Agricultura: cultura da sustentabilidade
Afinal o que é cultura? A cultura geral não é só aquela que se aprende nos livros, nas universidades, cultivar-nos vai muito para além disso. Cresci a ouvir a desvalorização do agricultor – que ainda hoje se verifica nos manuais escolares – quando a sinto de forma extamente oposta.

A nossa cultura geral está, numa primeira fase, interligada às nossas experiências de vida, ao nosso quotidiano. Talvez um médico não sabia o que significa “fazer a poda” ou “fazer a monda” e está tudo bem. Assim como o agricultor não saberá os termos técnicos da arte de curar. Alimentar também é uma arte e os agricultores são, ao contrário das perceções instaladas, quem nos proporciona alimentos saudáveis, ricos e nutritivos. São quem cuida também da nossa saúde e da nossa “casa maior”, o planeta.
A agricultura enfrenta desafios significativos para garantir a sustentabilidade e a diversidade dos ecossistemas. No entanto, a percepção pública do agricultor como um mero produtor de alimentos é limitada e não reflete a complexidade do papel que desempenha na preservação do meio ambiente. A comunicação é fundamental para mudar essa percepção e promover a agricultura como cultura de sustentabilidade, do campo ao consumidor.
A agricultura tem evoluído profundamente a par de tantas outras áreas. Hoje, de mãos dadas com a inovação tecnológica, proporciona:
¬a preservação da água: numa gestão rigorosa da sua utilização, recorrendo a sensores de humidade, rega gota-a-gota;
¬a preservação dos solos: através da fertilização dos solos, com estrume em vez de produtos químicos;
¬a preservação da biodiversidade: através da rotação de culturas promove a diversidade e ajuda a manter os habitats naturais;
¬a aposta em novas tendências produtivas, como a agricultura regenerativa, que procura minimizar a erosão do solo e promover a sua saúde através do uso de técnicas como a diversidade de culturas, o uso de práticas de gestão de pragas amigáveis do meio ambiente e a introdução de animais, predadores naturais.
E não é só no campo que estas preocupações pela preservação do nosso planeta se fazem presentes. Cada vez mais assistimos à procura de soluções de packaging sustentável.
Há cerca de três anos, regressei ao meu “ponto de origem”, vim morar para a zona de Santarém e, de então para cá, tenho assistido à substituição de hectares e hectares de floresta, de campos de cultivo para “campos de painéis solares”. Tenho procurado informar-me sobre as suas vantagens e desvantagens, mas confesso que ao ritmo que vejo crescer a sua implementação e as suas localizações, me “corta o coração”… Solos férteis que assistem à alteração drástica da sua fauna e flora, e isto é em prol de uma maior sustentabilidade? São uma fonte de uma energia renovável e sustentável, ok; reduzem a dependência dos combustíveis fósseis, o que pode ajudar a reduzir as emissões de gases de efeito estufa, ok… Entre tantas vantagens que lhes atribuem eu só penso, a que custo? Está esta implementação a ser feita com o devido controle? Que natureza, que paisagem, deixamos aos nossos filhos?
Em tudo na vida é preciso equilíbrio. E na “cultura da sustentabilidade” acontece o mesmo. Temos de analisar os dois lados da moeda, procurar estar informados, comunicar e partilhar a informação. Isso é cultura. Se os agricultores, para além de saber como funciona a natureza, também têm de ter “luzes” de gestão, biologia, informática, mecânica, entre tantas áreas, a nós cabe-nos passar cultura agrícola aos nossos filhos. Perceber quais são as frutas e os legumes da época, que por trás dos produtos que, comodamente, encontramos no supermercado está o trabalho de tantos, revelando-se tantas vezes verdadeiros MacGayvers da agricultura. E se isso não é ser culto, então não sei o que é.