Francisco Toscano Rico (CVR Lisboa): “Ostentar no rótulo o nome da capital é importante na exportação, mas o grande trunfo é a qualidade”
Com uma forte vocação exportadora, a região demarcada de Lisboa vende além-fronteiras 80% da sua produção para mais de 100 geografias. Nos últimos seis anos, uma em cada três novas garrafas de vinho exportadas são de Lisboa. Ostentar o nome da capital do país no rótulo ajuda a vender, mas por si só não é suficiente, frisa Francisco Toscano Rico, presidente da CVR Lisboa, em entrevista ao Hipersuper, salientando que o grande trunfo é a qualidade e a promoção coletiva sob o chapéu “Vinhos de Portugal”
Rita Gonçalves
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Com uma forte vocação exportadora, a região demarcada de Lisboa vende além-fronteiras 80% da sua produção para mais de 100 geografias. Nos últimos seis anos, uma em cada três novas garrafas de vinho exportadas são de Lisboa. Ostentar o nome da capital do país no rótulo ajuda a vender, mas por si só não é suficiente, frisa Francisco Toscano Rico, presidente da CVR Lisboa, em entrevista ao Hipersuper, salientando que o grande trunfo é a qualidade e a promoção coletiva sob o chapéu “Vinhos de Portugal”
Em 2022, os vinhos de Lisboa alcançaram valores recorde de vendas. Foram comercializadas mais 5,5 milhões de garrafas, em relação ao ano anterior, para um total de 66 milhões. As vendas de vinho branco, o ex-libris da região, aumentaram 25% e as exportações subiram 5%.
Além disso, podemos aditar que as vendas na restauração nacional subiram 100% em 2022.
Já lá vamos, se me permite. Ia perguntar-lhe qual foi o valor das vendas.
Não conseguimos quantificar. Porque são várias fontes diferentes e de universos diferentes. Conseguimos quantificar em volume, mas depois não conseguimos transformar isso em valor. Porque os dados chegam de diferentes fontes, do Instituto Nacional de Estatística (INE), da Nielsen, do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV). Não conseguimos transportar o volume de vendas – que nós controlamos porque dizem respeito ao número de garrafas que foram introduzidas no mercado – para um valor. Seria sempre uma estimativa muito grosseira. Hoje podemos dizer uma coisa e amanhã outra e prefiro não avançar um valor.
As vendas no exterior são o forte da região demarcada de Lisboa. Qual é a quota de exportação em relação ao volume global das vendas?
A exportação representa 80% do volume de vendas da região. Exportamos para cerca de 100 mercados diferentes. A vocação exportadora da região é fortíssima. E essa importância não se nota apenas a nível regional. A região de Lisboa está a contribuir para o crescimento global das exportações de vinho português.
Para ter uma ideia, nos últimos seis anos, uma em cada três garrafas que Portugal exportou a mais, ou seja, daquilo que foi o crescimento da exportação de vinho português, é vinho de Lisboa, retirando os vinhos do Porto, que são uma categoria muito própria. Se olharmos para o vinho nacional, exceto Vinho do Porto, Lisboa contribuiu com um terço para o crescimento das exportações de vinho português.
Atualmente, a quota do vinho de Lisboa nas exportações totais de vinho português é de cerca de 20% em volume. Mais uma vez, retirando o Vinho do Porto, é a região que em percentagem daquilo que produz e vende que mais exporta em Portugal.
As exportações ganharam um especial ímpeto nos últimos anos.
Sim. O ritmo de exportação, e obviamente as vendas totais da região, começaram a ter uma dinâmica extraordinária a partir de 2016. Foi o período a partir do qual a região começou a crescer a dois dígitos todos os anos. E isso significa, se observarmos o período entre 2015 e 2022, um crescimento de vendas na ordem de 150%.
Obviamente que há medida que o tempo passa o crescimento percentual é cada vez menor, mas, em termos de valor absoluto, é em média quase cinco milhões de garrafas por ano de acréscimo. Quando estamos a partir de uma base superior, esses cinco milhões em termos percentuais já não representam um crescimento a dois dígitos. Seria impossível e impensável que uma região pudesse, perpetuamente, continuar a crescer a dois dígitos. De maneira que, no último ano, o crescimento das vendas foi de 9% e o das exportações de 5%.
Lisboa ser uma das poucas capitais do mundo com uma região vitivinícola em seu nome é uma ajuda de peso para as exportações da região?
