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Plataformas “as-a-service” revolucionam cadeia de abastecimento

Por a 19 de Maio de 2021 as 15:42

Fernando MascarenhasComo as “plataformas as-a-service” são um dos grandes disruptores das cadeias de abastecimento e como, neste contexto de disrupção, a colaboração entre empresas é a chave para mutualizar riscos e recursos e conseguir responder de forma eficiente à resiliência que é exigida da cadeia de abastecimento

Por Fernando Mascarenhas, partner de advisory da KPMG*

Segundo um estudo recente da KPMG focado nas empresas de maior competitividade e crescimento, 87% destas empresas afirmavam fazer parte da sua estratégia o foco da otimização da interação dos canais de ligação com os clientes e os consumidores. Isto para dar o mote àquilo que se convencionou dizer que vivemos ‘na era do consumidor’, uma era em que a centricidade e experiência do cliente fazem parte do core da estratégia das empresas. O que significa isto para a logística e a cadeia de abastecimento que tem como missão fazer o encontro entre a oferta e procura? Em primeiro lugar, lidar com uma volatilidade e uma incerteza muito superior à que estávamos habituados, os ciclos de inovação são cada vez mais curtos, cada vez temos menos tempo para introduzir, operar e retirar das nossas cadeias logísticas novos produtos que, entretanto, se tornaram obsoletos. É fundamental dar resposta a um conjunto de padrões de consumo que estão em alteração constante, em resultado de aspetos sociais, económicos, demográficos, culturais e até de crenças. Vivemos também num mundo em que a incerteza é determinada pela assimetria de informação disponível aos nossos consumidores, quando à distância de um clique têm a possibilidade de perceber as opções da minha concorrência face aos meus produtos e a partir daí tomar opções. Esta incerteza e volatilidade exigem das cadeias logísticas uma capacidade de planeamento e agilidade de execução. Por outro lado, temos também um requisito de servir em qualquer canal, a fusão do físico e digital está aí, e criou expectativas fantásticas junto de todos nós consumidores que estamos a medir a experiência que recebemos não propriamente pela experiência especifica naquele canal, mas pela experiência geral que temos nas múltiplas interações com o mundo digital. Isto cria desafios e estabelece um benchmark que tem impactos dentro da função logística. Um aspeto importante é que neste mundo de plataformas digitais, onde a interação com os consumidores se faz através dos canais online, a logística é muitas vezes a face visível na jornada do cliente. É a única cara humana com a qual nós consumidores tomamos contacto na interação comercial que fazemos com as plataformas.

O consumidor é cada vez mais consciente dos valores e princípios das marcas subjacentes aos produtos que consome e ao valor recebido. E, talvez mais importante, é consciente da assimetria de poder que existe hoje face à alavancagem da capacidade amplificadora das redes sociais. E se este conjunto de desafios, per si, já seriam muito relevantes para nos preocuparmos sobre o impacto dos mesmos na função logística, não podemos esquecer que o mundo também está em mutação. E temos aqui alterações muito substanciais que obrigam a repensar modelos de negócio tradicionais de alguma forma induzidos por um conjunto de temas.

Desde logo, do ponto de vista geopolítico, o mundo está diferente. O comércio mundial é menos livre e alteraram-se alguns dos pressupostos base que nos últimos anos estiveram na base do desenho das cadeias logísticas.

As cadeias logísticas que ligam a Europa à Ásia, que cruzam oceanos e ligam consumidores, estão a ser repensadas face às múltiplas tensões internacionais que temos observado. As guerras entre os grandes blocos comerciais são visíveis. Provavelmente, menos visíveis são as guerras silenciosas em torno do domínio das tecnologias que irão determinar o futuro e a competitividade das nações, como o 5G e a inteligência artificial, que ajudarão a transformar as cadeias de valor e mudarão drasticamente os fluxos do comércio internacional. E tudo isto se faz num clima de elevada fragilidade, patente nos últimos tempos, embora o risco sempre lá estivesse, tornou-se foi mais visível com a pandemia. E agora há que lidar com esta fragilidade e repensar as cadeias de valor. Durante muitos anos falámos de ‘just in time’, hoje falamos de ‘just in case’.

Mas, ao mesmo tempo, há uma pressão constante entre as cadeias logísticas no sentido de eficiência. E atingir essa eficiência obriga a colaboração. Colaboração vai ser uma palavra muito presente. Para mutualizar riscos, recursos e conseguir responder de forma eficiente à resiliência que é exigida das cadeias de valor.

Por outro lado, estamos no mundo das plataformas. 72% de empresas inquiridas num recente estudo que fizemos, identificaram as plataformas ‘as-a-service’ como um dos grandes disruptores do supply chain.

Estas plataformas introduzem conectividade, complexidade, mudam alguns dos modelos que tínhamos subjacentes, a posse versus o usufruto, por exemplo. É hoje uma questão que qualquer gestor tem presente em cima da mesa, discutir a ‘capacity-as-a-service’ como se fosse algo já banal, mas que, para fazer acontecer de uma forma realista, é essencial aumentar a visibilidade interna e externa.

As cadeias de valor estão cada vez mais inteligentes e a contratação inteligente, a decisão pelas máquinas que determinam depois as respostas mais eficazes a determinadas necessidades de consumo, estão cada vez mais presentes.

A descarbonização é uma necessidade imperiosa de sobrevivência, não é apenas uma vantagem competitiva. A regulação irá impactar a forma como nós compramos, concebemos as nossas supply chain. Começando pela descarbonização das frotas, o exemplo mais óbvio, mas continuando sem dúvida, noutras vertentes.

Cada vez mais os conceitos de escassez recursos e de circularidade da economia vão estar presentes. A UE estima em 600 mil milhões de euros as poupanças que poderão resultar da adoção de uma economia mais circular e a logística aqui poderá ter um papel fundamental enquanto vetor desta circularidade ao nível da logística inversa e da criação de serviços adicionais de economia circular.

Para tudo isto acontecer vai ter de haver muito investimento, em tecnologia, automação, robotização, autonomização, e aqui temos um desafio: as margens típicas da logística, quando analisadas per si, de forma autónomo, são muito curtas, o nosso tecido empresarial é altamente atomizado, muito suportado em Pequenas e Médias Empresas, às quais falta escala, sofisticação, para poderem fazer isto de uma forma individual e a palavra colaboração é, mais uma vez aqui, a chave para ser bem-sucedido.

*Depoimento recolhido e editado pela jornalista Rita Gonçalves

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