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Será que a Mercadona sentiu a recessão?

Por a 11 de Março de 2010 as 14:00

*Em colaboração com Planet Retail

Os resultados do retalhista espanhol Mercadona foram influenciados, claramente, pela recessão vivida em Espanha, contribuindo de forma significativa para o fim dos 15 anos de crescimento contínuo.

A Mercadona registou vendas de 15,5 mil milhões de euros no final do ano 2009, representando uma subida de 0,8% face ao ano anterior, enquanto os lucros líquidos caíram para 270 milhões de euros, resultado de uma descida de 16% face a 2008. O investimento efectuado pela companhia liderada por Juan Roig cifrou-se nos 600 milhões de euros, tendo aberto 54 novas lojas e remodelado outras 24 para alcançar um total de 1.264 pontos de venda.

Ao longo de 2009, a Mercadona conduziu uma política de redução de preços média de 10%, permitindo ao retalhista poupar cerca de 1,5 mil milhões de euros aos consumidores.

Enquanto o retalhista beneficiou claramente de um ambiente favorável no primeiro semestre de 2008, a crise que se registou no país vizinho, em 2009, tendo levado à descida do PIB em 3,6% e deixando mais de quatro milhões de espanhóis no desemprego, bateu fortemente à porta da Mercadona

Contudo e apesar da quebra nas receitas e redução das vendas like-for-like em 3%, o retalhista conseguiu “escapar” relativamente bem à situação económica complicada. Dos 5 grandes retalhistas a operar em Espanha, o Carrefour foi o único a apresentar resultados até à data, tendo registado uma quebra de 7% nas vendas, enquanto o mercado espera resultados negativos do El Corte Inglés, Eroski e Auchan-Alcampo.

Assim, muito provavelmente, a Mercadona será o único grande player a aumentar vendas, embora de forma marginal, bem como quota de mercado, consolidando a sua posição como líder do retalho espanhol.

O foco na marca própria fez com que a quota desta aumentasse de 35 para 38% no total das vendas, enquanto o número de produtos comercializados nas lojas baixou em 500 para um total de 8.000. Em consequência, a Mercadona reafirmou o direito a seleccionar os produtos disponibilizados nos lineares e continuará a retirar referência que não se vendam, com o objectivo de aumentar a produtividade.

Obsessão com a poupança

Embora a Mercadona tenha registado lucros mais baixos que em 2008, a companhia implementou uma série de medidas que, em último caso, permitiram ao retalhista alcançar melhores resultados que estimados no início do ano (160 milhões de euros de lucro). Isto foi alcançado, em grande medida, pela redução já mencionada de 10% nos preços, permitindo assim manter a fidelidade dos consumidores.

Ao longo do ano passado, a Mercadona conseguiu introduzir várias medidas que permitiram à companhia gerar poupanças passadas para o consumidor na forma de redução de preço. Entre as medidas introduzidas pela Mercadona contam-se a utilização de todo o espaço livre em camiões, paletes, empilhadores e produtos de forma a reduzir os custos de transporte, passando pela venda de fruta e legumes avulso em vez de embalados e carne congelada, realidade pouco habitual no retalho espanhol.

Além disso, a Mercadona simplificou, também, o packaging de diversos produtos para reduzir custos. As embalagens de plástico são agora transparentes, permitindo ao consumidor ver o seu interior e, embora o produto não possa estar nas condições mostradas na fotografia da embalagem, só esta mudança permitiu uma redução de dois cêntimos por item. Medida idêntica foi tomada nas especiarias, tendo o retalhista mudado de frascos de vidro para frascos de plástico, representando um decréscimo de 25 cêntimos no preço por unidade.

Também as garrafas de óleo foram alvo de transformação, passando das garrafas clássicas para embalagens quadradas, aumentando, assim, a capacidade das caixas em que são transportadas em 48 unidades. Na sequência destas medidas, o retalhista já informou que está a estudar a possibilidade de implementar este conceito a outros produtos, como, por exemplo, as garrafas de vinho.

