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Especial Distribuição em Angola: Conceito de proximidade em Luanda tem alma portuguesa

Por a 14 de Julho de 2015 as 12:23

 

AngolaPara crescer na capital angolana, os retalhistas começam a apostar em formatos de proximidade e de pequena dimensão. A insígnia portuguesa Amanhecer serviu de inspiração para um novo projeto em Luanda

As cadeias armazenistas dominam o comércio alimentar em Angola, concretamente fora da capital, Luanda, nas cidades com menor densidade populacional. Estas empresas, especialistas em ‘trading’ internacional de ‘commodities’, como açúcar, massa ou arroz, souberam tirar partido dos períodos de escassez de alimentos durante a guerra civil, desenvolveram-se como cogumelos e ainda hoje lideram o retalho alimentar naquele país africano.

Este retrato começou a mudar um pouco há cerca de quatro anos, com o desenvolvimento de cadeias de retalho nacionais, com capital angolano mas desenvolvidas a partir de ‘know how’ internacional, como português e brasileiro, por exemplo. “São cadeias de retalho nacionais, cuja equipa de gestão foi recrutada no estrangeiro”, explica em entrevista ao HIPERSUPER Pedro Miguel Silva, Associate Partner da Deloitte. Na maioria destas empresas, o capital é quase sempre 100% angolano.

Concretamente na capital, o retalho alimentar é liderado pela insígnia Kero, que abriu o seu primeiro hipermercado em Luanda, em 2010. O primeiro hiper em Angola, ainda hoje operacional, foi o Pão de Açúcar que abriu portas em 1973. “O formato de hipermercado, parado cerca de 40 anos” e recuperado pela Zahara Imobiliária, imprimiu uma nova dinâmica ao mercado e à concorrência, absorvendo “um elevado consumo numa área relativamente grande” . O hipermercado é uma “janela de oportunidades mas é um modelo que se esgota rapidamente”. E em Luanda esgotou-se, acredita o responsável.

Hoje, a Kero opera nove hiper e três supermercados na capital. “Luanda tem hoje uma grande capilaridade. Ainda há espaço para crescer mas através de formatos de pequena dimensão e associados ao comércio de proximidade”, defende Pedro Miguel Silva.

De táxi às comprasAngola1

Atenta a esta oportunidade, a rede nacional de cash&carry “Bem-me-quer” está a desenvolver o comércio de bairro na capital, inspirada no conceito da insígnia de proximidade Amanhecer, da portuguesa Jerónimo Martins. O conceito é muito idêntico ao da retalhista portuguesa. “Há um investimento inicial em lojas pequenas de proprietários individuais e há um acordo de fornecimento por três anos”. A “Bem-me-quer” opera cerca de 100 estabelecimentos em Luanda, mas é considerada uma “cadeia de segunda linha. Cadeias de retalho organizado de proximidade ainda não existem”.

 

Num país que, em 2014, tinha 24 milhões de habitantes e que tem 14 vezes o tamanho de Portugal, qual o raio de influência dos supermercados de proximidade? “Talvez, um raio de 500 metros quadrados”, estima Pedro Silva, acrescentando que “a maior parte das famílias angolanas não têm transporte próprio. Deslocam-se em transportes públicos ou na rede informal de táxis”, os emblemáticos ‘candongueiros’ que são hoje a imagem de marca de Luanda.

O problema é que os táxis, já de si caros para o rendimento da maioria da população, ainda cobram um adicional por cada saco de compras. Fazer as compras do mês pode ser uma verdadeira dor de cabeça em Angola. Assim, os super e hipermercados localizados nos subúrbios das cidades são mais orientados para quem tem viatura própria. Quem não tem, no dia a dia recorre tradicionalmente ao comércio informal – mercados a céu aberto e feiras de rua – para comprar a cesta básica, e ao sábado desloca-se a uma grande superfície para encher a dispensa.

Quanto representa o comércio informal? “É difícil de estimar, naturalmente, mas o número mais consensual é 80%. Em Luanda, representa menos. Talvez, 70%. Isto porque Luanda tem densidade populacional e riqueza, os principais atrativos para o investimento no comércio”, sublinha o partner da Deloitte para Portugal e Angola.

 

Angola 3Retalho especializado

É no retalho não alimentar que se encontram as maiores oportunidades de crescimento nos próximos cinco anos, concretamente em Luanda. Há insígnias com operação em Portugal com muita vontade de viajar para Angola mas faltam as infra-estruturas. “Não há localizações prime para lojas de retalho especializado, sobretudo shoppings, porque não há ruas de tráfego pedonal. A oferta de shoppings ainda é limitada e muitos dos projetos em ‘pipeline’ estão parados”. Mas, nem tudo são espinhos. Para fazer face às dificuldades da economia angolana – concretamente a redução das receitas de petróleo – estão a nascer projetos mais “modestos” de retail park, “que penso ser o que faz mais sentido, uma vez que torna menos dependente a manutenção das infra-estruturas comuns”.

As oportunidades estão sobretudo no segmento do lar. “Nos últimos anos, foi feito um investimento grande naquilo que se chamam as centralidades, verdadeiras cidades à volta de Luanda, para ajudar as classes desfavorecidas. Há hoje uma procura grande por artigos de decoração para o lar de gama média, acessíveis à maioria da população, mas não há oferta para cobrir a procura”.

KERO_AngolaPrincipais desafios

Além da escassez de infra-estruturas, os empresários que querem investir no retalho em Angola deparam-se com problemas de financiamento, os bancos não emprestam sem garantias bancárias ou histórico de crédito, além de um fraco tecido agrícola e agro-industrial. “Angola já teve agricultura, no período da independência. Hoje não tem e esse conhecimento perdeu-se. Por exemplo, em Muambo produzem-se muitos hortícolas mas depois os produtores têm muita dificuldade em fazer chegar esses produtos a Luanda, chegar ao principal mercado de consumo pode levar 8 horas e investir em refrigeração para transportar os perecíveis tem custos elevadíssimos”. Os fluxos comerciais em Angola são unidirecionais, tipicamente em direção a Luanda. “É muito difícil rentabilizar uma frota que opere todo o país”.

A mão de obra qualificada é mais um problema. “O mercado de trabalho é muito volátil, rapidamente se salta de uma empresa para outra a ganhar mais 10 ou 20%. Torna-se difícil o compromisso de investir nas pessoas quando se sabe que a rotação é elevada”. Há ainda “muito pouca oferta de cursos técnicos, que durante muitas anos estiveram muito ligados aos recursos naturais”, como o petróleo, e falta “formação básica primária”.

Em média, desde que se encomenda um contentor e este desembarca em Luanda passam 43 dias. Portugal regista os melhores resultados no tempo de transporte de mercadorias e é ainda hoje o maior exportador de produtos alimentares para Angola, seguido do Brasil. “Como é obrigatória a rotulagem em português acaba por se importar muito destes dois países”, já para não falar na “afinidade dos angolanos com as marcas portuguesas”.

As importações angolanas têm-se mantido estáveis mas nos últimos meses sofreram uma reviravolta que se deve a “fatores extraordinários”, como a redução das receitas petrolíferas, que tem prejudicado as exportações de produtos portugueses, remata Pedro Silva.

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