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O Steve Jobs do café que criou uma marca universal

Por a 25 de Julho de 2018 as 16:36

Howard Schultz abandonou o cargo de executive chairman da Starbucks no final do último mês. Em mais de três décadas, o antigo CEO da companhia revolucionou o negócio do café nos Estados Unidos e a nível mundial

A primeira loja da Starbucks abre, em 1981, em Seattle. Mas a expansão da marca a nível mundial confunde-se com o percurso de um homem que entra para a companhia em 1982 para o cargo de diretor de operações no retalho e de marketing. De origens humildes, o judeu nascido em 1953, em Brooklin, Nova Iorque, cedo mostra ter uma visão que acabaria por projetar a empresa fundada por Gordon Bowker, Jerry Baldwin e Zev Siegl para um patamar universal.

O sonho de Howard Schultz começa a ser inspirado numa viagem à Europa. No ano seguinte à sua entrada para a Starbucks, Schultz visita Itália e aí esboça as primeiras ideias do que viria a ser a grande transformação da empresa. À época, a Starbucks apenas vendia café torrado. A ligação dos italianos à cultura do café, que Schultz observa nas ruas de Milão, tudo muda. É hora de expandir o conceito de coffee shop nos Estados Unidos. E de vender café expresso.

Schultz regressa com a convicção de que seria possível recrear em Seattle o ambiente as cafetarias existentes em Itália. Mas com café adaptado ao gosto dos americanos. Mais do que o consumo, ele observa a cultura e a socialização dos italianos nos bares em torno do café. Os donos e os fundadores da Starbucks não partilham, no entanto, do entusiamo de Schultz. O que fá-lo abandonar a companhia e angariar financiamento para fundar a sua própria empresa, a Il Giornale, nome inspirado no jornal italiano fundado em Milão. “Depois de Milão, regressei aos Estados Unidos, entusiasmado por compartilhar a minha experiência. Mas os meus chefes, os fundadores da Starbucks, por quem tinha imenso respeito, não compartilharam o meu sonho de recriar a experiência do coffee bar em Seattle”, conta Schultz na sua biografia. Gordon Bowker e Jerry Baldwin venderam a Starbucks e focaram-se no desenvolvimento da Peet’s Coffee, adquirida em 1984 pela Starbucks.

Quando a empresa fundada por Howard Schultz adquire, em 1987, a Starbucks, a empresa detinha 17 lojas. O plano para convencer os investidores passava pela abertura de 75 lojas em cinco anos. Schultz não queria uma empresa à imagem da Peet’s Coffee. Estava decidido a criar uma marca icónica a nível mundial. O plano não ficou aquém das expetativas. Antes pelo contrário. Schultz viria a abrir mais lojas do que o originalmente planeado. No final de 2017, seis meses antes de Schultz anunciar o abandono do cargo de executive chairman, a empresa detinha 27.339 lojas espalhadas pelo mundo.

Para além da sua visão de negócio, quais as características que tornam Schultz um dos CEO mais carismáticos do mundo? Considerado um líder transformador, rezam as crónicas que Howard Schultz sempre teve a capacidade de rodear-se dos homens certos. Mas Schultz, no final da década de 80, fez algo invulgar na altura: assegurou um pacote de benefícios aos empregados que trabalhavam em regime de part-time na empresa. Aos investidores, Schultz, filho de pais da classe trabalhadora, explicava que os benefícios dados aos empregados custavam metade do que o treino que a companhia necessitava de dar a um novo empregado. Esse programa é alargado nos anos 90, quando é oferecida aos empregados a oportunidade de comprar um determinado número de ações da companhia a um preço fixo.

No final da década de 80, a Starbucks detinha 55 pontos de venda. E é precisamente a partir da década de 90 que se dá a grande expansão da companhia. Em uma década, a abertura de novas lojas é vertiginosa.
É acompanhada pelo lançamento de novos produtos. No final dos anos 90, a Starbucks tinha já 2.498 lojas espalhadas pelo mundo e estava presente em vários mercados. A primeira loja fora dos Estados Unidos é aberta, em 1996, no Japão. Nesse ano, a Singapura também recebe a Starbucks no seu território. Além destes mercados, a companhia fecha a década com pontos de venda nas Filipinas, Inglaterra, Malásia, Nova Zelândia, Taiwan e Tailândia. Na mesma década são lançados produtos como o Frappuccino, uma bebida gelada à base de café. E os produtos da Starbucks começam a ser comercializados no retalho.

A viragem da companhia

O início do século marca um ponto de viragem na Starbucks. Howard Schultz deixa o cargo de CEO, focando-se na estratégia global da companhia. O legado deixado a Orin Smith, que assume o cargo de CEO, é de peso. Durante o período em que Schultz assumiu o comando dos destinos da companhia as receitas subiram de 19 milhões de dólares para mais de dois mil milhões de dólares. Mas a companhia foi vítima da rápida estratégia de crescimento delineada por Schultz.

Quando Howard Schultz assume, de novo, em 2008, o cargo de CEO, em substituição de Jim Donald, que detinha então o cargo, as vendas caiam, as ações da Starbucks desvalorizavam em bolsa e as próprias lojas viviam um problema de posicionamento derivado do rápido crescimento da companhia.

Num memorando interno de 2007, Schultz reconhecia que as lojas da Starbucks haviam perdido a alma do passado. A empresa apostou na inovação, tentou revitalizar a qualidade das suas bebidas e apostou num conceito de lojas inovador na sequência da aquisição da Hear Music. O problema, reconhecia Schultz, é que a Starbucks se tornara uma cadeia de massas que cobrava preços elevados por uma experiência que deixara de ser especial. E o próprio lançamento de novos produtos, com o intuito de tornar a cadeia mais apelativa, prejudicaram a imagem da Starbucks junto dos puristas do café.
O regresso de Schultz à liderança executiva tinha um propósito: “reorientar a companhia para fornecer aos clientes a experiência distintiva da Starbucks”, de acordo com um comunicado da Starbucks. A estratégia do líder visionário da Starbucks, como o apelidou o The New York Times, resulta. O valor de mercado da Starbucks em 2016, ano em que Schultz anuncia o abandono do cargo de CEO, era de 84 mil milhões de dólares, comparando com os 15 mil milhões de dólares que a empresa valia antes de assumir o cargo.

No final do mês de junho, Schultz abandonou as funções de executive chairman da companhia. A imprensa norte-americana especula que Howard Schultz, próximo dos democratas, tem intenções de avançar numa corrida à Casa Branca. Será Schultz o homem certo para tirar Trump da presidência de um país que nunca deixou de ser grande?

*Artigo originalmente publicado na edição impressa de julho do Jornal Hipersuper

 

 

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