Outras Opiniões

Desaceleração económica americana – consequências

Por a 13 de Outubro de 2006 as 11:59

alexandre

Alexandre Mota, Analista da Golden Assets, Sociedade Gestora de Patrimónios

A desaceleração económica nos EUA tem sido confirmada pelos dados macroeconómicos mais recentes e reforçado por previsões sombrias sobre o comportamento da economia americana em 2007, veiculadas por várias casas de investimento. O arrefecimento económico é já notório nos sectores mais sensíveis tais como o imobiliário e de bens de consumo duradouros. No sector imobiliário o declínio na construção de novas habitações, assim como na venda de casas novas ou usadas, conjuntamente com o declínio do índice de sentimento NAHB (referência do sector imobiliário), são sinais claros de uma crise. O preço médio das novas casas caiu cerca de 10% desde Abril deste ano e espera-se que desça ainda mais nos próximos meses. Por sua vez, no sector automóvel e dos bens duradouros as sucessivas subidas dos juros e a alta dos preços do crude penalizaram as vendas nos últimos 12 meses, esperando-se que esta tendência continue porque a actual situação da economia americana no que diz respeito ao endividamento das famílias deixa pouca capacidade de manobra para fazer face a uma conjuntura difícil. Note-se que o consumo americano foi alimentado, em grande parte, por esquemas de refinanciamento das dívidas hipotecárias que já não são mais possíveis numa conjuntura recessiva ao nível do imobiliário.

Esta desaceleração da actividade económica terá consequências ao nível da criação de emprego e ao nível da confiança dos consumidores e consequentemente no consumo das famílias e crescimento económico. Em resposta a este cenário e mediante a gravidade do mesmo, o FED deverá descer as taxas de juro em 2007, embora a dimensão da descida dependa em larga medida da evolução dos vários indicadores macroeconómicos. A capacidade de manobra do FED depende também da evolução da inflação, que se espera naturalmente contida por um conjuntura económica mais recessiva.

Em contraste, na Europa os indicadores macroeconómicos divulgados registam uma melhoria da confiança dos agentes económicos. Na indústria há boas perspectivas ao nível das encomendas, especialmente as associadas à procura doméstica. No sector do retalho a confiança está próxima dos máximos, devido à melhoria da situação presente e estabilização das expectativas futuras. A confiança do consumidor está perto dos máximos devido a ligeiras melhorias ao nível do mercado de trabalho e baixa dos preços dos combustíveis. Há alguns riscos de sustentabilidade desta onda de optimismo, designadamente o aumento do IVA na Alemanha e também a possível desaceleração da economia americana acima referida. O BCE deverá subir as taxas de juro até 3.5% no final deste ano, mas temos dúvidas de que o ciclo de subidas se entenda a 2007, num contexto de aumento do IVA na Alemanha, desaceleração económica nos EUA e constrangimentos orçamentais. Não nos surpreenderia um pico de taxas nos 3.5% durante bastante tempo.

A economia portuguesa está a acompanhar a recuperação europeia, embora a discriminação por componentes do PIB revele um crescimento económico claramente liderado pelo sector exportador e, dessa forma, extremamente dependente da evolução da conjuntura externa. O consumo privado deverá continuar limitado pela política de consolidação orçamental, contenção salarial e elevado endividamento das famílias. A inflação deve permanecer contida devida ao entorpecimento da procura interna.

Mercados

Este ano os mercados accionistas têm registado uma performance positiva quer na Europa, quer nos EUA e com o aproximar do final do ano é possível que as valorizações continuem. Este ano foi marcado por movimentos de fusões e aquisições em vários sectores (banca, telecomunicações, eléctricas, etc) e também por uma onda positiva no sector das matérias-primas que acabou por ser corrigida nos últimos meses. Contudo, admitindo o cenário acima referido (desaceleração económica americana), apontamos como previsíveis as seguintes consequências nos vários mercados:

– maior procura de obrigações (especialmente americanas e nos prazos curtos);

– queda do dólar;

– subida do ouro;

– sector accionista dependente da reacção enérgica dos bancos centrais (descida de taxas) – em termos sectoriais esperamos:

– mau comportamento de sectores ligados ao consumo e construção;

– melhor comportamento de sectores ligados ao investimento em software e hardware, beneficiando das necessidades de investimento das empresas e upgrades tecnológicos;

– melhor comportamento do sector de materiais para a indústria, beneficiando do aumento das despesas de investimento e de excesso da procura face à oferta;

– melhor comportamento do sector energético beneficiando do excesso de procura relativamente à oferta.