Nuno Teles, Director-geral de Marketing da Central de Cervejas
“Não podemos viver só e unicamente de grandes inovações” Lançadas que foram duas inovações e duas novidades, fomos perceber o que é a inovação na Sociedade Central de Cervejas […]

Victor Jorge
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“Não podemos viver só e unicamente de grandes inovações”
Lançadas que foram duas inovações e duas novidades, fomos perceber o que é a inovação na Sociedade Central de Cervejas e Bebidas (SCC). Nuno Teles, director-geral de marketing da companhia, admite que nesta altura, “um marketeer não pode ir contra uma tendência normal do mercado”
Como é que se mede a rentabilidade de uma inovação?
Fácil. Na opinião de Nuno Teles, director-geral de marketing da SCC, “mede-se através da capacidade de gerar receitas suficientes para pagar o investimento e na capacidade de entregar valor aos nossos clientes e a nós”.
Hipersuper (H): Nos últimos três meses, a Sociedade Central de Cervejas e Bebidas (SCC) lançou no mercado os barris de 5 e 20 litros, a Mini em lata, a Sagres Golo, e, em parceria com a Delta Cafés, o Ice Coffee. Como é que chegam a estas inovações, quanto tempo levam a ser desenvolvidas, quantas ideias “caem” pelo caminho?
Nuno Teles (N.T.): A inovação é, efectivamente, e desde sempre um pilar de crescimento na Central de Cervejas.
Nós temos um funil de inovação, um processo para gerir a inovação, que vive muito de criatividade, mas também é muito de processo, no sentido de não perder essa criatividade.
Nós temos um conjunto de metodologias para criar ideias, no fundo, para estimular que essas ideias entrem nesse dito funil, e garantir que podem ou não ver a luz do dia.
A probabilidade de uma ideia vir a ser concretizada num lançamento será de 1 para 10. Isto demonstra a ambição e o arrojo de arriscar e a Central de Cervejas tem demonstrado ao mercado que tem acertado bastante mais do que outras empresas e daí acreditamos que a inovação pode e deverá ser, efectivamente, um processo ganhador. A nossa liderança no mercado da inovação é, também, um sinal evidente.
Em relação ao que lançámos recentemente no mercado, no caso do barril de 5 litros trata-se efectivamente de uma inovação mundial. O que oferecemos ao consumidor é a experiência de beber uma cerveja tirada à pressão em casa e onde garantimos que a qualidade da cerveja é igual à que consume no canal Horeca. Além do mais o consumidor não necessita de investir cerca de 200 euros numa máquina, uma vez que a máquina já lá está.
H: Não há diferença entre o barril de 5 e de 20 litros?
N.T.: É exactamente a mesma tecnologia. A diferença é que o barril de 5 litros destina-se ao canal da distribuição e o de 20 litros ao Horeca. Esta nossa atenção permanente para os dois canais de distribuição é muito relevante.
H: E agora ainda mais?
N.T.: É muito importante para nós olharmos não só para o consumidor e percebermos no que podemos inovar, mas também para o que são os nossos clientes directos no canal tradicional, distribuição organizada e ter a solução mais adaptada ao canal.
No caso do 5 litros é consumo em casa, onde temos uma quota de 5%, em valor, após um mês de lançamento, o que é inacreditável.
É algo muito acima das nossas expectativas. Não estávamos à espera de atingir, num espaço de tempo tão curto, uma quota tão alta, o que quer dizer que o consumidor aderiu de forma muito entusiasta a este conceito.
H: Quem participa com as ideias na SCC?
N.T.: Toda a companhia. O conceito de inovação que temos dentro da Central de Cervejas é o conceito de inovação total. Essa inovação pode passar pela introdução de um novo produto no mercado, mas também pode ser uma ideia de entregar um produto ao cliente, uma ideia que passa por produzir de forma mais eficiente. A inovação não passa exclusivamente pela apresentação e lançamento de um novo produto.
Este conceito é muito importante. É evidente que o marketing tem um papel importante nesse processo de inovação, mas é um processo de toda a organização. Todos podem participar, mas alguém tem de garantir e gerir esse processo de inovação.
H: A última inovação consiste numa parceria com a Delta Cafés. Como surgiu esta ideia?
N.T.: Não há marca mais portuguesa do que Luso e também não há marca mais portuguesa nos cafés que Delta. O respeito que temos pela Delta fez com que pensássemos o que poderia ser relevante para uma marca que é vista pelo consumidor como uma marca de referência nas águas e um produto que é tradicional português que é o Mazagran.
