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“Continuamos a ser orgulhosamente ‘O Licor de Portugal’”

Por a 1 de Janeiro de 2024 as 18:00
Licor Beirão - entrevista ao Hipersuper

Por ano, são produzidas cerca de quatro milhões de garrafas de Licor Beirão. É, desde 2007, a bebida espirituosa mais vendida em Portugal. Criada e mantida por uma empresa familiar, é, há 80 anos, uma marca associada à qualidade, criatividade e inovação. O Hipersuper esteve na Lousã com José Redondo, sócio-gerente da J. Carranca Redondo, e com Daniel Redondo, diretor-geral da empresa, para saber como nasce ‘O Licor de Portugal’, como inovam, como apostam na internacionalização e como trabalham o futuro de um produto único.

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É uma empresa dinamizadora de uma região e muito ligada à sua terra. Esta ligação é também parte do seu percurso de sucesso?
Sim. Nós temos esta visão, que era do meu avô, do país fora das grandes cidades. Vamos às cidades perceber as tendências, mas também temos a noção da realidade do resto do país.
Quando fazemos a comunicação, temos a preocupação do nosso consumidor estar no centro das atenções, de fazermos algo realmente relevante para o consumidor. E o facto de estarmos implantados aqui, dá-nos a noção do país real em que vivemos. Dá-nos uma visão privilegiada, penso eu.

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Daniel Redondo, diretor-geral da J. Carranca Redondo

Quantas pessoas trabalham na empresa?
Temos uma equipa permanente de cerca de 120 pessoas. Quando chegamos ao período do Natal temos que fazer contratações de equipas temporárias, muito para atividades promocionais que desenvolvemos.
Houve um grande crescimento na equipa permanente nos últimos anos a pensar na preparação da empresa para dar o salto nacional e internacional. Esta era uma empresa que tinha apenas a família na gestão, hoje em dia há uma gestão muito profissional e preparada para os desafios internos e externos. E será esse o caminho.

E em termos de produção?
Produzimos em torno de quatro milhões de garrafas de Licor Beirão por ano. É, desde 2007, a bebida espirituosa mais vendida em Portugal. Mesmo que este seja um país em que a principal categoria é o whisky, a marca número um é o Licor Beirão. Isso é motivo de orgulho, porque quer dizer que os portugueses dão muito valor e relevo a esta marca.

O Licor Beirão é uma bebida eclética. Deu origem ao Beirão D’Honra e aos cocktails, ‘Caipirão’ e ‘Morangão’, que a empresa passou a comercializar. Esses lançamentos levaram a marca a outro patamar?
Sim. O lançamento do Beirão D’Honra e mais recentemente dos coquetéis enlatados, Morangão e Caipirão, foram um tremendo sucesso. Em muitos aspetos fruto da qualidade, do conhecimento e da experiência. Já fazemos isto há 80 anos.
O Beirão D’Honra teve como objetivo alcançar um estilo de consumidor diferente. Foi lançado em homenagem ao meu avô (José Carranca Redondo), no centenário do seu nascimento, pela visão e audácia que teve durante toda a sua vida. Pegamos nas mesmas plantas e na mesma destilação e adicionamos aguardente vínica envelhecida com perfis muito selecionados, para que o blend, com a nossa destilação, fique muito bom. O sucesso foi tremendo, mas destina-se a um público diferente do Beirão. Era esse o objetivo e foi conseguido.

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José Redondo, sócio-gerente da J. Carranca Redondo, empresa fundada pelo seu pai

Foi lançado em 2016 e pensado para ser uma edição limitada, mas alteraram os planos…
Era realmente para ser edição limitada, porque como lidamos com uma marca líder de mercado, temos cuidado com todas as pequenas mudanças que fazemos. E tínhamos receio que este alargamento de gama pudesse, de alguma forma, colocar em risco o Licor Beirão.
Mas o feedback do mercado foi tremendo, o volume de vendas impressionante, e decidimos torná-lo uma referência permanente.

