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Comprar com o coração. Vem aí a era das emoções

Por a 27 de Março de 2015 as 15:52

A próxima geração de pontos de venda vai tratar os consumidores pelo nome, conhecer as suas preferências e fazer sugestões de acordo com o seu histórico de compras.

Pela primeira vez, os retalhistas vão ter acesso a um perfil único do consumidor – físico e digital – para oferecer uma experiência de compra integrada e mais emocional do que racional. Apesar de mais pequenas, as lojas terão uma oferta cada vez maior, através dos catálogos digitais, que permitem exibir gamas de produtos XXL em formato XXS. Quanto às filas de espera, essas, têm os dias contados e novas formas de fazer o pagamento vão surgir para agilizar o processo de compra. Os dispositivos móveis vão invadir as lojas, pela mão de clientes e lojistas, e as lojas vão estar cada vez mais próximas dos consumidores. Saiba (quase) tudo sobre o futuro do retalho.

O futuro da loja física

O ponto de venda não vai perder protagonismo face ao desenvolvimento dos canais online. Pelo contrário. “O ponto de venda continua a ser uma parte fundamental da experiência do comércio global, mas deve ser repensado”, aconselha Carmen Martínez Iturri, country manager da Cegid em Portugal e Espanha. “A loja física terá que reforçar a sua proposta com todos os elementos que não podem ser oferecidos através dos canais online. Os consumidores esperam diferenciar a experiência na loja, querem partilhar emoções físicas com a marca, os produtos e os funcionários, assim como encontrar serviços de elevada qualidade”.

Pedro Fernandes, marketing manager da Edigma, sublinha que ambos os canais – físico e online – possuem vantagens face ao outro, pelo que devem ser encarados como complementares. “Não concebo uma realidade onde o retalho físico seja relegado para um plano residual. É demasiado importante pela sua conveniência, rapidez e experiência que proporciona”. No entanto, admite, é “mais difícil ao retalho físico expandir com sucesso para o mundo digital do que o inverso, por motivos genéticos. A tecnologia não está no ADN de muitos retalhistas físicos, pelo que sentem grandes dificuldades quando enfrentam concorrentes digitais ‘nativos’, cujo ‘mindset’, competências e a própria estrutura da empresa estão preparados de raiz para a presença online”, explica. A Bonobos e a Warby Parker são exemplos de retalhistas online a abrir lojas físicas com sucesso, com “taxas de crescimento bastante superiores” ao retalho físico.

Segundo o responsável da Edigma, a principal diferença entre os retalhistas online e físicos está na atitude com que encaram a tecnologia. Os retalhistas online têm uma mentalidade mais inovadora, são mais criativos, abertos ao risco. Os retalhistas físicos são tradicionalmente mais conservadores na abordagem ao risco. Para levar as suas lojas até aos novos consumidores, o retalho físico deve adoptar uma mentalidade mais aberta à mudança, ao risco, à inovação e ao insucesso”.

Ricardo Bastos, administrador da Dream Media, acredita, por outro lado, que “a escassez de tempo na vida urbana incentive, a seu tempo, o consumidor a preferir o retalho online e, neste contexto, algumas lojas físicas desapareçam para dar lugar a lojas online que representarão uma imediata redução de preços dos produtos”.

A estratégia Omnicanal

A convergência e complementaridade entre os canais físico e online, ou seja a possibilidade de fazer compras com mais conforto e comodidade – a apelidada estratégia omnicanal – é já uma realidade junto de algumas insígnias a operar em Portugal. Mas, na opinião de Armando Mateus, business partner da Touch Point, esta estratégia está ainda em fase de experimentação no nosso País. “Há várias experiências isoladas mas não integradas”. O ‘click and collect’ – comprar os produtos online e levantar na loja – é um dos exemplos mais comuns desta estratégia e surge da “necessidade de rentabilizar o negócio online, porque o transporte encarece a operação do retalhista e, assim, o consumidor fica com essa despesa”, explica. “Numa primeira fase, muito apregoado como forma de ter uma experiência mais funcional, o conceito de ‘click and collect’ estava disponível nos armazéns das cadeias de distribuição. Está agora a evoluir para um conceito misto”. Nesta segunda fase, “que deverá chegar a Portugal em dois, três anos”, a experiência de compra é mais emocional: o consumidor compra online os produtos embalados, desloca-se à loja para levantar a sua encomenda e tem à sua espera lineares de produtos frescos, secções de produtos gourmet ou escaparates de produtos premium, que prometem impactar até os consumidores mais distraídos.