Ter uma região vinhateira que tem o nome da capital de um país, transforma a própria região com uma forte vocação exportadora num grande embaixador de Portugal e dos vinhos portugueses no mundo. É, por isso, um contributo para os produtores da região e para Portugal como um todo, não só no setor vinho, mas também.
Nas ações de comunicação e promoção lá fora, ajuda a que o consumidor e os críticos de vinho entendam melhor aquilo que estamos a falar. Assumir o nome de Lisboa, da capital de um país como Portugal, foi algo muito importante para a região.
No entanto, é apenas uma pequena parte do contributo para o desempenho da região. Ou seja, é importante porque, quando levamos uma garrafa de vinho para fora, levamos o nome de Portugal e da própria região de Lisboa para mais de 100 países, mas o trunfo tem de ser sempre a qualidade. E o desempenho do vinho português e do vinho de Lisboa tem exatamente a ver com a capacidade de oferecermos produtos diferentes, com identidade e qualidade. Se não fosse isso, não era o nome por si só que traria este desempenho.
Eu diria que é mais um fator que ajuda na facilidade de comunicar e de quem está do outro lado percecionar. No fundo, já começam a perceber, finalmente, onde é que é Portugal e a capital portuguesa.
Austrália: uma inesperada surpresa
Quais são os principais mercados de consumo de vinho de Lisboa?
Em 2022, o Reino Unido passou a ser o principal destino dos vinhos de Lisboa, ultrapassando os EUA, historicamente o principal mercado de exportação. Seguem-se Brasil, Canadá, Polónia e os mercados escandinavos como um todo. Estes são os mercados de eleição do vinho de Lisboa.
Há, por outro lado, nove mercados onde os vinhos de Lisboa estão a ter um desempenho absolutamente fascinante, como é exemplo Israel e Austrália. Mercados que há uns anos pensávamos serem improváveis e que atualmente revelam uma procura crescente. Esta diversificação é fundamental para uma região com esta vocação exportadora e para quem está num negócio altamente competitivo como é o do vinho em todo o mundo.
Exportam cerca de 700 garrafas por minuto. Que estratégia desenharam para reforçar este número?
Em termos estratégicos, olhamos para o posicionamento de Lisboa primeiro como Portugal. Temos de estar concertados com aquilo que é a promoção do país. Olhamos para promoção do setor como um todo, através da ViniPortugal, percebendo onde é que Portugal como um todo pode dar cartas. Porque, lá fora, somos todos pequenos. Só em conjunto é que isto resulta. Os resultados que temos hoje decorrem exatamente dessa união do setor. Assim, olhamos primeiro para a marca Vinhos de Portugal e para onde é que essa marca está a ser divulgada e promovida. Um pouco por todo o mundo, é verdade, mas muito em especial nos principais mercados do vinho português que são, também, os principais mercados do vinho de Lisboa. Brasil, EUA, Canadá e Reino Unido, entre outros.
No fundo, olhamos isto com duas perspetivas. Para mercados onde já somos fortes, que já conhecem e procuram os vinhos portugueses, e onde procuramos aprofundar a divulgação do vinho de Lisboa. Ou seja, aproveitar a apetência e a procura que já existem, assim como o conhecimento e o reconhecimento cada vez maior do vinho português nesses países e, depois, aprofundar esse conhecimento comunicando a especificidade e a qualidade dos vinhos de Lisboa.
Foi através desta estratégia coletiva que têm vindo a ganhar terreno nestes novos mercados que enumerou, nomeadamente Israel e Austrália?
Sem dúvida. Embora a Austrália não tanto. A Austrália é um case study para o vinho de Lisboa. Não é um destino que tenha alguma relevância para Portugal como um todo, é um caso de sucesso para Lisboa, onde os vinhos da região começam a ter uma procura interessantíssima. Ainda não está, naturalmente, no grupo dos seis ou sete principais mercados, mas começa a despertar e a assumir alguma relevância.
É, no entanto, uma exceção. Nos outros mercados já havia claramente uma locomotiva, uma tração, um investimento continuado e o que fizemos foi aproveitar essa dinâmica e reforçar a comunicação.
Quão difícil é promover os vinhos nacionais num mercado global tão competitivo?