A comercialização do ‘Caipirão’ e do ‘Morangão’, saiu, digamos assim, do padrão tradicional do Licor Beirão. Porque decidiram aventurar-se?
Neste caso, vimos uma tendência: a conveniência. Foi a pensar num público que não quer ter o trabalho de estar a fazer os coquetéis, quer um produto pronto a beber. Já estávamos há tempos a observar essa tendência, mas havia um problema em torno da qualidade do líquido. Mais recentemente houve uma grande evolução em termos de preparados de fruta e só quando chegamos ao momento em que a mistura da fruta nos deu realmente a qualidade que queríamos para a marca Licor Beirão, é que decidimos avançar.
Correu muito bem e o produto tem sido premiado em vários concursos internacionais do setor, porque conseguimos chegar a uma fórmula que nos dá qualidade de líquido e uma estabilidade muito boa. Esses são fatores críticos para nós. Para fazermos um produto sem qualidade, preferimos claramente não fazer. Criar produtos que ponham em perigo o futuro da empresa a longo prazo, é uma linha vermelha que não ultrapassamos.

Essas duas bebidas abriram portas ao lançamento de outros produtos, diferenciados, feitos a partir de Licor Beirão?
Sim, temos algumas ideias. Sobretudo porque o Beirão é muito versátil. Costumo dizer que permite fazer um coquetel para qualquer tipo de pessoa. Mas temos que promover e apresentar um de cada vez. No próximo ano devemos ter uma novidade, mas ainda estamos em fase de testes. Posso dizer que estamos muito bem encaminhados.

Licor Beirão - entrevista ao Hipersuper Fotografia Frame ItA inovação faz parte do ADN da empresa. É esse o caso da nova garrafa, lançada em outubro? O que tem de tradicional e de inovadora?
Numa perspectiva a longo prazo, acaba por ser uma atualização. É uma marca que não queremos que envelheça, queremos que esteja sempre atual. Daí que esta seja a oitava mudança de imagem, desde 1940, ano em que o meu avô pegou na marca. Portanto, tem presente esta atualização e adaptação às novas tendências.
O que não muda? Não muda a bebida, a sua qualidade. E não muda também a fita amarela, que continua a ser posta à mão, de forma artesanal e com o toque pessoal que gostamos de colocar naquilo que fazemos. Num mundo em que falamos cada vez mais de inteligência artificial, onde os computadores vão fazer tudo e mais alguma coisa, nós temos um toque humano, todas as nossas garrafas têm um toque humano. E acho que isso, cada vez mais tem valor. Muitas vezes sofremos alguma pressão. Quando há uma procura muito grande, imediata, dizem-nos “envie-me sem a fita, não há problema”. E eu respondo “há problema, porque a fita faz parte desta marca e nós não abdicamos dela”.
O que muda? Houve uma atualização, com a fita ligeiramente mais larga. Demos mais ênfase ao amarelo da marca e tornamo-la mais elegante. A garrafa é mais estreita, para otimizar o transporte e pela questão da sustentabilidade, porque conseguirmos transportar mais garrafas por cada camião e reduzimos o consumo de combustível e a emissão de CO2.
Por outro lado, quisemos tornar esta marca mais interessante para um público internacional. O Beirão diz muito aos portugueses, lembram-se de muitas campanhas. Quando falamos de Beirão, todas as pessoas têm com ele uma qualquer experiência. Para mim, esse carinho, essa emoção, é o sucesso da marca. Temos agora o desafio de transmitir essa mesma emoção, essa portugalidade, essa força da cultura e dos valores portugueses a um público internacional.

A sustentabilidade é uma preocupação presente? De que forma aplicam medidas sustentáveis, na fábrica e na empresa como um todo?
É muito importante e historicamente temos esse cuidado. Nós vivemos numa quinta e sabemos a importância do meio que nos rodeia. Temos painéis solares, viaturas elétricas, cuidados de poupança de água e de reutilização da água. As plantas que são destiladas são depois reaproveitadas na quinta. Na nova garrafa, por exemplo, fizemos muitos acertos. Tivemos o cuidado de retirar os ‘ouros’ nos rótulos. A própria garrafa voltou ao castanho, um vidro que é possível reciclar e permite-nos usar mais vidro reciclado na sua produção. Existe um longo caminho pela frente, em todos os elementos inerentes a qualquer produto que circula.