Os retalhistas precisam encontrar as melhores sinergias entre o conceito online e offline e ter uma “promessa” global, independentemente do canal e da geografia, refere a country manager da Cegid em Portugal e Espanha. “O consumidor não vê os canais, só vê o retalhista/marca”. A experiência omnicanal traz numerosas vantagens para o consumidor: permite reservar ou encomendar online e levantar numa loja, devolver uma encomenda numa loja próxima, ‘salvar’ a venda ao encomendar na loja um produto que não está disponível e solicitar a entrega no domícilio.

Experiências de consumo

Vamos passar da era da oferta de produtos ou serviços que satisfazem o consumidor para a era da oferta de emoções e verdadeiras experiências de consumo, onde o consumidor será reconhecido como um indivíduo único.

A próxima geração de pontos de venda vai tratar os consumidores pelo nome, conhecer as suas preferências e fazer sugestões de acordo com os seus gostos, explica Ricardo Martinho, director da divisão de software da IBM. “Através de sistemas analíticos e cognitivos, já disponíveis e, agora, mais acessíveis, os retalhistas vão ter, pela primeira vez, acesso um perfil único do consumidor – físico e digital. Estas soluções vão ser vendidas como serviços, podendo o retalhista, de grande ou pequena dimensão, pagar, por exemplo, um sistema de reconhecimento dos consumidores à entrada da loja como paga a factura da electricidade”. Com a ajuda dos sistemas de geolocalização, o lojista vai saber quando um cliente entra na loja. E, através dos sistemas analíticos e cognitivos, vai ter capacidade para sugerir produtos com base no perfil de compras de cada cliente, apresentar promoções inéditas ou convidar o cliente a fazer um determinado percurso na loja, por exemplo.

“A próxima geração de lojas vai incorporar de raiz estas questões: a digitalização do ponto de venda, a inteligência na gestão e o conhecimento do consumidor individualizado. E vão ter certamente mais sucesso se as que já existem não se modernizarem”, sublinha o director da divisão de software da IBM.

A costumização é a palavra-chave dos próximos tempos, concorda Armando Mateus. “Vamos passar de um mundo massificado” (que nasceu com os primeiros hipers) para um “mundo constumizado”, onde o consumidor procura o “reconhecimento de que é um ser único” e onde a transacção será muito “emocional do que racional, porque o acto de compra não é desapaixonado”. A operadora de caixa dar os parabéns ao cliente e assinalar a data com a oferta de um bolo de aniversário, pode ser um exemplo. O consumidor vai realmente sentir-se especial nesta nova era das emoções.

Também a forma de pagamento vai sofrer uma revolução nos próximos dez anos, acredita o marketing manager da Edigma. “O número de empresas a inovar na área de pagamentos e transferências digitais de dinheiro é enorme. Os beacons, por exemplo, são uma ferramenta que vai transformar o retalho físico a curto prazo. Permitem disponibilizar mais informação sobre cada produto, criar promoções e acelerar o processo de pagamento”.

O fim das filas de espera

O design da loja vai mudar. Segundo um estudo do Planet Retail, os checkouts vão perder importância e tenderão mesmo a desaparecer no futuro. Assim como as penosas filas de espera! As lojas serão mais pequenas e a experiência de compra cada vez mais digital.

“No campo da usabilidade, os retalhistas devem inspirar-se no enfase colocado pelos retalhistas online em criar interfaces o mais naturais possíveis. Da mesma forma que o sucesso de uma loja online aumenta à medida que se reduz os passos necessários à compra, também no comércio físico é importante eliminar os momentos de fricção. Não há nada mais natural do que entrar numa loja, pegar no produto e sair. Implementar um sistema que replique o mais possível esta experiência torna muito mais rápida e simples a compra”, aconselha Pedro Fernandes.