No fundo, foi um processo muito simples e o voltar um pouco às origens da portugalidade e pensar como é que estas marcas tão portuguesas podem oferecer produtos inovadores desse produto tão tradicional.
H: Foi uma ideia SCC ou Delta?
N.T.: Surgiu de uma conversa entre a Central de Cervejas e a Delta em que rapidamente chegámos à conclusão que seria bom unirmo-nos. Isto também é uma lição para Portugal, porque estas alianças entre marcas portuguesas só pode ser vantajosa. Muitas vezes temos a tendência de olhar para a nossa quinta e preferir a estar sozinhos com uma quinta pequena do que juntar forças e termos uma quinta maior.
Esta união foi um claro sinal de que alianças entre duas empresas podem naturalmente resultar em projectos vencedores para ambas as empresas. Luso+Delta dá forçosamente uma marca mais forte e a velocidade com que colocámos isto no mercado, cerca de seis meses, espelha bem o êxito da parceria.
H: E qual tem sido a aceitação?
N.T.: Extraordinária. Vendemos 200.000 litros até à data, ou seja, em três semanas. O objectivo é de 1.000.000 de litros, o que quer dizer que 20% está concretizado em apenas três semanas.
H: Como é que se mede a viabilidade ou rentabilidade de uma inovação?
N.T.: Mede-se através da capacidade de gerar receitas suficientes para pagar o investimento, na capacidade de entregar valor aos nossos clientes e a nós. Uma inovação tem de ser relevante para aumentar a categoria. Introduzir produtos no mercado para canibalizar os já existentes, não é bom para mim, nem para os meus clientes.
Por isso, os clientes têm de ter inovações por parte da Central de Cervejas que ajudem a aumentar o tamanho do mercado. Uma loja precisa de aumentar vendas e com produto e, por isso, precisamos de oferecer produtos aos nossos clientes que, acima de tudo, incrementem as vendas.
Essa é para mim a principal forma de avaliar uma boa ou má inovação.
H: Mas há inovações que não correm tão bem?
N.T.: Há e não devemos ter medo de falar das inovações que correm menos bem. É um processo de aprendizagem normal.
Naturalmente que introduzimos produtos no mercado, no caso concreto a Chopp, que foi uma grande aposta nossa e que já não está no mercado. Mas vendeu 7 milhões de litros e 7 milhões de litros é um ponto de quota no mercado nacional de cervejas. Foram novos consumidores que trouxemos para nós, foram novos consumidores que experimentaram a marca Sagres. Por isso, houve um determinado objectivo que foi comprido.
H: Mas, quando lançam uma inovação, têm a noção de que existe um limite temporal para o produto estar no mercado?
N.T.: Há vários tipos de inovação. Como disse atrás, a inovação não passa só pela introdução de novos produtos no mercado.
O consumidor português é muito experimentalista, até mais experimentalista que a média do consumidor europeu. Por isso, o experimentar é importante, não quer dizer que resulte em repetição de compra.
Naturalmente que uma inovação em pleno é aquela que vem e fica. Mas entrar no repertório das pessoas é difícil. As pessoas têm um número regular de marcas que consomem. Assim, há inovações que têm por objectivo entrar em ocasiões de consumo muito específicas e que ficam, por exemplo, a Sagres Zero que entrou para a ocasião almoço e perdura.
O barril de 5 litros é uma inovação que, com toda a certeza, veio para ficar. Não lhe posso dar ainda dados de vendas, porque o produto está há muito pouco tempo no mercado, mas dada experiência e do agrado que temos tido, é uma inovação que veio definitivamente para ficar.
H: Isso quer dizer que não é fiel à marca?
N.T.: É um consumidor exigente e que gosta muito das marcas que tem. A marca Sagres, por exemplo, tem uma notoriedade espontânea de 45%, liderando o top of mind dos consumidores e tem, numa escala de agradabilidade de 1 a 5, 4,2. Por isso, o consumidor não só se lembra da marcas quase espontaneamente, como adora a marca que consome.
H: Mas muitas vezes não se confunde inovação com novidade?
N.T.: Isso é verdade. O síndrome do brinquedo novo é algo que tem de ser evitado a todo o custo. É como os miúdos que muitas vezes só estão à espera do próximo brinquedo e não tiram partido do actual. E nas empresas é um pouco assim.
