Distribuição

José António Rousseau, Autor do livro “Manual de Distribuição”

Por a 4 de Abril de 2008 as 12:00

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«A face oculta da Distribuição»

Dez anos após a primeira edição, José António Rousseau volta a dar à estampa o Manual de Distribuição, agora enriquecido com reportagens e um CD. 28 anos de experiência profissional, que acumula com a docência, a escrita e poucas horas de sono, revelam a face pouco visível do sector numa obra sem paralelo em Portugal.

A reedição da única bíblia em Portugal dedicada ao universo da Distribuição abre com o prefácio de Daniel Bessa. Para o ex-ministro da economia não restam dúvidas: «a segunda edição do Manual de Distribuição vai ser um êxito de vendas ainda maior do que a primeira». A primeira esgotou rapidamente 12 500 exemplares e as numerosas solicitações a partir de então serviram à concretização da nova obra.

Hipersuper (H): O que mudou na sua relação com a Distribuição organizada nos últimos dez anos?
José António Rousseau (J.A.R.):
Desde 1980 que estou ligado à Distribuição. Recém-licenciado assumi a secretaria-geral da Associação Nacional de Supermercados (ANS) que veio mais tarde dar origem à APED (Associação Nacional das Empresas de Distribuição). Mais recentemente, desde 1991, exerço funções académicas na área do marketing e da Distribuição. Em virtude da pedagogia, iniciei em Portugal a cadeira Marketing da Distribuição. A Distribuição era, então, tão só uma das variáveis do marketing mix. Na minha disciplina, é um sector de actividade, com muito mais profundidade e dimensão do que uma mera variável de marketing mix.

Foi também nessa altura, e já lá vão 16 anos, que comecei a investigar e a estudar profundamente a temática da Distribuição, o que me permitiu, em 1997, publicar o primeiro livro. O Manual de Distribuição era uma compilação do material que eu já prepara para os meus alunos. Quatro anos depois, lancei o Dicionário da Distribuição. Em 2002, O que é a Distribuição? E dez anos depois da primeira aventura, vou lançar a segunda edição do Manual da Distribuição.

H: É professor universitário, director-geral APED, escreve livros. Como consegue disponibilizar tempo para os projectos especiais?
J.A.R.:
O dia tem 24 horas e eu durmo cerca de cinco horas.

H: Que factores o levaram a publicar a segunda edição do Manual de Distribuição?
J.A.R.:
Em dez anos muda muita coisa e o livro tem muitos dados quantitativos.

H: Quais foram as grandes transformações?
J.A.R.:
Em primeiro lugar, foram dez anos de afirmação. Assistimos à consolidação das principais empresas portuguesas de Distribuição e também à sua saída para outros mercados. Nem todas com os melhores resultados, nomeadamente as experiências feitas no Brasil. Mas, na Polónia correu muito bem e actualmente a insígnia líder da Distribuição polaca é portuguesa, a Biedronka. E há ainda empresas a entrar no mercado espanhol.

Outro aspecto importante foi a entrada de vários operadores internacionais de vários conceitos comerciais, nomeadamente hipermercados – por exemplo, a Auchan não estava cá há dez anos – discounts e, principalmente, players mundiais da área não alimentar.

A oferta também mudou bastante. Os produtores portugueses cresceram juntamente com a Distribuição. Aumentaram o portfólio, consolidaram as categorias de produtos, das quais são exemplo lacticínios, bebidas, congelados e refrigerados.

O consumidor é hoje muito mais maduro, informado e exigente. Se há dez anos mantinha algum grau de fidelização face a algumas insígnias, actualmente o consumidor, seja de que extracto social for, vai indiferentemente, consoante o momento de consumo e as características das compras, a qualquer um dos conceitos comerciais. Há uma adequação das compras às necessidades e circunstâncias do momento, o que é positivo porque o consumidor valoriza todos os conceitos.

O comércio electrónico veio permitir que os consumidores possam comprar os produtos, e receberem-nos nas melhores condições, sem saírem de casa.

H: Deram-se ainda duas alterações de mercado: a entrada nos sectores de medicamentos de venda livre e combustíveis?
J.A.R.:
São duas situações distintas. Sempre foi possível vender combustível, mas as insígnias não o encaravam enquanto core business. Concessionavam o negócio a empresas do ramo. Por isso, existiam hipermercados ao lado de postos de abastecimento de grandes operadores. Além disso, não era possível à empresa de Distribuição adquirir directamente combustível para vender. Quando chegou a abertura de mercado, as insígnias começaram a explorar directamente o negócio. Em 2001, a legislação sofre novamente alterações e proíbe a instalação de postos de combustível em “zonas de risco”, onde estavam incluídos os hipers e supermercados. Em 2004, a legislação mudou de novo e recuperou-se a liberdade anterior.

Quanto aos medicamentes, há cerca de três anos, mas na prática há apenas ano e meio, surgiu a lei que permitiu a comercialização dos medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM) fora do canal farmácia.

São dois mercados cheios de potencial para crescer. Por exemplo, em França, mais de 50% do combustível é vendido por postos que estão inseridos em supers e hipermercados. No que diz respeito aos medicamentos, os MNSRM representam entre 6 a 7% do mercado total, o crescimento está limitado a este valor.

H: Em 2007, anunciaram-se dois negócios que implicaram a saída de dois operadores internacionais de Portugal: Carrefour e Tenglemann. O fenómeno de concentração é saudável?
J.A.R.:
A concentração é umas das três grandes tendências da cadeia de valor, juntamente com a internacionalização e centralização (concentrar numa única estrutura várias componentes da gestão, nomeadamente as compras). A fusão de empresas começou na indústria, é transversal a quase todas os sectores de actividade económica, e chegou à Distribuição. É uma tendência internacional e natural e tem como justificação a aquisição da “dimensão crítica”, o limiar abaixo do qual as empresas não têm viabilidade e capacidade de sobreviver no mercado onde estão a competir.