O administrador da Dream Media acredita que, nos próximos anos, a área de checkout será totalmente alterada dando lugar a ‘open spaces’, onde o consumidor é autónomo na decisão de compra e onde se sentirá mais confortável.

Os checkouts não vão desparecer, mas antes assumir novas formas para optimizar a saída dos clientes da loja, sublinha, por outro lado, João Soares, director de retalho da Wincor Nixdorf. “Os clientes têm diferentes formas de se relacionar com a tecnologia, mas todos têm o desejo de um checkout rápido, sem filas de espera e que esteja pensado para satisfazer o seu tipo de compra. O mesmo cliente tende a usar diferentes formas de checkout consoante o momento da compra – capaz grande, frescos, compra por impulso”. A tendência será para os retalhistas adaptarem o ‘layout’ dos checkouts à tipologia de loja e ao perfil dos clientes”.

Em particular no retalho alimentar, a evolução passa por “projectos de optimização dos checkouts, nalguns casos ainda iguais aos dos primeiros hipermercados abertos há mais de 20 anos”, que, por um lado, “dão resposta às exigências dos diferentes clientes” e, por outro, permitem “reduzir custos com o pessoal”.

A abolição do numerário é mais uma tendência, separando o processo de scanning do pagamento. “Ninguém é mais rápido a ‘passar’ artigos do que uma operadora de caixa experiente, mas o processo de pagamento depende da rapidez do cliente”, explica João Soares, acrescentando que este processo pode ser automatizado com torres de pagamento (separadas das áreas de scanning). O numerário recebido nas torres está automaticamente contado sem necessidade adicional de manuseamento quer por parte do retalhista que por parte das companhias de valores.

‘Mobile’ invade lojas

Os dispositivos móveis são ferramentas úteis aos funcionários da loja para melhorar o serviço ao cliente. Permitem identificar um cliente à entrada da loja, dar-lhe as boas-vindas, consultar o histórico de compras, fazer vendas cruzadas, averiguar a disponibilidade do stock, diminuir as filas de pagamento e fazer o pagamento simplificado através de qualquer ponto na loja, explica Martínez Iturri.

“Os dispositivos móveis podem ser, por exemplo, o assistente virtual, que disponibiliza informação técnica aprofundada sobre o produto. O retalhista consegue desta forma contornar deficiências de informação dos seus colaboradores, fruto do elevado ‘turnover’ e salários baixos no retalho”, considera, por sua vez, o marketing manager da Edigma.

Quando nas mãos dos consumidores, permitem compor a lista de compras de forma prática e ecológica e, num futuro próximo, permitirão, através de um leitor RFID integrado no carrinho de compras, obter informações sobre os produtos, qual a sua localização na loja e o preço, acredita Ricardo Bastos.

Outras das possibilidades dos smartphones é a possibilidade de o cliente fazer o scanning dos produtos durante o processo de compra. No final, a transacção é resgatada num torre de pagamento, onde o cliente pode finalizar comodamente a compra, através dos vários meios de pagamento, incluindo os benefícios do cartão de fidelização. A Wincor está a implementar em Portugal um piloto com esta solução. Os resultados são promissores e é “expectável o alargamento a mais lojas ainda este ano”, indica João Soares.

Dezenas de retalhistas têm ainda aplicações gratuitas, cujas principais funcionalidades são a apresentação de produtos com informação detalhada, informar sobre promoções a decorrer, construir uma lista de compras, enviar a lista ao retalhista, localizar a loja mais próxima e, mais recentemente, oferece a opção de pagamento a partir de terminais POS móveis.

