Opinião

As private labels estão pois para ficar

Por a 29 de Maio de 2009 as 5:48

manuel rocha

Quando o consumidor perceber que as Private Labels já não são um segmento seguro, vão tender a abandoná-las

Nesta minha última viagem a Paris, para visitar a Foods&Goods, tive como companheiro de visita o dono de uma cadeia inglesa de supermercados. Conversa puxa conversa e ele dizia-me alegremente que neste inicio do ano estava a crescer 40% like-for-like, sem ter em conta as novas aberturas de lojas que tem vindo a fazer… e isto tudo com o clima de recessão económico que se está a viver também no Reino Unido, agravado ainda mais pela desvalorização da moeda.

Qual a razão do sucesso? São 75 lojas, com áreas entre os 500-1500 m2, com um sortido de 3000 artigos, todos com um preço de venda ao público de 99 penny. A cadeia chama-se “99p stores”. Um dos factores críticos de sucesso? Ser mais barato 1 penny que o seu principal concorrente que vende tudo a 1 libra, a cadeia “Poundland”. Como conseguem estas cadeias ter um sortido de 3000 artigos a este preço de venda? Simples. A maior parte do negócio está sustentada em private labels, que são maioritariamente compradas directamente a produtores em países com grandes economias de escala e baixos custos de produção, como a China, Tailândia, Índia, Paquistão, etc.

O restante negócio de Marcas Nacionais e Multinacionais é suportado em diferentes formatos exclusivos para estas cadeias. Por exemplo, se não existe margem para vender a este preço um pacote de biscoitos de 1 kg, é criado um novo formato de 600 gramas que permite ter um preço de venda ao público de 99p.

Na Food&Goods as private labels eram a raison d’être, e muitos produtores, maioritariamente médias empresas, em desespero de causa, querem entrar a todo o custo neste negócio, para minimizar os efeitos da crise que se está a viver. As private labels são um negócio com algumas características particulares. Nem todos os retalhistas e nem todos os produtores têm consciência disto. Enquanto as private labels forem geridas de forma correcta, ou seja, uma qualidade próxima ao dos produtos de Marca e com um preço de venda ao público significativamente inferior, isto é, com um ratio preço/qualidade vantajoso para o Consumidor, será sempre um segmento atractivo, ainda mais neste clima de crise. A grande tentação é que os retalhistas vão continuar a querer preços ainda mais baixos e vão pressionar os produtores de private labels a baixar cada vez mais os preços. Acredito que muitos vão facilitar na qualidade dos produtos. Quando o Consumidor perceber que as private labels já não são um segmento seguro, vão tender a abandoná-las ou a procurar os retalhistas que ainda não sendo os mais baratos apresentam níveis de qualidade garantida nas suas Marcas próprias. No futuro com a retoma da economia, os Consumidores farão a grande decisão. As insígnias que conseguiram fidelizar os seus Consumidores, oferecendo o melhor ratio preço/qualidade das suas private labels, terão a vantagem de explorar as oportunidades da retoma económica. Aquelas que, mesmo inadvertidamente puserem em causa a qualidade das suas private labels, só para ter os preços mais baixos e recrutar clientes em tempo de crise, dificilmente conseguirão manter uma base de clientes fiel aquando da retoma.

Não sendo uma preocupação generalizada, havia alguns retalhistas na Foods&Goods que encaravam as private labels com muitas interrogações… pois mesmo conseguindo as mesmas ou maiores margens (relativas) com as private labels, muitas vezes só conseguiam o mesmo profit da venda de uma unidade de Marca se vendessem 3 unidades da sua private label. Ou seja, ainda que aumentando o tráfego das suas lojas e a penetração de clientes, a rotação média dos produtos private label tem muitas vezes que mais do que duplicar para que a margem (absoluta) seja mantida. No entanto muitos retalhistas encaram este fenómeno como a oportunidade de ganhar share-of-market e aumentar a base de clientes a fidelizar.

O outro grande desafio dos retalhistas com as private labels é que estas deixem de ser unicamente “me too’s”, ou seja, unicamente substitutos de produtos de Marcas e passem a apostar no desenvolvimento e inovação, tal como as restantes Marcas. É sem dúvida uma das estratégias que os retalhistas podem utilizar para comunicar o seu posicionamento, ou seja através da qualidade, modernidade e novidade das suas private labels.

As private labels estão pois para ficar. É uma oportunidade real quer para retalhistas quer os produtores. Como em tudo nos negócios, será uma vantagem para aqueles que conseguirem adaptar a sua estratégia a esta nova realidade. Infelizmente para muitos as private labels não serão a tábua de salvação nesta crise.

Manuel Rocha, Director-geral da PortuVinus Wine & Spirits, SA

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