializados. Não obstante, o custo e o tempo do estudo etnográfico continuam a ser limitações para muitas empresas, de tal forma que Patrick Whitney e Vijay Kumar desenvolveram uma metodologia que atenuasse estas limitações. A “User Insight Tool”, ferramenta especialmente desenhada para o sector empresarial, baseia-se no uso de câmaras descartáveis, cadernos de campo, e um software especial, capaz de desvendar novos entendimentos pela auto-observação dos consumidores, sem que seja necessário uma observação constante da parte de um etnógrafo. Assim se prova que grandes passos estão a ser dados no desenvolvimento desta prática no mundo empresarial.

É um facto que muitas empresas conhecem a etnografia como ferramenta de estudo. Porém, quando a procuram adaptar ao mercado, surgem desvantagens na sua aplicação. É que enquanto os antropologistas podem demorar anos com a realização de uma pesquisa, as empresas precisam de resultados em poucas semanas. É por isso necessário que exista uma maior informação sobre o que é e o que não é etnografia e de que forma o marketing a pode utilizar. Em suma, o etnomarketing permite estudar de forma qualitativa os consumidores e é por isso uma óptima ferramenta para melhor conhecermos o mercado. Todavia, sem uma análise quantitativa posterior, nenhuma estratégia poderá ser formulada. Logo é necessário que se pondere bem o uso desta ferramenta que, apesar de custos elevados e da necessidade de pessoal qualificado, pode proporcionar resultados de outra forma impossíveis de conseguir.

 

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