Para perceber o quão difícil é promover lá fora e o nível de competitividade no mercado mundial, apostamos em trabalhar uma perspetiva direcionada para o mercado profissional, com algumas, poucas, exceções. O nosso objetivo é, em primeira mão, darmo-nos a conhecer junto de críticos de vinho e potenciais importadores.
Isto significa dois tipos de iniciativas. Ações nos mercados de destino e o que chamamos as visitas inversas, trazê-los cá e mostrar a nossa realidade. Vivenciar e experienciar a região faz toda a diferença e sentimos que o retorno é enorme. Todos os anos temos trazido importadores do Brasil, EUA, Canadá, entre outros, com bons resultados.
Por outro lado, marcamos presença nas principais feiras internacionais especializadas, a Vinexpo (Paris), a Prowein (Dusselfdorf), por exemplo, junto da ViniPortugal, dentro do chapéu Portugal, porque é assim que nos queremos apresentar. Mais como uma valência do vinho português e não de forma isolada.
Este ano, tivemos também no Brasil, onde vamos estar novamente mais para o final do ano, porque é um mercado que está com uma apetência enorme pelo vinho português e o vinho de Lisboa e onde estamos a crescer imenso e apostar muito.
Apostamos ainda em publicações de referência, dando vinhos a provar, promovendo a prova e a crítica da região por parte de especialistas.
Quais são os mercados exceção a esta estratégia de promoção?
Há um único mercado externo onde estamos a atuar, de forma complementar, junto do consumidor final. É o Brasil. Pela apetência que mostra e pela ligação a Portugal, fazia todo o sentido trabalhar, além do público profissional, o consumidor final. Neste mercado, estamos a apostar em campanhas com influencers nas redes sociais, nas revistas, em eventos e festivais dirigidos ao consumidor final. Em todos os outros mercados, a grande aposta é o público profissional.
Apesar de ser um mercado muito grande e competitivo, há interesse em conhecer o vinho de Lisboa e retorno tem sido grande com as vendas a crescerem todos os anos. Entendemos que em todos os outros mercados a grande aposta deve ser o público profissional, sejam estes importadores, distribuidores e críticos de vinho, entre outros.
No ano passado, na Suíça, mercado mais pequeno, mas com um preço médio muito interessante, dos mais altos entre todos os mercados externos, tivemos três masterclasses dirigidas a potenciais importadores, jornalistas e críticos de vinho em três cidades suíças. Estar presencialmente, dar a provar, explicar a região e convidá-los a virem cá experienciar a região é importante.
Nem só de brancos vive a região de Lisboa
Como é que integram na estratégia de exportação os grandes mercados consumidores de brancos, uma vez que Lisboa é uma região produtora por excelência de brancos?
Sobre isso gostaria de dizer que é verdade que esta região tem todas as condições para produzir grandes vinhos brancos, mas no mercado mundial e no mercado nacional a maioria do consumo ainda é de vinho tinto. Olhando para o consumo de vinho em Portugal e no mercado mundial, diria que é quase 70% de vinho tinto, 20% de vinho branco e 5% de rosé. Lisboa não foge à regra. A nossa estratégia não passa exatamente por estarmos a comunicar Lisboa como uma grande região de vinhos brancos, mas vinhos no geral. Só quando vamos mais ao particular é que podemos demonstrar um bocadinho como é que esta região influencia o perfil dos vinhos, como é que este terroir ligado a uma zona costeira se traduz depois num perfil de vinhos brancos muito interessante. No entanto, os tintos são também influenciados por este terroir e, como tal, têm também um perfil especial.
Ou seja, é verdade que somos uma região de excelência para a produção de vinhos brancos, mas daí não se pode inferir que é nos vinhos brancos que temos de apostar. Apostamos, sim, naquilo que o mercado está à procura. E se é verdade que hoje o consumo mundial de vinho está a crescer mais nos brancos que nos tintos, o grosso do mercado ainda é tinto.
Ou seja, não há uma segmentação na comunicação em função do mercado de destino.
Sim. Repare, por exemplo, no Brasil, país que associamos a um clima tropical e tendencialmente diríamos que tem um consumo essencialmente branco, é ainda muito de vinho tinto. Embora o vinho branco esteja a crescer bastante. Porquê? Tem a ver com os momentos de consumo. O brasileiro associa o consumo de vinho a momentos especiais, como o churrasco.