H: Foi o que aconteceu com estes operadores?
J.A.R.:
Não. A Plus e o Carrefour são empresas muito grandes. São decisões tomadas a nível estratégico pelas casas mãe. O Carrefour é líder europeu e a empresa número dois do mundo, e estrategicamente não considera viável não ser líder nos mercados onde compete. Assim, nos mercados onde sente não reunir condições para atingir a liderança, desinveste. Foi assim, na Suiça, República Checa e Portugal. Por outro lado, está com uma dinâmica de expansão muito forte para os países orientais e canaliza os recursos para investir nos mercados mais atractivos.

Quanto à Plus, tinha alienado em Espanha a sua rede de lojas e não havia razão para a manter em Portugal. A rede ainda estava subdimensionada quando comparada com os dois principais players na área do discount: Dia/Minipreço e Lidl.

H: Duas palavras para definir a nova edição?
J.A.R.:
Sistematização é uma palavra-chave. A Distribuição, dada a sua própria natureza, é algo com que lidamos todos os dias nos actos de consumo. Temos tendência a considerar que sabemos tudo sobre o sector porque vamos às lojas, mas não é verdade. A Distribuição é muito complexa e vai muito além da face visível. E muitos deste conhecimentos estão dispersos. O meu livro pretende agregar esses conceitos dispersos e sistematizá-los.

Pretende ainda ser completo, ou tão completo quanto possível. A minha intenção é que não tenha ficado nada de fora no que diz respeito à Distribuição. Embora nem tudo possa ter o mesmo grau de profundidade.

H: Quem é o público-alvo?
J.A.R.:
O leitor que já desenvolve actividade profissional na Distribuição, ou presta serviços para o sector. Um profissional de uma empresa industrial com relações comerciais com a Distribuição tem interesse para conhecer o sector onde os seus clientes se movimentam. Uma das regras básicas do marketing é conhecer os clientes tão bem quanto a nós próprios.

Por outro lado, os próprios profissionais da Distribuição que devem conhecer o sector de actividade a que pertencem. O livro pode ser essencial às acções de formação dadas pelas empresas de Distribuição. E ainda o público académico. Nestes dez anos não surgiu mais nenhum livro dedicado à Distribuição.

H: Entre as novidades desta edição, destaca-se a inserção de notícias e reportagens e um CD com estudos dos seus alunos.
J.A.R.:
Optei por inserir 150 artigos e reportagens publicadas em diferentes meios de informação porque a imprensa oferece ao leitor um contacto directo com a realidade. Como o livro é conceptual, esta componente prática, não escrita pelo autor, serve de complemento à parte teórica.

Quanto ao CD, a escolha está relacionada com a utilização das novas tecnologias e é um meio mais barato. O objectivo dos casos de estudo é fazer uma radiografia de uma empresa ou de uma variável em particular. É uma homenagem aos meus alunos.

Há ainda outra novidade. A introdução de um sumário e objectivos a atingir com a leitura, para facilitar o trabalho aos professores que utilizem o livro no ensino.

H: A primeira edição foi dedicada a Figueiredo Vasco, primeiro presidente da ANS. A segunda aos seus alunos, porque já “aprendeu muito com eles”. Pode apontar exemplos?
J.A.R.:
Um professor aprende sempre duas vezes, quando tem de se preparar para dar as aulas e depois no contacto com os alunos, e muito deles são profissionais de diferentes actividades. Os próprios trabalhos que requerem investigação também trazem elementos novos ao professor.

H: Estruturou o livro em cinco partes. Quais?
J.A.R.:
A primeira parte introduz os principais aspectos da Distribuição (análise dos sectores grossista e retalhista e os conceitos comerciais inerentes a cada um). A segunda parte dedica-se ao ponto de venda. Onde tudo acontece e se transforma. A evolução da Distribuição faz-se a partir do ponto de venda (análise estática e dinâmica). A terceira diz respeito às relações produtor/distribuidor. Na penúltima parte, focalizo-me na definição de uma empresa de Distribuição. Por último, analiso o comércio na União Europeia.

H: Qual vai ser a tiragem?
J.A.R.:
São três mil exemplares.

H: E preço de capa? Onde vai estar à venda?
J.A.R.:
São 25 euros e está à venda em todas as livrarias a partir de 1 de Abril. O lançamento terá lugar neste dia, na Fnac do Colombo, às 19 horas.

H: Tem outros projectos no prelo?
J.A.R:
Sim. Estou a trabalhar na história da Distribuição, analisar a evolução do sector numa perspectiva histórica.

H: Que desafios enfrenta o sector da Moderna Distribuição?
J.A.R.:
Ter a capacidade de mudar. Por maior que seja o sucesso, o volume de vendas, a adesão dos consumidores, nunca estar satisfeito. Só essa capacidade permite a qualquer empresa estar à frente das outras. Hoje, a empresa x pode ter os maiores indicadores de rentabilidade mas amanhã já não ser assim se ficar parado no tempo. A metáfora do tapete rolante aplica-se bem à Distribuição.

Se nos colocarmos parados no sentido contrário à orientação de um tapete rolante, caminhamos para trás. Se caminharmos não passamos do mesmo sitio. Se corremos, então avançamos alguma coisa. O correr na Distribuição é a capacidade de mudar e ir à frente dos concorrentes e tanto quanto possível à frente dos acontecimentos, com base nos sinais do mercado, nos comportamentos dos consumidores e nos exemplos dos mercados mais avançados. Associado a este desafio estão todos os outros: globalização, novas tecnologias, entre outros.

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