Distribuição

“A polarização do consumo é uma das principais tendências”

Por a 8 de Julho de 2011 as 14:09

Pedro Barbosa, docente da disciplina Tendências de Consumo do MBA Executivo da EGP-UPBS

 

Camaleão. Assim é o consumidor. Da mesma forma que compra o produto mais barato do mercado gasta uma fortuna num pequeno luxo. A polarização é uma das principais tendências de consumo


Hipersuper (H): Quais as principais tendências de consumo até 2013 na área de retalho?

Pedro Barbosa (P.B.): Vingarão os que estiverem no “low end” e no “high end”, nos mercados e sectores certos e com a atitude adequada. No “low end” é necessário saber quais os serviços que os clientes menos valorizam, para adequar a oferta, tendo não pior qualidade mas menos serviços, promovendo uma oferta digna e aceitável a um custo mínimo, sempre que escalável.

No “high end” é preciso criar serviços diferenciados ou exclusivos, procurando de igual forma cortar com todos os custos que não suportem um valor obrigatório na incorporação do produto ou serviço.

Por outro lado, não serão nem as pequenas nem as grandes empresas a ganharem… serão as ágeis. Aquelas que forem capazes de apreender rapidamente as tendências e iniciar rapidamente a curva de adaptação.

H: E no que diz respeito aos formatos?

P.B.: Quanto aos formatos de retalho, os clientes gostam de ter um mix de opções, entre “department store”, centros comerciais, rua e “outlet”. No entanto, são exigentes – e ainda bem – com o desempenho de cada um destes formatos. Qualquer um que tenha uma gestão centralizada e adequada à zona de influência principal pode ter sucesso.

H: Como chegou a estas tendências e previsões? Em que se baseou?

P.B.: As tendências são analisadas numa base de crowdsourcing, resultando da colaboração directa de mais de duas mil pessoas e indirecta através de blogs, sites, livros, artigos, posts, vídeos, webinars, conferências, entre muitos outros formatos que acrescentam valor através do conteúdo todos os dias.

Para este efeito, foi criado um modelo que permite recepcionar milhares de propostas de tendências, filtrar, investigar e confirmar com outros tantos coolhunters em outras zonas do Mundo, até se chegar a uma shortlist de cerca de 200 tendências altamente relevantes, distribuídas por ordem sectorial.

H: As tendências são, nesse caso, globais ?

P.B.: Todas as tendências que analisamos e tratamos são com uma perspectiva global. Evidentemente, há algumas com características mais regionais, sobretudo porque a onda da globalização avança em velocidades distintas em diferentes partes do globo.

H: Explica na sua análise que em momentos de crise aumenta a oferta e baixa a procura e que o consumidor “camaleão” se adapta a este ciclo. Pode explicar melhor?

P.B.: É uma outra forma de explicar a polarização do mercado. O mercado deixou de se dividir entre “gordos e magros”, “ricos e pobres”, “altos e baixos”, “louros e morenos”, “novos e velhos”, e todas as demais segmentações que são consideradas na análise tradicional do Marketing. É o mesmo cliente que hoje, no seu consumo, se comporta de uma forma camaleónica.

Para cada cliente existe uma gama de produtos (a maioria) cuja escolha é mais ou menos indiferenciada. Para estes produtos, o cliente vai procurar o mais barato. Vai procurar o local em que a compra é mais competitiva, dentro de determinados padrões de conveniência, como a localização. Vai comparar e ser pouco fiel, sempre na procura do melhor negócio. Isto não significa necessariamente que esteja a comprar o produto mais barato da gama. Pode estar a comprar um produto líder inclusivamente, mas que esteja disponível em várias localizações. Nestes casos, o cliente vai procurar o local mais acessível em cada momento.

H: E extremo oposto a oferta diferenciada.

P.B.: No outro extremo estão os produtos e serviços que para o mesmo cliente são diferenciados. Tendencialmente, são um conjunto de excepções que cada consumidor tem e onde está disponível para gastar mais, mesmo que tenha consciência desse facto. Está disponível porque entende que é o seu “pequeno luxo”, a excepção que vale a pena. É importante perceber que o mercado está cada vez mais no “high end” e no “low end”, e que o “middletown” pode ser cada vez mais um perigoso cemitério.

H: O que quer dizer quando afirma que o “low cost vai dar lugar ao no cost”?