Não temos este nível de segmentação de comunicar só tintos ou brancos consoante o mercado de destino. O setor do vinho está totalmente globalizado e temos de perceber que em todos os mercados do mundo há uma competitividade enorme quer de vinho europeu quer americano. Temos de mostrar o que de melhor temos e naquilo que somos bons, mostrando um bocadinho de tudo.
Não vejo como muito interessante segmentar exceto em momentos muitos específicos, para um determinado importador ou crítico de vinho, ao qual queremos por exemplo mostrar a casta Arinto, a casta rainha da região, que tem o seu solar em Bucelas, dentro da região demarcada dos vinhos de Lisboa.
É talvez na região de Lisboa onde a casta Arinto mais expressa toda a sua potencialidade qualitativa. Claro que isso é uma bandeira da região e comunicamos. Mas não estamos especialmente centrados nisso porque estaríamos a segmentar demasiado para um mercado tão vasto. Por isso, primeiro Portugal, depois região de Lisboa, e depois, quando se justifica, segmentamos junto de públicos muito selecionados.
Temos algumas castas autóctones de vinho branco, o Arinto, a Vital, a Malvasia de Colares, vinhos únicos no mundo. Há uma série de valências da região que permite uma comunicação muito fina e assertiva, mas que não deve fazer-nos esquecer o chapéu mais global, sob pena de depois não conseguirmos ganhar visibilidade suficiente.
Como é que os vinhos de Lisboa se comportaram nos primeiros seis meses do ano?
O momento é difícil. O consumo mundial de vinho está a cair. Houve um crescimento do consumo na fase do confinamento e, claramente, agora há uma tendência de quebra. A procura como um todo está em decréscimo. Isto impacta diretamente uma região que exporta 80% da produção.
No mercado nacional é o turismo que está a aguentar as vendas de vinho.
O canal horeca.
Sim, sem dúvida. Depois de uma fase ascendente das vendas na grande distribuição durante a pandemia de covid-19, no ano passado as vendas recuaram, uma quebra que, no fundo, continua a acontecer e tem muito a ver com a situação económica. O consumidor nacional, que é quem, no fundo, adquire com maior frequência o produto nas grandes superfícies, está mais retraído nesta fase em que nos encontramos. O canal horeca, em especial por força da dinâmica do turismo, é que tem aguentado o mercado nacional.
Nos mercados internacionais vemos uma grande indefinição. Com o consumo a recuar, o atual clima económico e o contexto geopolítico, decorrente da guerra na Ucrânia, há uma indefinição sobre para onde é que o mercado estará a ir.
Sente-se isto de forma imediata porque há muitos mercados retraídos nas compras. Não significa isto que não há apetência para comprar, mas enquanto tradicionalmente os contratos eram celebrados a médio e longo prazo e para volumes importantes, neste momento acontece aquilo que chamamos compras à vista. Os negócios são feitos para o curto prazo e em pequenos volumes e isso gera ansiedade no mercado como um todo. Os produtores, que precisam de escoar a sua produção e fazer os seus contratos de venda, estão a ver as coisas a acontecer a um ritmo muito mais lento do que aquilo que era tradicional neste setor. E isso não gera obviamente um clima de confiança.
As vendas atuais – e estou convencido de que as vendas da região de Lisboa são um bocadinho mais favoráveis do que as de Portugal como um todo – estão ligeiramente acima do ano passado. Todos temos esperança de que as vendas continuem a acontecer, e estão, mas a um ritmo muito mais lento. Os compradores mundiais estão retraídos nas compras.
Chegar às 90 milhões de garrafas não é uma miragem
Quais as suas perspetivas em relação ao fecho do ano?
Perspetivar é sempre difícil porque o mercado está muito incerto sobre a direção que vai tomar, o que vimos primeiros seis meses foi claramente as vendas a subirem, mas muito ligeiramente em relação àquilo que desejamos e ao histórico da região.
As vendas podem fechar em linha com as do ano anterior?
Sim, dependendo de muitos fatores, internos e externos. Os internos têm a ver com a ver com a manutenção ou crescimento do turismo em Portugal. O secretário de Estado do turismo fez recentemente um balanço de crescimento dos primeiros seis meses do ano e perspetivou para os próximos uma evolução favorável por conta do adicional de consumo decorrente do turismo. Há ainda alguma expetativa em relação à economia mundial, com o abrandamento da inflação e, por conta disso, uma maior disponibilidade financeira dos consumidores e mais propensão ao consumo não só em Portugal, como na Europa e no mundo. Temos uma expectativa positiva, mas muito prudente.