A empresa é reconhecida por fazer grandes investimentos em marketing e criar estratégias de divulgação diferenciadas, como as mensagens personalizadas nas garrafas no Natal. Comunicar continua a ser fundamental?
Sim. O meu avô, quando começou, colocou logo o patamar lá em cima e disse que o marketing era fundamental. Dizia que podemos ter um produto fantástico, mas se não o soubermos comunicar, ninguém sabe que ele existe.

Licor Beirão - entrevista ao Hipersuper Fotografia Frame ItE estão em constante renovação na forma de comunicar…
Esse é o desafio. Nós não sabemos como vamos estar a comunicar daqui a dois anos, ainda não sabemos quais serão as novas tendências. E o desafio de ser sempre atual, é difícil: como acompanhamos as tendências, como nos adaptamos e como conseguimos ser relevantes para os nossos consumidores.

Nesse sentido, a abertura de um novo departamento em Espanha é a continuidade da aposta no marketing ou está mais vocacionada para uma componente comercial?
Tem uma componente de marketing. Em 2012, criamos a nossa distribuidora em Portugal e tem tido um tremendo sucesso. Há muitos anos procurávamos um parceiro em Espanha que fizesse a distribuição, mas não conseguimos motivar nenhum dos nossos parceiros mais capazes, a vender o nosso produto no país todo. Era possível apenas em termos regionais. Então, como já tínhamos o know-how da distribuição em Portugal, decidimos criar essa estrutura em Espanha. E vamos promover produtos portugueses aquele país. Temos um portfolio muito interessante, sabemos que vai demorar muito tempo, mas o objetivo é ganhar a distribuição e também a hotelaria.

Por falar em mercados externos, quais são os mais importantes?
Historicamente, os principais mercados são aqueles onde há grandes comunidades portuguesas. O chamado ‘mercado da saudade’ foi muito importante para ganharmos distribuição e temos ideia que representará, agora, talvez 50 por cento das nossas vendas internacionais.
Houve uma série de mercados, como França, Suíça, Luxemburgo e Estados Unidos, onde a comunidade portuguesa ‘forçou’ a distribuição e a que o produto estivesse disponível em supermercados e restaurantes. Depois, naturalmente, a qualidade do Beirão, a sua comunicação, a divulgação por parte dos portugueses, fizeram com que os locais fossem experimentando e o vissem como uma alternativa interessante.
França, Suíça, Luxemburgo e Estados Unidos ainda são os nossos principais mercados, mas temos já uma série de parceiros distribuidores em outros onde estamos a ‘semear’ a marca. Nos Estados Unidos tem muito por onde crescer, mas também na Europa – Alemanha, Holanda, República Checa, Polónia.

Licor Beirão - entrevista ao Hipersuper Fotografia Frame ItQue números representa a exportação para a marca Licor Beirão?
Exportamos à volta de 23% da produção e o nosso objetivo é chegarmos aos 50%, em cinco anos. É um objetivo ambicioso e vai exigir um grande investimento da nossa parte, porque significa investir em equipas, em marketing fora de Portugal, em ativação de marca, presença em eventos, etc.

O novo edifício, na zona industrial do Alto do Padrão, vai assegurar o crescimento pretendido nos mercados externos? O que vai oferecer a mais?
Nós precisamos de mais capacidade de armazenagem, por todas as questões de logística a nível mundial. E ainda em relação aos grandes retalhistas e aos maiores grossistas em Portugal, porque fazemos um grande esforço de adaptação às suas necessidades. Fazemos um estojo à medida do Continente, do Pingo Doce, do Lidl, etc. É uma personalização em larga escala, mas pressupõe uma grande capacidade de armazenamento. O enchimento continuará na atual fábrica e o novo edifício será mais voltado para a manipulação de produtos, personalização e armazenagem.

