Marcas & Patentes

A marca comunitária

Por a 19 de Janeiro de 2007 as 11:16

joão mioludo

Num artigo anterior reportamo-nos às vias de registo e à possibilidade dos interessados obterem protecção para as suas marcas através do “Sistema de Madrid”. Através de um registo nacional, ou de um pedido de registo, e desde que o respectivo Estado da nacionalidade do titular ou requerente seja parte contratante do Acordo de Madrid ou do Protocolo ao Acordo de Madrid existe a possibilidade de se obter protecção para a marca em tantos países quantos aqueles que forem de interesse e desde que, naturalmente, sejam também parte daqueles Acordos.

Paralelamente aos registos nacionais e internacionais de marcas, existe ainda a possibilidade de se registar uma marca comunitária. A necessidade da criação de uma marca comunitária remonta aos anos 60 do século passado, mas só foi concretizada pelo Regulamento do Conselho da União Europeia nº 40/94, de 20 de Dezembro de 1993. Este Regulamento, já objecto de alterações recentes, é completado pelo chamado Regulamento de Execução (Regulamento nº 2868/95, de 13 de Dezembro de 1995), visando estabelecer regras procedimentais relativas ao processo de registo da marca comunitária. Está ainda em vigor um Regulamento sobre as taxas oficiais e outro sobre as regras do procedimento nas Câmaras de Recurso do IHMI.

Como se sabe os Regulamento da UE são directamente aplicáveis em todos os Estados membros, daqui decorrendo que uma vez registada uma marca comunitária, o seu registo produz efeitos em toda a União.

O organismo responsável por este registo é o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (IHMI), com sede em Alicante.

O regime da marca comunitária está em vigor desde 1 de Abril de 1996, e pode dizer-se que tem sido um sucesso. Na verdade, o número de pedidos de registo tem excedido todas as expectativas, mas é sobretudo pela sua aplicação que este sistema se tem revelado inovador. Referimo-nos, em concreto, à interpretação e aplicação das disposições regulamentares, quer por parte do IHMI e das respectivas Câmaras de Recurso, quer mesmo por parte do Tribunal de 1ª Instância.

As vantagens da marca comunitária são evidentes: através de um único pedido pode obter-se protecção para a marca em 27 países, utilizando apenas uma língua e um só representante.

A marca comunitária está sujeita apenas a um exame, e a um único acto de renovação.

O pedido de registo pode ser apresentado em qualquer uma das línguas oficiais da União, por exemplo, o português, muito embora o regulamento institua apenas o inglês, o francês, o alemão, o castelhano ou o italiano como línguas oficiais da marca comunitária, devendo o requerente optar por uma delas para os casos de contencioso, cuja tramitação deve utilizar apenas uma destas cinco línguas.

A apresentação de um pedido de registo pode ser directamente efectuada em Alicante, mas também junto dos diversos Institutos nacionais, existindo ainda a possibilidade de se utilizar a via electrónica (e-filing).

A representação perante o IHMI é feita por advogados e por mandatários autorizados inscritos na lista oficial do IHMI, sendo que a inscrição na lista de mandatários autorizados está reservada aos profissionais reconhecidos como representantes junto do IHMI. Os advogados devem estar habilitados a exercer no território de um Estado membro e que possua o seu domicílio profissional na Comunidade, na medida em que possa agir no referido Estado na qualidade de mandatário em matéria de marcas.

Nos pedidos de registo o requerente pode reivindicar a antiguidade de uma marca nacional anterior (ou várias), desde que essas marcas estejam em nome do mesmo titular, que a marca seja a mesma e que se destine a assinalar os mesmos produtos e/ou serviços. Este princípio da antiguidade tem por escopo evitar que possam surgir reclamações ou acções de invalidade que tenham por base marcas nacionais de terceiros anteriores ao pedido de marca comunitária, naquele ou naqueles países onde o direito anterior existe.

Uma outra importante característica do regime da marca comunitária é a possibilidade de transformação da marca comunitária em pedido de marca nacional. Nos casos em que o pedido de marca comunitária seja recusado, retirado ou considerado retirado, ou quando a marca comunitária deixe de produzir efeitos, o requerente ou o titular de uma marca comunitária pode requerer a transformação do seu pedido ou da sua marca comunitária em pedido de marca nacional.

E, muito importante, o pedido de marca nacional com origem na transformação de um pedido ou de uma marca comunitária beneficia, no Estado membro em causa, da data de depósito ou da data de prioridade desse pedido ou dessa marca, e mesmo da antiguidade de uma marca caso tenha sido reivindicada.

O tema da marca comunitária é vasto, se considerarmos a complexidade e especificidade da sua regulamentação.

O próprio processo de registo é complexo. Por exemplo, um pedido de registo segue uma tramitação própria, que pode resumir-se a cinco fases: atribuição da data de depósito; relatórios de investigação; recusa por motivos absolutos, publicação do pedido; prazo para oposição de terceiros.

Importa salientar que o IHMI procede a um estudo da marca com vista a apurar da sua inerente registabilidade, ou seja, da capacidade distintiva do sinal e da sua possibilidade de ser registado como marca (exame por motivos absolutos). Por exemplo, não poderá ser registada uma marca constituída exclusivamente por sinais ou indicações que se tenham tornado habituais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio.

Porém, o IHMI não recusará oficiosamente o registo de uma marca comunitária idêntica ou confundível com outras marcas comunitárias ou nacionais anteriores (motivos relativos de recusa). Serão os interessados que terão de manifestar esse interesse, deduzindo oposição.

Há, assim, que exercer uma vigilância contínua e assídua, com vista a evitar que se constituam direitos sobre marcas comunitárias que colidam com marcas anteriores, incluindo marcas nacionais ou outros direitos de base nacional e que validamente possam motivar a recusa de uma marca.

Muito fica por dizer sobre este regime da marca comunitária. Contamos numa próxima ocasião voltar a este fascinante tema.

João Paulo Mioludo FURTADO

Gabinete Técnico de Marcas e Patentes – [email protected]