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Tudo sobre a Negociação na cadeia de abastecimento, por José Antonio Rousseau

Por a 1 de Agosto de 2012 as 15:41

9º Gene do ADN da Distribuição – A NEGOCIAÇÃO (Parte I)

 

A moderna lógica do processo relacional produtor-distribuidor-consumidor, implica que produtores e distribuidores trabalhem em consonância e estreita colaboração para proporcionarem a mais ampla satisfação dos seus clientes comuns: os consumidores. Contudo, é bem evidente que ambos procuram também alcançar situações de poder sobre o mercado, através do lançamento de novos produtos, reestruturações, concentrações, novas aberturas, investimentos em comunicação, com o objectivo de adquirirem a maior fatia de poder possível para conseguirem dominar as negociações.

Muito se tem afirmado e repetido que o poder negocial se transferiu dos produtores para os distribuidores e que estes o exercem de forma ditatorial gerando assim conflitos. Mas que devemos entender por poder e por conflito? Se para Robert Dahl, o poder “é a capacidade de um indivíduo ou instituição forçar um outro agente a adoptar um comportamento que esse agente não teria escolhido espontaneamente”, para John Schopler será “o poder de um indivíduo A sobre um indivíduo B pode ser definido como a possibilidade de ver B adoptar um determinado comportamento após uma intervenção de A, comparando a possibilidade que teria tido B de adoptar esse comportamento na ausência das diligências de A” e, para Adel El-Ansary e Stern, o poder de um membro do canal é “a sua capacidade de controlar as variáveis que caracterizam as escolhas estratégicas de marketing de outro membro do canal operando a um nível diferente”.

Por sua vez, a noção de conflito pode ser abordada numa óptica de estudo ou de processo. Na óptica de estudo, o conflito é uma situação na qual existe uma relação social entre dois ou mais agentes, tendo um ou mais desses agentes a percepção dos outros agentes como adversários cujo comportamento se destina a trazer-lhes prejuízos. No óptica de processo, considera-se que o conflito pode resultar de objectivos divergentes entre os agentes económicos ou dos métodos postos em prática para atingir esses objectivos, de modo a que, para os resolver, se recorra a diversos procedimentos, tais como compromissos, cooperação, domínio, indiferença ou acomodação. Ora, qualquer negociação apresenta-se sempre como uma confrontação interactiva entre protagonistas, interdependentes mas aparentemente em conflito, ligados por uma certa relação de poder e revelando vontade de chegar ao acordo possível ou à solução que reduza as diferenças iniciais e permita atingir objectivos aceitáveis dentro da margem de manobra de cada um.

Novo estilo de relações

É inegável que a intensificação da concorrência e o abrandamento da expansão e do crescimento económico verificado nos últimos anos na Europa contribuíram decisivamente para deteriorar as relações entre fornecedores e distribuidores. Em Portugal, os anos 80 podem caracterizar-se por uma certa euforia marcada pelo desenvolvimento espectacular do consumo. Eles viram nascer o comércio moderno, que, ainda frágil e desorganizado, se encontrava sob o completo domínio dos fabricantes. A partir dos anos 90, a situação começou a alterar-se, principalmente por três ordens de razões: A exacerbação da concorrência entre os fabricantes; os esforços de organização e racionalização dos distribuidores que os tornam mais rígidos e exigentes na negociação; e os fenómenos de concentração de empresas e aquisição de dimensão crítica e a realização de grandes volumes de vendas pelos distribuidores. Ao longo destes últimos anos, os fornecedores, motivados pelo endurecimento das relações com a distribuição e a estagnação dos mercados num contexto concorrencial exacerbado, começaram a desenvolver grandes esforços de racionalização das suas gamas e de clarificação das suas políticas comerciais.

Estes esforços vão conduzir ao nascimento de um novo estilo de relações fundadas mais na colaboração e menos no afrontamento, o que, contudo, não significa ausência de dificuldades e de rigor nas negociações. De facto, os aspectos que hoje se negoceiam não são apenas produtos ou condições de compra, mas sim rentabilidades, o que implica para os negociadores terem de encontrar equilíbrios entre a rentabilidade dos produtos, a natureza da oferta e as necessidades dos consumidores.

Particularmente, quando a compra está centralizada, quem negoceia tem de seleccionar não só famílias de produtos, mas também os respectivos fornecedores com capacidade para responder às necessidades existentes e nas melhores condições de compra possíveis. E, se estiverem integradas num sistema de gestão por categorias, essas compras deverão organizar-se não sobre um mercado, mas sobre um conjunto de produtos de consumo similares, isto é, uma categoria, a qual deverá ser gerida como uma unidade desde a fábrica até às caixas de saída, com o objectivo único, e comum a fornecedores e distribuidores, de aumentar as vendas e a rentabilidade.

As negociações dos distribuidores podem desenvolver-se de maneira diferente consoante já exista ou não uma relação com os fornecedores. No caso de já existir uma relação com um determinado fornecedor, a fase de escolha de um fornecedor entre os muitos existentes no mercado é eliminada. Depois de detectada uma certa necessidade no seu sortido, a empresa de distribuição selecciona os artigos que pretende referenciar dentro da sua insígnia, podendo esta referenciação ter um custo associado para o fornecedor e que corresponde à sua entrada em linha.

Nas negociações em geral, fixam-se dois tipos de objectivos: os primários e os secundários. O importante é o que os primários sejam atingidos, enquanto os secundários podem ser apenas parcialmente atingidos.

“Acordo geral de fornecimento”

As empresas de distribuição gostam de assumir sempre a liderança de uma negociação, tentando conduzi-la no sentido de atingir os objectivos traçados sem prejuízo de uma adaptação às diferentes situações, conforme o fornecedor com que está a negociar, para que todo o processo negocial decorra da melhor forma. Contudo, numa negociação, por exemplo, com a Coca Cola, (uma marca absoluta indispensável em qualquer sortido, e em que qualquer empresa de distribuição vale menos de 10% para a Coca Cola, enquanto esta vale, na sua categoria, cerca de 80% para o distribuidor) a liderança pertence naturalmente ao fornecedor. Claro que em negociações com marcas relativas ou transparentes de fornecedores, a situação muda e a liderança negocial não escapa aos negociadores das empresas de distribuição.

Todas as empresas possuem um acordo, a que se dá o nome de “acordo geral de fornecimento” e que é renegociado todos os anos, com todos os fornecedores. Este acordo engloba todos os elementos da negociação que veremos a seguir e decorre do plano comercial em que se definiu a estratégia de acções e crescimento por categorias de produtos. A negociação é assim, por razões óbvias, um dos momentos mais delicados da relação entre distribuidores e fornecedores. Aliás, ela faz parte da natureza humana, tal como comer ou dormir, existindo sempre que duas partes discutem entre si a resolução de um problema comum. E nenhuma negociação poderá ter sucesso ao longo do tempo se ambas as partes não acreditarem que estão a ganhar alguma coisa com ela.

(Continua…)

Por José António Rousseau

Consultor e docente IPAM/IADE

www.rousseau.com.pt

 

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