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O triunfo do brick and mortar

Por a 17 de Julho de 2023 as 9:08

José-Galvão_SavillsPor José Galvão, head of retail, Savills Portugal 

Após dois anos de fortes restrições, com impacto na distribuição, nas vendas, nos custos operacionais e nas rendas, o retalho emerge em 2023 num novo contexto. A vida mudou, a tipologia de cliente mudou, as necessidades mudaram e o retalho acompanha esta mudança de forma surpreendente.

Um dos principais fatores de sucesso da atividade de retalho em Portugal é o turismo. O crescimento da oferta de restauração, sobretudo em Lisboa e Porto, deve-se ao crescimento e consolidação do turismo. A oferta de novos conceitos de restauração, que surgem a um ritmo impressionante, decorre da procura crescente desta tipologia de cliente que visita Portugal.

Outra das alterações com impacto direto na atividade comercial diz respeito às mudanças no mercado de trabalho, especialmente a normalização do trabalho remoto. Nos Estados Unidos, 56% das pessoas empregadas a tempo inteiro – 70 milhões de pessoas – referem que podem desempenhar as suas tarefas remotamente.

Na Alemanha, 51% das pessoas trabalham remotamente pelo menos 1 dia por semana e no Reino Unido 42%. Os dois anos de “teletrabalho forçado” fizeram com que as pessoas olhassem para o comércio de proximidade, e para as lojas de bairro existentes, ou que entretanto surgiram, como alternativas. O desenvolvimento do comércio de conveniência é liderado pelo setor da distribuição alimentar que aproveita esta nova tendência para abrir várias lojas de proximidade.

Os conceitos de conveniência não servem apenas a população ativa. A geração baby boomer (acima dos 60 anos) passou também a privilegiar a proximidade e a “cidade dos 15 minutos”. Esta geração valoriza o conforto, a conveniência, os espaços verdes e a existência, perto de casa, de uma oferta de saúde e bem-estar.

A ameaça da substituição das lojas físicas pelo comércio eletrónico, há tanto anunciada, não se concretizou. O brick and mortar adaptou-se e tornou-se relevante, apesar da dinâmica e crescente importância das transações online observadas durante a pandemia. A taxa de penetração do comércio eletrónico a nível mundial era de 29% em 2020. Em 2022 baixou para 5%. Os custos associados às operações online cresceram de forma insustentável. O aumento dos custos de logística, decorrente das devoluções, bem como a pressão na redução dos tempos de entrega, esmagam as margens, fazendo com que este canal não seja uma alternativa ao comércio físico. O comércio online é hoje um canal de apoio ao comércio físico.

Durante a pandemia as marcas usaram as redes sociais para criar e aumentar a sua comunidade. Hoje a comunidade é criada no espaço físico da loja. A Amazon, o gigante das vendas online, tem hoje perto de 100 lojas físicas e com plano de expansão em curso. A Alibaba, o principal concorrente da Amazon, dispõe de centenas de lojas físicas. Algumas marcas procuram oferecer, no interior das lojas, experiências complementares, também elas geradoras de receitas adicionais. Espaços para eventos, cafetarias, espaços de co-work e ginásios, são alguns exemplos do que algumas marcas estão a desenvolver nos espaços físicos de forma a fomentar a cultura de comunidade e sentimento de pertença, identificação e afinidade com os valores da marca.

A loja é hoje um espaço que vai para além do mero estabelecimento comercial. A loja entrega um valor intangível ao proporcionar uma experiência personalizada. As lojas revitalizam e dão vida a espaços nas cidades. O retalho desenvolvido de forma integrada e com sentido, potencia a criação de laços na comunidade. O mundo mudou e impactou diretamente o sector, obrigando as diferentes atividades a inovarem, adaptarem-se e a tornarem-se relevantes para as pessoas. As cidades agradecem.

*Artigo originalmente publicado na edição 414 do Hipersuper

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