Uma força de vendas adora sempre o último brinquedo, a última novidade. E, de facto, uma novidade não é uma inovação. Uma inovação é algo que vem responder a uma ocasião de consumo e a uma motivação muito bem identificada, de forma que o consumidor adopte esse produto no seu repertório normal de marcas.
Mas não podemos viver só e unicamente de grandes inovações. Temos de permanentemente refrescar a ideia dos consumidores e manter a nossa marca viva na mente dos consumidores.
Formas Luso é outro exemplo que veio preencher uma necessidade do consumidor.
H: A SCC esteve inserida, nos últimos tempos, no universo de grandes cervejeiras multinacionais, no primeiro caso a Scottish&Newcastle e agora a Heineken. A SCC vai, de alguma forma, “beber” a experiência e inovação dessas companhias ou a inovação que surge é única e exclusivamente SCC?
N.T.: Tudo o que introduzimos no mercado foi gerado e criado nacionalmente. O primeiro exemplo onde nós beneficiamos dessa exposição ao mundo é com o barril de 5 e 20 litros. Estamos a falar de inovação de ponta, ou seja, é necessário escala para investir. Não quer dizer que não tínhamos a ideia, o ponto é que para tornar essa ideia uma realidade são necessários grandes investimentos e que não são possíveis para vendas a nível nacional.
Trata-se de uma excelente combinação entre o ter força, garra e proximidade com o consumidor nacional e o benefício de ter acesso a tecnologia de ponta. O facto da Heineken ser a marca que mais cerveja vende no mundo, que está presente em cerca de 170 países no mundo, dá-nos uma escala maior.
H: Qual o budget que a SCC aloca a I&D?
N.T.: Cerca de 2 milhões de euros/ano e cerca de 10% do nosso turnover revém da inovação.
H: A inovação é apresentada em resposta a eventuais produtos lançados pela concorrência?
N.T.: Tem única e exclusivamente a ver com aquilo que o consumidor nos diz. Fazemos estudos de hábitos e de atitudes dos consumidores com grande regularidade.
Tentamos perceber quais as alterações dos hábitos, nas motivações de compra, para nos apercebermos de quais as tendências e, assim, poder criar novas soluções para responder a essas necessidades.
A velocidade para chegar ao mercado é determinante.
Muitas vezes podemos deparar-nos com situações em que a nossa concorrência identificou algo de muito relevante e se prepara para introduzir algo no mercado e nós já estávamos a trabalhar e eventualmente antecipar ou não o processo. Mas nunca, nunca colocamos um produto no mercado porque a nossa concorrência fez algo.
Dou-lhe exemplo da Sidra que foi algo que não lançámos porque desde sempre que soubemos que era algo que não iria ter o sucesso que pretendíamos. O certo é que o produto da concorrência entrou e saiu do mercado.
H: Desde a identificação da necessidade por parte do consumidor até ao lançamento do produto qual o tempo necessário?
N.T.: Oscila. Temos o caso do Ice Coffee que em seis meses foi possível desenvolver a fórmula. Depois existem outras inovações que demoram mais tempo, um ano ou dois anos, até três anos.
H: E se a meio do percurso notam que existem alterações no consumidor e que determinado produto já não é viável?
N.T.: Nós temos quatro fases: fase de criação de várias supostas ideias, depois algumas são de facto ideias e outras são só tentativas. A seguir vem a pergunta se tenho ou não, é ou não possível fazer essa ideia. A terceira fase é a de fazer a ideia de forma eficiente e, por último, a quarta é a sua introdução no mercado.
É muito normal que tenha uma ideia, acho que sou capaz de a fazer, mas chego à conclusão de que não tenho capacidade para a fazer.
Portanto, é normal que ao longo desse funil, de 10 ideias tenho cinco possíveis de concretização, tenho três que são possíveis de concretizar com os meios que tenho à disposição e uma que é lançada.
H: Este mercado é muito inovador?
N.T.: Penso que é um mercado muito nacional e muito inovador.
Uma das quatro prioridades da Heineken em todo o mundo é a replicação do conceito da Mini Sagres. Por isso, somos, de facto, inovadores.
H: Portanto, não é só a SCC que vai buscar algo à Heineken, mas a própria Heineken beneficia da inovação SCC?
N.T.: Absolutamente. Temos várias casos: as águas funcionais, Bohemia e Mini.
H: Existe alguma inovação no mercado que gostasse ter saído da SCC?
N.T.: A Delta Q.
H: Como é que a actual conjuntura tem afectado este mercado? A transferência do consumo de fora para dentro do lar é prejudicial?
