Segurança Alimentar

Ultracongelados e a sua cadeia de distribuição

Por a 15 de Setembro de 2006 as 16:11

Joaquim Dias, Engenheiro Alimentar

A mudança de hábitos alimentares, associada ao estilo de vida em que as pessoas dispõem de pouco tempo para se dedicarem à preparação de refeições, tem levado a um aumento no consumo de alimentos ultracongelados. Estes alimentos tornam-se ainda mais atractivos por estarem associados a uma imagem de qualidade, apresentarem-se limpos e arranjados e de terem uma validade grande, permitindo armazena-los por longos períodos de tempo e ter uma cadeia de distribuição mais longa, proporcionando às pessoas o acesso a alimentos fora de época ou provenientes doutras partes do mundo.

Os ultracongelados devem ser mantidos a uma temperatura igual ou inferior a -18ºC, de forma a cessar qualquer actividade microbiológica susceptível de alterar a sua qualidade. O seu fabrico consiste na remoção de calor do alimento de forma a reduzir a sua temperatura abaixo do ponto de congelação da água, passando esta para o estado sólido sob a forma de gelo. Assim, a energia diminui e a água, imobilizada na forma de gelo, deixa de estar disponível, inibindo desta forma o crescimento microbiano e reduzindo o número e a velocidade das reacções bioquímicas responsáveis pela degradação dos alimentos. Apesar do crescimento microbiano cessar abaixo dos -10ºC e as alterações químicas serem mínimas abaixo dos -18ºC, elas continuam a ocorrer, mas a um ritmo mais lento.

A eventual falta de qualidade deste tipo de alimentos está relacionada com a dimensão dos cristais de gelo formados no seu interior. Uma congelação lenta leva à formação inicial de cristais de gelo nos espaços entre as células o que provoca um aumento na concentração de sais, corrigida com a migração da água do interior das células para esses espaços. Como consequência as células ficam desidratadas e os cristais de gelo formados nos espaços extra celulares tornam-se excessivamente grandes, provocando o rompimento das células, situação agravada pela natureza molecular da água, que ao contrário das outras substâncias, ocupa um volume maior de espaço no estado sólido do que no estado líquido. Os alimentos perdem assim a sua forma natural tornando-se moles e secos, ficando mais susceptíveis à deterioração e mais pobres em sabor e valor nutritivo. Esta situação ocorre também com muita frequência durante a cadeia de distribuição onde o alimento sofre flutuações na temperatura provocando a sua descongelação e recongelação.

É no retalho onde a quebra na cadeia de frio acontece com maior frequência. Os problemas começam na distribuição, onde as empresas responsáveis pelo transporte tentam fazer a entrega ao maior número possível de clientes numa única rota, de forma a rentabiliza-la. Isto implica a abertura das portas do veículo frigorífico várias vezes, com consequências óbvias no aumento da temperatura. No interior das lojas, os móveis utilizados na exposição são colocados de maneira a atrair mais clientes e proporcionar mais vendas, ou seja, em locais bem iluminados e de fácil acesso. Isto vai contra a disposição ideal dos equipamentos de frio, que deveriam ser colocados longe de fontes de calor e de entradas, afim de evitar flutuações nas temperaturas de conservação. Estes equipamentos estão desenhados tendo em conta a conservação e também o merchandising e a venda, na tentativa de proporcionar um balanço entre estas exigências. Por norma, os clientes são mais atraídos para ilhas abertas horizontais de onde podem retirar os produto rapidamente e para móveis verticais com prateleiras dispondo os alimentos ao nível dos olhos. Estes móveis apresentam problemas, quer seja no facto de serem abertos e permitir a transferência de calor para o interior, quer no facto de perderem o “frio” que cai das prateleiras superiores cada vez que se abre a porta. A melhor solução para alimentos ultracongelados são arcas horizontais protegidas com uma tampa própria, o que permite conservar o frio de uma forma mais eficaz. No entanto, estes móveis criam uma maior resistência por parte dos clientes por apresentar uma barreira física entre eles e o alimento, por os produtos se tornarem muitas vezes invisíveis devido à condensação da água no tampo de vidro cada vez que o móvel é aberto, e pelo acesso ser feito apenas de um lado, ao contrario das ilhas que podem ser acedidas por ambos os lados.

A evolução nesta área passará pela criação de móveis que combinem com maior eficiência a venda e a preservação da temperatura, pela introdução de embalagens que protejam melhor os alimento das oscilações de temperaturas, por inclusão nas embalagens de indicadores de tempo e temperatura que escurecem com o decorrer do tempo e com abusos de temperatura, informando os consumidores acerca da frescura do alimento e pelo controlo na formação de cristais durante o processo de congelamento.