A Mercadona estima entre mil milhões e 1,1 mil milhões de euros as poupanças que conseguiu transpor para o consumidor pela implementação destas medidas. Além disso, a baixa dos preços das matérias-primas possibilitou poupanças entre 150 e 200 milhões de euros.

Fornecedores como elemento chave na redução de preços

Obviamente que os fornecedores foram peça chave na implementação destas medidas. Na realidade, os 103 principais fornecedores da Mercadona investiram 500 milhões de euros ao longo de 2009 para se adaptarem a sua produção aos novos requisitos definidos pelo retalhista.

De resto, a Mercadona já anunciou o compromisso de continuar com a redução de preços e já avisou os fornecedores que não assumirá quaisquer aumentos de preços injustificados. Juan Roig, presidente da Mercadona, revelou que “qualquer aumento de preço terá de ser cuidadosamente explicado, mas caso não se verifique qualquer aumento de preço nas matérias-primas não aceitaremos qualquer subida no preço”.

Mais vendas não significam mais lucros

Embora as vendas tenham registado um ligeiro aumento devido à redução de preços, essa medida atraiu mais 100.000 novos clientes, chegando ao um total de 4,3 milhões de consumidores. Isto levou a um aumento de 3% nas compras e a uma subida de 8% no volume total de produtos vendidos em 2009 quando comparado com o ano anterior de 2008, estimando-se um crescimento de 6% para o actual exercício.

Previsões

Este ano, a Mercadona continuará a reduzir a política de expansão de lojas, muito longe das 100 aberturas anuais registadas ao longo da década. No ano passado, a companhia reduziu o seu programa de aberturas em cerca de 30% para 74 pontos de venda e no actual exercício o retalhista deverá inaugurar somente 60 lojas em áreas onde já está presente, bem como remodelar mais 30 unidades.

O retalhista manterá, contudo, os planos de investimento de 600 milhões de euros, à medida que continuará a investir na rede de distribuição. A Mercadona abrirá um novo centro logístico, em Junho, num investimento de 200 milhões de euros, além de iniciar a construção do seu 10.º centro, num custo de 180 milhões de euros, estimando-se que esteja operacional em 2013-14.

Quanto à expansão internacional, a Mercadona adiou qualquer abertura fora do território espanhol até 2012, apontando a crise económica como principal factor. A companhia estará a estudar possíveis aquisições no Sul da Europa e Norte de África, aparecendo- contudo, a Itália como mercado mais que provável para a expansão.

Uma melhoria da situação económica permitirá à Mercadona alcançar um crescimento de 3% nas vendas e melhorar os lucros para níveis pré-crise. No entanto, o ambiente económico continuará fraco e prova disso mesmo é o compromisso da Mercadona criar somente 1.000 novos empregos nos próximos quatro anos.

A Mercadona continua, no entanto, bem posicionada para ultrapassar a crise com os seus supermercados de proximidade, à medida que os consumidores vão penalizando os hipermercados em benefício da conveniência a preço baixo e compras mais reduzidas. Embora o crescimento a duplo dígito das vendas pareça, neste momento, uma miragem, o retalhista continua a reforçar a sua posição no mercado retalhista espanhol, mantendo o ganho de quota aos principais concorrentes nos próximos anos.

Previsões Planet Retail:

Positivo:

A proposta de valor da Mercadona baseada em gamas de produtos de marca própria forte continuará a ser aposta vencedora, apesar da situação económica difícil;

A companhia continua a reforçar a sua posição no mercado retalhista, ganhando quota aos principais concorrentes, apesar da ligeira subida nas vendas.

Preocupações:

A decisão do retalhista em retirar determinadas marcas poderá deslocar para outras insígnias os consumidores não encontrem as marcas desejadas;

Caso a guerra de preços se intensifique, a baixa de preços poderá comprometer as estimativas de lucro da companhia para o actual exercício.

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