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Conhecer para decidir, planear para agir

Por a 11 de Junho de 2021 as 17:32

LPPor Luís Pinheiro, presidente da Lusomorango

As últimas sete décadas ficaram marcadas por um desenvolvimento económico e social sem precedentes na história da humanidade. Em 70 anos, a população mundial passou de cerca de 2,5 mil milhões de pessoas para quase 8 mil milhões, a esperança média de vida passou dos 46 para os 73 anos, a pobreza extrema passou de 60 para menos de 10 por cento e a mortalidade infantil de 15 para menos de 3 por cento. Enquanto o PIB per capita multiplicou 5 vezes.

Períodos de paz prolongados, a par com as descobertas científicas e a melhoria dos cuidados de saúde a nível global foram, sem dúvida, grandes responsáveis por este enorme sucesso, a que devemos juntar os efeitos da Revolução Verde, que trouxe uma onda de conhecimento que marcou a produção de alimentos e a segurança alimentar à escala planetária, com o desenvolvimento de produtos fitofármacos para o controlo de pragas, fertilizantes sintéticos para nutrição das plantas e tecnologias naturais de melhoramento genético. A agricultura mundial encontra-se num ponto de viragem, na aurora de uma nova revolução. O desafio colocado pelo combate às alterações climáticas está a acelerar tendências. O Pacto Ecológico Europeu e a Estratégia do Prado ao Prato estabeleceram objetivos e metas para os quais importa definir estratégias e planos de ação.

Foi com base nesta história – e neste futuro que deve assentar em conhecimento assente na ciência e na inovação – que o ciclo de conferências “Conhecer para Decidir, Planear para Agir”, organizado pela Lusomorango em colaboração com a Universidade Católica, juntou dezenas de especialistas que abordaram os desafios com que se debate a agricultura moderna. Uma análise 360º que debateu os três pilares de um desenvolvimento verdadeiramente sustentável, colocando desenvolvimento económico, ambiental e social em pé de igualdade e não sobrepondo nenhum aos demais. O pontapé de saída do ciclo de conferências teve por tema “Conhecimento e Inovação na Década da Transição Digital”. Hoje, e no geral, a agricultura é altamente tecnológica, é eficiente na utilização de recursos, sejam eles o solo ou a água, no controlo de pragas e doenças e na gestão do clima. A próxima década ficará marcada pela integração dos vários sistemas tecnológicos e pela massificação de recolha de dados em tempo real. O big data gerado permitirá consolidar informação transformando dados em conhecimento. As autoestradas da informação têm de abraçar também o mundo rural e as apostas públicas terão de ligar, sem exceção, todo o território através das redes 5G, ligando consumidores e produtores de forma direta e transparente. A diferenciação do produto e a reputação das  marcas beneficiarão deste novo sistema alicerçado no conhecimento do consumidor face ao sistema produtivo, políticas ambientais e sociais praticados na origem. A transformação em curso conduzirá à “Agricultura do Conhecimento”, uma agricultura onde cada parâmetro é medido e analisado, cada recurso é utilizado na medida do estritamente necessário, com o equilíbrio ecológico utilizado em benefício da cultura, e no qual a agricultura faz parte do ecossistema sem causar danos aos recursos naturais, ajudando inclusive a regenerá-los. As cadeias curtas de distribuição são um tema cada vez mais presente e mereceu especial atenção durante o ciclo de conferências. Integrado no mercado único europeu, Portugal tem muito a ganhar ao participar no mercado comum. Enquanto país de pequena dimensão e periférico, Portugal não pode ficar refém da sua posição geográfica, deve sim tirar partido das suas vantagens climáticas para potenciar a sua produção nos setores de valor acrescentado, amplamente reconhecidos nos mercados europeus, considerando como nosso mercado local o mercado europeu de Lisboa a Helsínquia.

A transição agrícola em curso está a atrair uma nova geração de agricultores, mais jovem e mais instruída; a tecnologia e o conhecimento produzido atraem talento e devem ajudar a fixar novas gerações no território. Paralelamente, pelo menos enquanto a mecanização não der resposta, a produção de frutas e hortícolas vai continuar a necessitar de recursos humanos migrantes para a apanha e colheita. A chegada dos migrantes a territórios desertificados reveste-se de uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento, uma parte dessa oportunidade virá da fixação de uma percentagem de migrantes, os novos nacionais, e outra parte virá de todo o desenvolvimento económico propiciado pela atividade agrícola e atividades de serviços conexas. O exemplo de Odemira nas últimas semanas mostrou algumas das fragilidades que importa corrigir para tornar efetivas as oportunidades. Os desafios nesta área vinculam Estado e empresas. Às empresas agrícolas cabe o reforço de controlo da contratação com inclusão de processos de auditoria mais reforçados, que abarquem toda a cadeia de contração e remuneração, e também uma participação responsável no processo de assegurar que os trabalhadores sazonais têm acesso a alojamentos condignos. Ao Estado cabe a definição das melhores políticas públicas de migração, laborais e de habitação. Exige-se ao Estado o devido planeamento para dotar o país das respostas de habitação adequadas para a fixação da população permanente e o reforço dos serviços públicos para uma resposta efetiva às necessidades de toda a população.

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