Os telemóveis são um dos pontos-chaves na modernização do retalho, acredita, por sua vez, o director da divisão de software da IBM. Segundo um estudo da IBM, os portadores de um dispositivo móvel interagem com este 150 vezes por dia, seja para consultar um e-mail, ver uma mensagem ou aceder a uma aplicação. Ou seja, em média o consumidor acede ao telefone entre 4 a 5 vezes a cada meia hora. “Estão os retalhistas portugueses a tirar partido desta interacção?”. Além disso, segundo também um estudo da IBM, 75% dos utilizadores de dispositivos móveis está disposto a partilhar a sua localização e 72% a partilhar as suas experiências. Ricardo Martinho revela mais números para dar conta do enorme potencial destes dispositivos para o negócio dos retalhistas: 52% dos consumidores adultos confessam usar o telemóvel como apoio à compra na loja. “Os telemóveis representam já um volume de negócios de 650 biliões de dólares por ano”.

Além dos dispositivos móveis, também os sistemas ‘polytouch’ vão invadir as lojas. São displays que reflectem a nossa imagem, permitindo experimentar virtualmente uma série de produtos, como roupa e cosmética, fazer a compra e, logo de seguida, o pagamento, além de permitirem a partilha de conteúdos para as redes sociais.

Movimento de contra-globalização

Sendo certo que as lojas de grande dimensão continuarão a existir em locais de elevada concentração populacional, há uma tendência para a abertura lojas mais pequenas. “Por um lado, por uma questão de custos e incerteza quanto à evolução da economia, que leva a uma precaução na grandeza do investimento. Por outro, estamos perante um movimento de contra-globalização, com o surgimento de retalhistas “indie” e de autor, muitas vezes com criações próprias. É uma resposta do mercado à massificação de oferta padronizada a que assistimos recentemente por parte de grandes cadeias. Também a falta de emprego, que incentiva o empreendedorismo, é um factor que contribui para o aumento do número de lojas pequenas”, sublinha Pedro Fernandes.

Proximidade – o caminho entre casa e o local de trabalho – parece ser a palavra-chave no futuro do retalho. Os consumidores estão a envelhecer rapidamente e necessitam de soluções adaptadas, ou seja lojas mais fáceis de encontrar, próximos do seu local de residência. “Os formatos de proximidade vão vingar numa sociedade cada vez mais urbana. Os consumidores estão à procura de pontos de encontro, podem ser lojas, shoppings ou espaços de rua com uma estratégia integrada de atracção”, acredita Armando Mateus. “Não vai haver uma, mas sim várias lojas do futuro”.

Também a grande distribuição está actualmente reduzir a dimensão das lojas para expandir a actividade nos centros urbanos. Por um lado, porque as vendas pela Internet obrigam a localizações mais próximas dos ciberclientes mas também porque os valores de arrendamento comercial nas cidades tem descido nos últimos anos.

“As superfícies comerciais são cada vez mais dispendiosas. A tendência é abrir lojas mais pequenas, ‘showrooms’ ou ‘pop-up stores’ e apostar em catálogos digitais que permitem aos retalhistas exibir uma gama de produtos XXL num formato XXS”, conclui Martínez Iturri.

Então, como vão as lojas de grande dimensão adaptar o espaço aos novos preceitos? O business partner da Touch Point acredita que o aproveitamento do espaço será feito através da criação de novos serviços e de “pequenos mundos” baseados nos momentos de consumo. E deixa uma sugestão, em jeito de exemplo. “Por que não criar um pequeno mundo dedicado ao Mundial de Futebol, com aperitivos, bebidas, churrasco, entre outros produtos?”.

Marcas a abrir lojas

Não é uma novidade, mas veio para ficar: marcas a abrirem lojas para contactar directamente com o consumidor e deter o controlo total sobre a experiência proporcionada. “O contacto directo com os consumidores verifica-se actualmente no website da marca ou através das aplicações, mas trata-se apenas de um contacto digital. O contacto físico é bastante importante e, em lojas de retalhistas, a experiência é incompleta, partilhada com concorrentes, e o ‘feedback’ recebido pelo fabricante é parcial”, explica o director de marketing da Edigma.

Assim como há mais marcas a abrirem lojas físicas, também há mais fabricantes, que antes apenas produziam marca própria, a lançar as suas próprias marcas, revela a country manager da Cegid. “Esta tendência está a crescer com a necessidade de exportar mais e para mais países, aumentar as vendas e potenciar o reconhecimento das marcas”.

 

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