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Crise afecta conservas

Por a 11 de Julho de 2008 as 17:00

conservantes


A escassez de matéria-prima, o aumento dos combustíveis e os custos de produção estão a afectar a indústria de conservas e enlatados. Quem sai a ganhar são as marcas da distribuição que, cada vez mais, vão ocupando espaço nos lineares.

O sector de conservas e enlatados encontra-se a passar pelas mesmas dificuldades inerentes a qualquer indústria afectada pela actual crise económica e consequentemente pelo aumento significativo dos preços dos combustíveis, dos materiais de embalagem e das matérias-primas. Os industriais ouvidos pelo Hipersuper referem que foram levados a reduzir as margens de forma a evitar que o preço final se reflita nos consumidores. Ainda assim, os efeitos sentem-se consideravelmente, uma vez que os consumidores têm optado por produtos de baixo custo e de menor qualidade. Os fabricantes são os mais afectados, visto que a situação acaba por deixar espaço de manobra às marcas da grande Distribuição. “Este mercado, apesar de amadurecido, é bastante competitivo, sendo disputado por muitas marcas. É também caracterizado por uma forte bipolarização entre marcas líderes dos fabricantes e da distribuição, com peso crescente destas últimas, à semelhança de outras categorias do retalho alimentar”, salienta Nuno Chança, gestor de produto da Coresa, responsável pelas marcas Bom Petisco, Tenório, Pitéu, Risonho e Líder.

As marcas próprias estão de dia para dia a ganhar terreno. Em volume, a quota de mercado das marcas brancas é superior em todos os segmentos, excepto no peixe. Já em valor, apenas os segmentos de fruta e legumes encontram-se à frente das marcas dos fabricantes. Os discounts são o canal líder em volume nos segmentos de fruta, legumes e carne. Os supermercados, por sua vez, detêm a maior quota no segmento das conservas de peixe.

Fabricantes atentos
Confrontados com o crescente aumento das marcas brancas, os fabricantes acreditam que a causa está na situação económica do País que leva os consumidores a procurarem produtos de baixo valor. No entanto, têm confiança que a qualidade é crucial para a escolha final. Nuno Chança observa que “as marcas próprias têm um posicionamento de baixo preço que leva ao aumento da procura em ciclos económicos depressivos. As marcas líderes, como a Bom Petisco, podem de algum modo sofrer com esta situação conjuntural, mas face ao posicionamento diferente que detém, não há motivo para receios visto que apresentam vantagens competitivas diferenciadores e significativas relativamente às marcas da distribuição e que o consumidor esclarecido e informado considera uma mais valia”.

Adriana Tamang, responsável pela Ramazzotti, reforça que o crescimento da quota das marcas próprias acontece uma vez que o consumidor “face à crise económica e ao aumento de visibilidade das mesmas, aceita estes produtos como de qualidade” e acrescenta que esta “é uma situação vivida em diversos mercados que merece toda a atenção dos produtores”.

Vera Moreira responsável pela marca Ferbar, Del Monte e Hochwald, refere estar consciente da importância das marcas próprias e da forte presença destas junto dos consumidores e da consequente necessidade de oferecer produtos de maior valor percebido aos consumidores.

Mercado em crescimento
Guerras à parte, o facto é que este é um sector em contínuo crescimento. Entre a escolha de uma marca ou outra estes continuam a ser produtos indispensáveis nas cozinhas portuguesas. Contornar o tempo de preparação é, cada vez mais, regra de ouro numa cozinha. Logo, ingredientes preparados e prontos a acrescentar a qualquer cozinhado são uma mais valia. Conservar significa “fazer durar”. É esta permanência e durabilidade que faz com que estes tipos de produtos sejam tão apreciados nos nossos lares. Como esclarece Luísa Silva, gestora de negócio da Divisão de Vegetais e Tomate da Compal “a falta de tempo para a utilização do feijão seco, que necessita remolho e cozedura, é uma das principais alavancas para o consumo destes produtos”.

Face ao crescimento deste mercado, Joana Leitão, product manager da Nobre, enfatiza que “o mercado de conservas e enlatados tem vindo a crescer sustentadamente. Factores como a falta de tempo dos consumidores, aliada à comodidade, diversidade e preço dos produtos, têm contribuído para o sucesso deste mercado”.

As leguminosas ocupam a maior proporção da roda dos alimentos. O seu consumo deve ser no mínimo de 3 a 5 porções. Por isso mesmo, os vegetais são a categoria mais vendida, com crescimentos significativos. Na lista seguem as categorias de carne, peixe e fruta, respectivamente. Contudo, com uma quota de mercado bastante inferior.

A fruta e a carne têm registado descidas acentuadas, tanto a nível de volume como de valor, face aos valores verificados entre 2006 e 2007. A responsável da Ramazzotti, especialista em fruta enlatada, explica que “as conservas de fruta, devido ao tempo instável que se sente, têm sofrido maior oscilação”.