P.B.: Uma parte do low cost, que cada vez mais se afirma como tendência sustentável, está a passar para “no cost”, como advoga e explica Chris Andersen no livro “Free”. Estão inclusivamente a surgir pequenos movimentos de preços negativos. Obviamente é importante perceber que do ponto de vista económico, estes negócios só são sustentáveis quando vivem alavancados noutros sectores, como é o caso das companhias de aviação, que cada vez vivem menos do negócio de vender bilhetes para transportar pessoas de um local para outro e cada vez vivem mais de vender tráfego aos operadores de turismo.

H: E os sites de compras colectivas que começam a ganhar protagonismo em Portugal, como prevê o seu desenvolvimento até 2013?

P.B.: Acredito que terão o seu nicho de mercado, mas não irão além deste. Haverá espaço para um grande operador externo, no máximo dois, e alguns locais. Estão necessariamente confinados a serviços, porque em produtos não há margens que sustentem mais do que pequenas e tímidas experiências. Veremos se são capazes de explicar aos clientes que os grandes descontos que propõem se baseiam em promoções irrepetíveis para criar tráfego ou correspondem a períodos off‐peak de procura. Se não o fizerem, destruirão a sua reputação a prazo.

H: Refere na sua análise que o Mundo vai conhecer uma mudança de paradigma de “produzido na China para desenvolvido na China”. Pode explicar melhor? Que influência poderá ter esta mudança nas empresas portuguesas exportadoras, por exemplo?

P.B.: A China está a mudar em variadíssimos capítulos e como reflexo teremos um novo consumo interno acompanhado de importantes alterações no comportamento social da nova classe média das urbes chinesas, que se distancia do conceito de custo de mão‐de‐obra muito reduzido. Para isso, a China deixará de poder competir com o Paquistão, Vietname e tantos outros países do Sudoeste Asiático. A China, por seu lado, procura criar valor através da incorporação de margens que advêm de factores como a criação, o desenho e gestão de marcas. A passagem para este paradigma gerará enormes oportunidades para aqueles que estiverem disponíveis para ajudar o gigante asiático, para quem o “cash flow” não constitui, de momento, qualquer dificuldade

“Mobile commerce vai disparar”

H: Como se vai desenvolver, segundo as suas previsões, o mobile commerce até 2013?

P.B.: Vai disparar, porque a Internet móvel será a principal plataforma de comunicações no Mundo dentro de dois anos, antes do verão 2013. Isto era impensável há dois ou três anos. A aceleração do mobile depois da rápida disseminação dos smartphones, iPhones, blackberries primeiro, e de tablets depois, veio criar um paradigma novo. Como consequência o comércio através de mobile vai crescer. No entanto, continuará a ser uma gota de água dentro do e‐commerce, pelo menos nos próximos dois anos, e com excepção dos jogos, livros e todo o mundo da “app world”.

H: As empresas estão a ganhar dinheiro com o comércio através dos smartphones?

P.B.: Haverá empresas a ganhar dinheiro, embora a grande economia de escala terá início depois de 2013 para a maior parte dos mercados. Até lá, todos os que forem capazes de vender conteúdos a um preço mínimo mas com grande escalabilidade e com baixos custos de investigação e criação podem ganhar dinheiro. Serão necessariamente poucos, sobretudo fora do perímetro Índia‐ Estados Unidos.

H: E o tradicional comércio electrónico vai perder protagonismo face ao m‐commerce?

P.B.: O m‐commerce faz parte do e‐commerce, pelo que este não perderá qualquer protagonismo. Pelo contrário, ao crescimento natural do comércio electrónico surgem agora alguns turbocompressores, como o m‐commerce ou o f‐commerce (via Facebook), que o aceleram. Por outro lado, o ROPO (resource online, purchase offline) e o seu antónimo, vão ganhar uma dimensão crescente, sustentando as lojas offline, sobretudo no retalho especializado.

H: Que importância prevê que venham a ter as redes sociais nas estratégias comerciais e de marketing das empresas?

P.B.: Não prevejo. Já são hoje fundamentais. Espero que não seja outro Marketing Miopia para os gestores percepcionarem essa nova realidade. O que vai acontecer é que as redes sociais vão deixar de estar ligadas ao Marketing e Relações Públicas e vão entrar pelos departamentos de Recursos Humanos e de Desenvolvimento de Produto a sério, muito em breve.

 

 

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