A região de Lisboa tem uma área de vinha de cerca de 18 mil hectares, dos quais 10 mil corresponde a vinho certificado DOP e IGP?
Não gosto de falar dos 18 mil hectares porque vinho de Lisboa são 10 mil o resto diz respeito a outras vinhas que não são vinho de mesa. A região tem dez mil hectares de vinha certificada, que dão origem aos vinhos de Lisboa e aos vinhos das suas nove denominações de origem [Colares, Carcavelos, Bucelas, Alenquer, Arruda, Torres Vedras, Lourinhã, Óbidos e Encostas d’Aire], é também ela uma região demarcada rica em portefólio.
São cerca de duas mil famílias de viticultores que exploram esses dois mil hectares de vinha, o que significa uma área média de cinco hectares. É uma área média muito superior à média nacional e à maior parte das regiões. Obviamente que no Alentejo teremos outros níveis de dimensão das propriedades e das vinhas. Mas, olhando para a média nacional, isto mostra que há uma viticultura profissional e viticultores já com uma área de vinha interessante que os torna competitivos.
Têm de ter alguma escala para conseguir exportar.
Exatamente. É este nível de profissionalização da atividade agrícola, e especialmente do vinho, na região de Lisboa que, depois, deu essa visão aos próprios empresários de serem competitivos e encontrar as melhores oportunidades. O mercado português é finito. Pode ter um empurrão da parte do turismo, mas é um mercado muito pequeno e finito para aquilo que é a potencialidade do vinho português. Em boa hora, a região começou a olhar muito mais lá para fora do que cá para dentro. No entanto, também é verdade que há uma apetência enorme no mercado nacional para redescobrir o vinho de Lisboa.
Apesar de tudo, o nome da região é relativamente recente. Como marca – região nasceu em 2010. Por força do dinamismo e da qualidade do vinho, há uma apetência crescente do mercado nacional para também descobrir estes vinhos, assim como dos próprios turistas que querem provar vinho de Lisboa que já consumiram no seu país. E daí assistirmos a um crescimento de 100% nas vendas no canal horeca. Para nós, é muito interessante. Porque é um mercado mais premium, onde os pequenos produtores conseguem ter uma maior presença.
Concluindo, diria que a grande maioria dos produtores de Lisboa exportam, sendo que os maiores representam naturalmente a maior fatia. Vemos como muito interessante este dinamismo mais recente do Horeca. Á listagem dos vinhos de Lisboa nos restaurantes juntam-se também os pequenos produtores e isso é fundamental.
Há potencial e interesse em aumentar a produção na região a prazo?
Sim, há potencial para crescer em volume. Estamos nas 66 milhões de garrafas. Há um número mágico – 70 milhões de garrafas – avançado há uns anos e que agora nos parece uma perspetiva muito conservadora face ao que tem sido o ritmo de crescimento. Aproximarmo-nos de uma região como a dos Vinhos Verdes ou do Alentejo, que andam ali nos 80 a 90 milhões de garrafas anualmente, não é irrealista. Podemos lá chegar.
Queremos crescer pela via da quantidade, um crescimento mais orgânico que tem a ver com a escala da própria região. Sem escala, não podemos existir. Uma das mais-valias da região é ter empresas com dimensão e organização logística muito profissional que permite abordar os mercados de exportação mais exigentes e tem sido um fator crítico de sucesso. O volume é importante nessa escala para a qual temos de continuar a trabalhar, na apetência para plantar mais vinha, mas queremos também crescer pela via da valorização do próprio vinho.
O valor acrescentando tem de ser por via do aumento da quantidade e também aumento de preço. E esse aumento de preço é o grande objetivo de todos os produtores e regiões na exportação. É muito mais difícil, mas Portugal como um todo e a região de Lisboa têm feito esse caminho. É um caminho mais difícil e lento, mas considero que estamos a fazer um bom trabalho.
Porque, no fundo, qual é o objetivo primário da criação das regiões demarcadas? É garantir um rendimento justo ao viticultor. Valorizar a rentabilidade da vinha. E para que isso aconteça é preciso ter bom vinho e este ser bem remunerado no mercado.
Que papel pode desempenhar o enoturismo na criação de valor?