O facto do Licor Beirão ser um produto com uma identidade própria, associada a um país, também poderá trazer vantagens a nível global?
Sim, o nosso produto é único e está ligado a este país – que melhorou muito a sua imagem externa nos últimos anos. Continuamos a ser, orgulhosamente, ‘O Licor de Portugal’ e mantemos essa frase no rótulo. Foi um slogan criado pelo meu pai nos anos 60, quando o que era português não era ‘bom’, mas já nessa altura ele dizia que tínhamos que ter orgulho de sermos portugueses e tínhamos que acreditar em nós.
Aqui, no Licor Beirão, temos a ambição de fazer o melhor, defendemos a importância da marca e esse é um desafio a nível global: é na criação das marcas que está muito da geração de valor, de riqueza.

Quando o tema é exportação, vêm à baila os entraves burocráticos em vários países. O que acha que seria necessário, em termos de apoios à exportação?
Nós partimos de um país e um mercado pequenos. Uma empresa forte nos EUA, é forte a nível mundial. Portanto, não temos uma dimensão grande e se em cima da nossa escala colocarmos não sei quantos impostos, taxas, legislações, tudo isto representa barreiras a um crescimento internacional.
Quando foi divulgada a proposta de Orçamento de Estado para 2024 estávamos em Berlim, com um grande investimento em stand, na maior feira do setor, e recebemos a novidade de que o imposto sobre o álcool iria subir 10% no próximo ano. Nós temos uma diferença superior a 40% em termos de imposto sobre álcool, em relação a Espanha. Não faz sentido. Temos um rendimento médio inferior a Espanha e um imposto sobre o álcool 40% superior. Por quê?

Para onde poderão levar as novas tendências de mercado? Outros produtos? Outra bebida espirituosa?
Há uma grande aposta na marca. Por isso, podemos ter outros produtos, mas que façam sentido na marca Beirão, que partam da marca Beirão. Nós temos noção daquilo que sabemos fazer bem e fazemos sempre por manter o rumo muito bem definido, para não dar um passo em falso. A questão das empresas familiares, é que se dermos um passo em falso, há um legado que termina. E tenho que garantir que o legado continua, saudável e robusto, para o futuro.

Licor Beirão - entrevista ao Hipersuper Fotografia Frame ItA faturação do grupo, em 2022, foi de 50 milhões de euros. Qual é a previsão, para o grupo, para 2023?
Pensamos conseguir fechar o ano com 6% de crescimento, o que é muito bom tendo em conta a atual conjuntura. Houve um abrandamento no país, no segundo e no terceiro trimestre, mas nós, felizmente, conseguimos manter o crescimento porque ainda temos muitas oportunidades por aproveitar.

Em 2024 haverá uma maior aposta na exportação?
Sim. Na verdade já começou este ano, com o crescimento da equipa de exportação, com a presença em mais feiras internacionais – estratégia que vamos manter no próximo ano. Vamos continuar a apostar no mercado de Espanha. Há acordos que estão trabalhados com parceiros em outros mercados e o investimento (nesses países) vai depender desses acordos. No Brasil, um grande mercado com uma também grande ligação a Portugal, temos um parceiro ‘alinhavado’, porque vemos que há um grande potencial para o Licor Beirão naquele país.

Que caminho vê para o futuro da marca? O que é preciso fazer, continuar, alterar para que um produto com mais de 80 anos, se mantenha por outros 80 anos?
Temos uma equipa que cresceu muito e mantém um alto patamar de exigência. Temos que manter constantemente essa exigência para perceber que o que estamos a fazer está ao nível do nosso passado, mas que não ‘adormecemos’ e que não está tudo feito. Há uma preocupação constate em dar os passos certos e isso é adaptação permanente. Nós temos que estar atentos e ver o que está a acontecer e para onde vamos. Temos que nos adaptar para garantir que o negócio tem futuro, que continuamos a ser relevantes para os nossos consumidores, que continuamos a ser parceiros dos nossos clientes e que continuamos a ter um impacto positivo na sociedade. Se tudo isso funcionar bem, a empresa continuará a ter futuro.

* Entrevista originalmente publicada na edição 418 do Hipersuper

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