No que diz respeito à escassez de matéria-prima, esta tem-se feito sentir com maiores proporções no mercado das conservas de peixe. Como é o caso do atum, que detém uma quota de mercado em volume de 85,9% dentro da categoria, deixando apenas cerca de 14% para os outros tipos de peixe e marisco. “O atum é um recurso limitado que está cada vez mais escasso”, frisa Nuno Chança.

Face a esta situação, a Compal tem optado por “dar prioridade à manutenção dos volumes, fazendo nesse sentido todos os esforços por não passar para o preço final as subidas efectivas que chegam em alguns produtos aos 40%”, garante a responsável.

Já a Ferbar, encontra-se mais pessimista. Vera Moreira sublinha no que diz respeito concretamente às matérias-primas e ao consequente aumento dos preços de mercado que “a incerteza é a única certeza”.

Inovações em falta
O mercado encontra-se desprovido de inovações. As indústrias têm apostado pouco em fortalecer os seus portfólios, contudo, têm optado por melhorar os produtos já existentes. “Os hábitos de consumo estão muito enraizados nos produtos standard que fazem os grandes volumes deste mercado. As novidades levam por vezes anos até conseguirem ter representatividade. São produtos dirigidos ao consumo familiar, no qual existe uma prescritora responsável pelas compras do lar que filtra as novidades. É necessário convencê-la da compra, da experimentação e da adopção do produto em continuidade, o que não é um processo rápido”, observa. A responsável salienta ainda que no mercado de conservas e enlatados “existem algumas novidades em termos de variedades, no entanto, não acredito que se possam considerar inovações”.

“O mercado não se mostra dinâmico em termos de inovação. O lançamento da linha de legumes Ferbar com baixo teor de sal terá sido relevante. Na classe de conservas de carne, especificamente no segmento de salsichas, surgiram alguns produtos condimentados inovadores” aponta a responsável da Ferbar.

Os consumidores estão cada vez mais atentos a problemas de saúde derivados de uma má alimentação. Por isso mesmo, é preocupação dos fabricantes encontrar soluções que satisfaçam os consumidores. Os produtos biológicos são cada vez mais procurados nos lineares. Contudo, são alternativas que ainda não se encontram nos portfólios das indústrias do sector de conservas e enlatados. Luísa Silva afirma que no segmento de vegetais “os produtos biológicos começam a surgir nos “frescos”, mas ainda em pequenas quantidades, insuficientes para a indústria”.

No entanto, surgiram algumas alternativas ligth, como são exemplo as soluções de atum em lata conservado em azeite ou água, substituindo assim o habitual óleo, lançadas pela Bom Petisco. Neste sentido, Nuno Chança explica que “os consumidores estão cada vez mais informados e esclarecidos, pelo que são cada vez mais exigentes no que respeita à qualidade dos produtos consumidos que lhes proporcionam melhor qualidade de vida”, o responsável acredita que a preocupação com a saúde é cada vez maior, o que levou “ao aumento considerável do consumo de conservas de peixe nos molhos azeite e água”.

Neste mesmo sentido, a Nobre foi das poucas empresas do sector a desenvolver produtos light, como, é exemplo, o lançamento, em Setembro de 2007, das Salsichas Nobre Aves. “A área de produtos dirigidos a consumidores com uma maior preocupação com a saúde e o bem-estar tem vindo a ganhar grande expressão, pelo que a Nobre tem respondido antecipadamente a esta tendência”.

O packaging não tem sido uma grande preocupação neste sector, no entanto algumas marcas têm tentado alterar esta tendência surgindo com produtos com soluções de embalagem inovadoras. A Bom Petisco em 2002 lançou os filetes de atum Bom Petisco “em frasco de vidro, material mais nobre que constitui uma mais-valia na apresentação do produto e que em termos de impacto ambiental é reduzido pois é facilmente reciclável, assim como o alumino”, salienta o responsável, acrescentado que “com este lançamento criámos uma subcategoria premium tendo sido eleito Produto do Ano 2005 pelo seu carácter inovador”.

Conservas ou conservantes?
Os produtos em conserva sofrem de grande desconfiança por parte dos portugueses. Mitos como “fazem mal à saúde” ou “estão repletos de conservantes” provocam dores de cabeça aos fabricantes que a todo o custo tentam desmistificar estas ideias junto dos consumidores. Alguns produtos como é o caso do feijão enlatado da Compal deve ser consumido na sua totalidade, ou seja deve ser consumido em conjunto com a água que o envolve, pois é essa mesma água que esteve presente na cozedura e que reúne todos os ingredientes libertados. O consumidor ao inclui-la na preparação dos seus pratos está assim a ingerir todas as qualidades nutritivas do feijão.

“Existem ideias muito enraizadas sobre este tema que dificilmente são contornadas. A Compal tem produzido artigos no sentido de esclarecer o processo de conservação, tem incentivado visitas a fábricas e dá especial destaque na embalagem à menção ‘sem conservantes’. A credibilidade da marca gera ideias contraditórias no consumidor que, por um lado, acredita na Compal mas, por outro, tem dificuldade em dissociar conservantes de conservas”, explica a responsável, acrescentando que “é um conceito que interessaria a todos esclarecer”.

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