O enoturismo começa a ter uma importância crescente e temos de ligar as duas coisas. Falar só de vinho já é muito pouco. Entendemos que numa região como Lisboa as oportunidades de crescimento do valor acrescentado estão mais ligadas ao enoturismo do que só à atividade de produção e venda de vinho. E os produtores estão cada vez mais a apostar nesta valência e na profissionalização, com mais adegas abertas. mais serviços disponibilizados e maior diversidade de experiências, aproveitando a aproximação à cidade de Lisboa. Embora a cidade seja cada vez mais um íman, no sentido em que tem tanta oferta para quem a visita, não é nada fácil convencer alguém a sair da cidade, tendo em conta que a média de dormidas é de dois, três dias. É uma vantagem competitiva abraçarmos a capital, mas a capital também é ela própria um íman.
Desta forma, o nosso esforço de comunicação vai no sentido de mostrar quão perto estamos de Lisboa e a diversidade e qualidade das experiências, que não se restringe às adegas, mas a tudo o que o território tem para oferecer, como praias, serras, gastronomia, entre outras valências.
Nos últimos dois anos, trabalhamos muito a parte do enoturismo, apostando na promoção externa através da participação em eventos de turismo e enoturismo, em regra em conjunto com outras regiões, como a Bairrada, o Tejo, Beira-Interior e Dão, que são as cinco regiões vinhateiras do centro de Portugal. Dos contactos nessas feiras percebemos que nos vendemos muito melhor em conjunto do que isoladamente.
Criámos inclusive um produto que tem a ver como enoturismo atlântico Lisboa – Bairrada que nasce das sinergias que se geraram desta promoção conjunta. Se conseguirmos que o turista que visita Portugal fique mais uma noite, todos ganhamos com isso.
Grande distribuição: um canal pouco explorado
Qual tem sido o papel do retalho alimento na evolução dos vinhos de Lisboa no mercado nacional?
O retalho alimentar, e concretamente a grande distribuição, representa 70 a 75% das vendas de vinho em Portugal. É um pilar fundamental para a comercialização de vinho em Portugal. Nos últimos anos, se recuarmos seis, sete anos, vemos claramente uma aposta do retalho alimentar em dar mais espaço ao vinho e a diversificar a oferta apresentada ao consumidor.
Tem também um papel importante na comunicação. É um canal muitíssimo forte de comunicação através das redes sociais, dos folhetos e do próprio ponto de venda. Uma comunicação que tem um caráter mais pedagógico e informativo. Temos sentido que há esse cuidado e esse investimento.
Vemos também algum esforço de valorização do produto em prateleira. Olhando para os números, com as oscilações que vão existindo de ano para ano, nota-se uma tendência de valorização do preço médio de venda.
Agora, os vinhos de Lisboa ainda têm uma presença muito marginal na grande distribuição. É uma região que por opção estratégica apostou sempre muito mais na exportação, onde encontrou muitas mais oportunidades para exportar do que no mercado nacional, já saturado. A quota de mercado dos vinhos de Lisboa é de cerca de 4% na grande distribuição enquanto a quota de mercado na exportação é de 20%. Daí já vê a disparidade.
No entanto, nota-se uma apetência crescente do mercado nacional por vinhos de Lisboa e a sua presença na grande distribuição está muito aquém do seu potencial. Estamos agora como região a olhar mais para o mercado nacional porque entendemos que há uma oportunidade que ainda não foi devidamente explorada. Se é verdade que no canal horeca vemos os resultados a aparecerem de forma muito evidente, temos consciência de que há uma oportunidade a explorar na grande distribuição.
E temos feitos muitas reflexões acerca da forma como devemos trabalhar com a grande distribuição, mas é inevitável fazê-lo no curto prazo porque a oportunidade existe.
Por outro lado, temos de perceber que é um negócio que tem muito a ver com as margens e com escala. Não temos a pretensão de pensar que poderemos listar muitos vinhos, o portefólio é restrito a grandes marcas e produtores. Mas isso não lhe retira importância. Um canal de escoamento que vale 75% a 80% das vendas em volume é crítico para qualquer região e produtor com alguma dimensão.
O que pode fazer de diferente a região de Lisboa na grande distribuição?
Fazer um trabalho de parceria com as principais cadeias, no fundo ações de ativação em ponto de venda, dando a conhecer o vinho. E criar momentos de comunicação e prova, que já sabemos que resultam.
Entrevista originalmente publicada na edição 414