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Opinião: Complexidade, permutabilidade e parceria em outsourcing

Por a 30 de Agosto de 2022 as 9:20

John_NaylonJohn Naylon, Principal Solutions Architect da AWS

O que é que a limpeza dos cestos de papéis do escritório e a produção de smartphones têm em comum? Talvez não tenham muito, à primeira vista. Contudo, ambas são tarefas que são realizadas por fornecedores externos. No entanto, é evidente que existe uma diferença qualitativa e é instrutivo examinar esta diferença com maior detalhe.

Clayton Christensen, em The Innovator’s Solution, refere o exercício de decidir quais os processos de negócio que uma organização deve realizar e quais devem ser levados a cabo por fornecedores. Trata-se de um desenvolvimento sofisticado da teoria clássica da ‘competência central’, que propõe que uma organização deve perceber em que serviço(s) ou produto(s) é fundamentalmente boa – e subcontratar tudo o resto.

Para o processo de limpeza dos cestos de papéis, ou outras limpezas de escritórios, a decisão é simples – quase mecânica – para a maioria das organizações. Pois sendo ela uma tarefa simples, facilmente definida, é provável que para a mesma haja muitos fornecedores competitivos, seja qual for a geografia. Por este motivo, a escolha entre fornecedores será normalmente feita com base numa comparação de preços e, em caso de mau desempenho de determinado fornecedor, este pode ser trivialmente substituído por um fornecedor alternativo.

Por outro lado, a produção de um smartphone é uma tarefa muito mais complexa. Por esse motivo, o fornecedor tem de investir significativamente na criação de materiais técnicos, elaboração de contratos, criação de estruturas de gestão e procedimentos contabilísticos, entre outros. Este investimento é espelhado pelo fornecedor que deve compreender plenamente a complexidade do processo do qual está incumbido, os riscos que assume, entre outros. Isto pode ser concebido como um processo de educação mútua, e, assim como na aprendizagem de uma nova língua, levamos tempo a tornarmo-nos fluentes – ou seja, operacionalmente eficientes.

Estes investimentos de tempo e recursos constituem uma verdadeira barreira à substituição trivial de fornecedores que descrevemos acima: o processo de educação mútua deve recomeçar; uma nova língua deve ser aprendida. Por esta razão, acordos desta natureza tendem a ter uma maior proximidade e longevidade, e é comum refletirmos isto, descrevendo-os como parcerias entre as duas organizações.

Vemos, portanto, que existe uma continuidade entre o simples ‘trabalho por encomenda’ e as parcerias mais complexas e de longa duração. Por vezes, assume-se erroneamente que por estarmos a recorrer a serviços de outsourcing, por definição recorremos a uma função mercantilizada e substituível. Obviamente, esta continuidade também se aplica à utilização da cloud: se as minhas necessidades forem simplesmente definidas e medidas – talvez só precise de armazenar alguns ficheiros – então posso adotar uma abordagem muito transacional na minha escolha de fornecedor. Por outro lado, quanto maior for a complexidade da tarefa, mais próxima será a parceria e a relação entre a organização e o fornecedor.

Por vezes, acontece que uma organização favorece culturalmente uma abordagem transacional à subcontratação, talvez motivada por uma perceção de custo ou pelo desejo de evitar o ‘lock-in do fornecedor’. Podem surgir desafios quando a organização tenta aplicar esta abordagem, independentemente da complexidade da tarefa depender de um fornecedor externo.

Duas das observações de Clayton Christensen, indicam que: primeiro, os clientes são motivados pelas suas próprias necessidades e estas tornam-se mais sofisticadas com o tempo; segundo, que o outsorcing nem sempre está correlacionado com uma avaliação de competências por parte da organização (como o autor propõe). Ou seja, mesmo que as competências nucleares de uma organização tenham uma correspondência próxima com as necessidades atuais dos seus clientes, o mesmo pode não acontecer com clientes de amanhã, e acabam por tornar-se irrelevantes. Se tudo, exepto as competências centrais, tiver sido obtido através de fornecedores, a vantagem competitiva perder-se-á neste momento, com muito poucas hipóteses de recuperação. Uma forma de evitar isto é uma visão mais diferenciada das competências, que reconheça que elas têm um ciclo de vida, e que existe incerteza na primeira parte desse ciclo de vida.

Será então que uma maior dependência de fornecedores coloca uma empresa em maior risco de ser ultrapassada por um concorrente? Depende da natureza do fornecedor. No caso dos cestos de papéis do escritório, quase de certeza que não. Mas se o fornecedor contribuir para uma parte intrínseca da arquitetura de produtos/serviços da própria empresa, então potencialmente sim. Se este tipo de serviços realizado por fornecedores é transacional, com pouco investimento para a construção de uma parceria, e o acordo não é cuidadosamente reavaliado ao longo do tempo, à medida que o cliente exige mudanças, estas condições levarão a que empresas bem-sucedidas sejam prejudicadas – os serviços mais inovadores do fornecedor não estão a ser explorados pela organização. De facto, como Christensen descreve em pormenor, o próprio fornecedor pode ser o perturbador.

Por outro lado, quando a organização recorre a serviços externos isto pode defendê-la contra uma eventual rutura. As boas parcerias são bilaterais e, ao promover uma estreita colaboração, o fornecedor está habilitado a inovar em nome do cliente.

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