N.T.: Faz parte da alteração de hábitos e motivação do consumidor. Aquilo que um marketeer não pode fazer é ir contra uma tendência normal do mercado. Imagine o que não é uma pessoa a nadar num rio contra a maré?
Tenho de aproveitar a maré e construir em cima daquilo que são os hábitos. A inovação é perceber que o consumo em casa se está a desenvolver e introduzir no mercado respostas a essa tendência.
H: As marcas próprias da distribuição beneficiam do investimento que as marcas de fabricante fazem em inovação nas águas e cervejas, mercados ainda têm pouca expressão?
N.T.: Nas águas lisas, a marca própria da distribuição já têm um peso muito forte, com cerca de 34% de quota.
No mercado das cervejas, essa realidade ainda não é assim. Isso tem a ver com o facto de termos duas marcas muito fortes no mercado português e que tudo fazem para manter os seus consumidores. São duas marcas que têm cerca de 90% de quota do mercado nacional e a determinação de manter o consumidor junto delas.
H: As inovações são lançadas de forma transversal ou dirigidas a um canal específico?
N.T.: Há inovações que são, de facto, transversais. Hoje em dia, dada a importância dos dois canais, também temos de pensar melhor naquilo que se adapta a cada um deles.
Há pouco referia que inovação não são só novos produtos.
Uma marca como a Central de Cervejas não só estuda o consumidor, mas estuda também a atitude do consumidor enquanto comprador. É esta percepção de como nos comportamos como compradores que é também fonte de inovação.
H: Consegue-se inovar sem muito dinheiro?
N.T.: Consegue-se, claramente, inovar sem muito dinheiro. Temos o caso do barril de 5 e 20 litros onde estamos perante tecnologia de ponta e depois temos o Ice Coffee que já é uma inovação que tem mais a ver com a ideia do que propriamente com milhões e milhões de euros.
Na inovação é no detalhe e precisão que está o grande benefício e não forçosamente nos grandes investimentos.
H: Existe um calendário para o lançamento de inovações?
N.T.: Não. Temos de lançar aquilo que é relevante para o consumidor e, se porventura, não tivermos nada de relevante e diferenciador para o consumidor, não lançamos. O que temos é garantir que identificamos o que é relevante para o consumidor e com base nisso definir qual a altura mais propícia para o fazer.
H: E este ano ainda vamos ter novidades da SCC?
N.T.: O mercado de bebidas vive muito do Verão. É pouco provável.
O primeiro semestre de 2009
Hipersuper (H): Como correu este 1.º semestre?
Nuno Teles (N.T.): Correu, na perspectiva de marcas, de forma difícil. O mercado das cervejas está a decrescer 5%. Estamos em contexto de dificuldade. As marcas Sagres, Luso e todo o portfólio de refrigerantes, é um portfólio vencedor. Penso que conseguimos oferecer aos nossos clientes marcas que são vencedoras, que têm quotas de liderança, que reforçam a preferência do consumidor. A Sagres, hoje em dia, permite aos nossos clientes venderem mais. Luso, pelo domínio que tem nas águas lisas e também por aquilo que as águas funcionais representam, dá rentabilidade aos nossos clientes. E, por último, o portfólio de marcas que na mente do consumidor não são vistas como relevantes, mas que são líderes nos segmentos: Trinarajus é claramente líder no canal tradicional, Joi tem uma posição muito forte no canal tradicional quer organizado, Schweppes que é uma marca que tem para cima de 80% de quota de mercado estável, e agora Orangina.
H: Que previsões fazem para o segundo semestre?
N.T.: O São Pedro vai ter um papel fundamental. Nas bebidas, o tempo tem um papel muito importante. Estou confiante, mas o mercado ainda apresenta taxas de decréscimo.
H: Vai continuar a decrescer?
N.T.: A tendência a médio prazo é a recuperação. Mas ainda vamos passar por momentos de consumo retraído. As pessoas ainda estão muito preocupadas com o desemprego, no fundo, falta de confiança e cabe às marcas darem sinais de confiança e recuperação.
H: Quanto pesa o canal Distribuição e Horeca na SCC?
N.T.: Têm pesos diferentes. No caso das cervejas, um terço vai para a distribuição moderna e dois terços para o Horeca. Nas águas é o inverso.
H: Com esta transferência de consumo, o canal da distribuição irá aumentar?
N.T.: Há, em toda a Europa, uma tendência para o canal da distribuição crescer e o canal Horeca diminuir. No futuro, a importância poderá estar equilibrada.