Opinião

Deveres fundamentais dos administradores e gerentes versus seguros D&O

Por a 12 de Junho de 2009 as 5:32

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A Reforma do Código das Sociedades Comerciais (CSC), operada em 2006, com a publicação do Decreto-lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, introduziu profundas alterações no direito das sociedades. De entre muitas, destaca-se a nova redacção do n.º 1 do artigo 64º que consagra os chamados deveres fundamentais dos Administradores e Gerentes (A&G). Com efeito, este preceito vem fazer apelo aos deveres de cuidado e de lealdade, enquanto pressupostos indispensáveis da actuação dos A&G no âmbito das respectivas funções.

Por outro lado, o n.º 2 daquela norma estabelece igualmente para os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização a observância daqueles mesmos deveres, associando para tal fim “elevados padrões de diligência profissional (dever de cuidado) e uma inequívoca intervenção “no interesse da sociedade” (dever de lealdade).

No que concerne aos A&G, cuja actividade nas sociedades respeitam, primacialmente, à gestão e à representação das mesmas, a norma plasma agora a adopção de condutas alicerçadas em particulares exigências de cuidado e de diligência, bem como de lealdade para com os sócios e com os terceiros que interagem com a sociedade, tais como os seus trabalhadores, os seus clientes e os seus credores.

A norma manteve ainda o parâmetro do “gestor criterioso e ordenado”, o que bem se compreende atenta a circunstância dos A&G, nas mais das vezes, gerirem bens alheios, assim se justificando a ampliação daquelas exigências em detrimento do conceito (mais ligeiro) do bónus pater famílias tradicionalmente acolhida pelo direito civil para efeitos de medição do esforço requerida ao comum devedor.

Directamente relacionado com esta temática dos deveres fundamentais dos A&G surge a questão da responsabilidade civil que a estes podem ser imputada no quadro da actividade que desenvolvem. Ainda que no direito societário vigore o princípio geral segundo o qual a sociedade responde pelos dos seus A&G, ainda que estes revistam condutas ilícitas, não é menos verdade que o CSC prevê um leque muito apreciável de casos em que os A&G respondem solidariamente para com a sociedade pela prática de actos ou de omissões que sejam susceptíveis de provocarem danos, quer à própria sociedade, quer em relação a terceiros (exemplos: credores sociais, sócios, terceiros, etc.

Aqui chegados e no que respeita às sociedades anónimas, coloca-se muito oportunamente a questão da caução, a que se refere o artigo 396º do CSC. De acordo com esta norma, a responsabilidade dos administradores deve ser caucionada por alguma das formas previstas na lei (remetendo-se para o que dispõe a lei civil, maxime os artigos 623º a 626º do Código Civil), na importância que seja fixada no contrato, mas não inferior a €: 250 000, tratando-se de sociedades cotadas ou as designadas por “grandes anónimas”, e a €: 50 000, para as restantes sociedades podendo, neste último caso, haver lugar à dispensa de caução numa de duas situações: i) quando essa dispensa seja deliberada pela assembleia-geral ou pela assembleia constitutiva que elegeu o conselho de administração ou um administrador e ii) quando a designação tenha sido feita no contrato de sociedade, por disposição deste.

Ainda de acordo com o n.º 2 do mencionado artigo 396º do CSC, a caução pode ser substituída por um contrato de seguro, a favor dos titulares de indemnizações, sendo certo que os encargos decorrentes dos respectivos prémios não podem ser suportados pela sociedade, excepto na parte em que a indemnização exceda os limites mínimos acima mencionados. E aqui chegamos aos seguros D&O (Directors and Officers Insurance), originariamente desenvolvidos nos EUA e que agora também se vão generalizando entre nós, muito por força deste preceito, o qual, na redacção anterior à Reforma de 2006 limitava o universo dos beneficiários do seguro à própria sociedade, mas que agora possui uma amplitude bem mais expressiva em razão da alteração legal que estende aquele benefício aos “titulares de indemnização”.

De notar ainda e por fim que, fora dos casos em que se tenha estabelecido a dispensa, esta responsabilidade deve ser caucionada nos 30 dias seguintes à designação ou eleição e a caução deve manter-se até ao fim do ano civil seguinte àquele em que o administrador cessou as suas funções por qualquer causa, sob pena de cessação imediata de funções.

1 Advogado. Responsável pelos Departamentos Aduaneiro e de Contencioso Aduaneiro do Grupo Rangel. Docente e Consultor de Comércio Internacional na EGP-UPBS.

José Rijo, Customs and Legal Department Manager do Grupo Rangel

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