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CEO Makro: “Grande parte do desafio passa por transformar um modelo de transação num modelo de relação”

Por a 23 de Abril de 2021 as 16:38
David Antunes, CEO Makro Portugal

David Antunes, CEO Makro Portugal

A Makro está a acelerar a transformação do seu negócio para um modelo relacional. A empresa de distribuição grossista “deixou de ser um mero prestador de produtos e preços, é atualmente um prestador de serviços e soluções, com ofertas únicas, como as ferramentas digitais e os serviços de consultoria”, revela em entrevista, David Antunes, CEO da empresa que pertence ao grupo alemão Metro

 

Tem já um percurso de 21 anos ligado ao grupo Metro e à Makro.

Praticamente nasci e fui criado neste mundo Makro. Comecei em Portugal em 1998, já lá vão 21 anos, depois tive muito tempo lá fora e, em 2018, regressei com um grande espírito de missão e paixão porque era o trabalho que queria fazer, voltar a Portugal e ser CEO da Makro. Comecei na Makro Portugal, na altura era responsável pelo departamento de logística, em 2002 saí para a área corporate, onde fiquei um ano. Fui, entretanto, para a Ásia. Fiquei à frente da logística e supply chain no sudoeste asiático, estava sedeado na Tailândia, mas trabalhava com as Filipinas, Malásia, Paquistão, China e Indonésia. Depois fui diretor de operações e vendas na Indonésia durante três anos. Voltei, entretanto, à Europa para ser responsável pela logística e supply chain do grupo inteiro, para os 25 países. Mais recentemente estive na Makro Polónia, durante sete anos, onde fiz um pouco de tudo, comecei nas operações e rede de franchising, geri as compras e o marketing. Já andava há algum tempo com o bichinho de vir para Portugal e as conversas foram acontecendo até que surgiu a oportunidade em 2018, fui nomeado em fevereiro, comecei em junho. Não sou colaborador da Makro Portugal sou colaborador do grupo Metro na Alemanha e estou sediado em Portugal. Vim com um contrato de três anos que renovei por mais três. É uma missão que encaro com grande paixão e entusiasmo porque sempre quis voltar à casa mãe e ajudar a Makro Portugal.

Que principais ensinamentos trouxe dessa experiência profissional para o mercado português?

Tive oportunidade de trabalhar em várias geografias, em vários ciclos de vida e estados de maturidade do negócio, em várias funções, desde vendas, compras, marketing, logística e supply chain. Nas áreas funcionais de uma empresa só não fiz finanças e recursos humanos. Por isso, o que trouxe para o mercado português é esta experiência acumulada e esta vivência em áreas funcionais diferentes. Acima de tudo, a equipa em Portugal precisava de trabalhar com um gestor português, penso que isso ajuda na comunicação, na colaboração e até a criar laços e networking com associações e outros players. É esse valor acrescentado de conhecer a companhia e trazer essa experiência funcional e de várias geografias.

Que balanço faz do caminho feito em Portugal nos últimos três anos?

O balanço é muito positivo. A companhia fez 30 anos em Portugal no ano passado, acho que não é todos os dias que isso acontece. E estes 30 anos foram muito feitos à custa de uma equipa cordial, fiel, resiliente, apaixonada, lutadora. Os colaboradores Makro são, de facto, especiais. O balanço é positivo porque nos últimos dois anos trabalhámos muito a questão do nosso propósito. Ou seja, perceber porque é que nos levantamos de manhã e vamos trabalhar. A questão foi perceber que estamos aqui para viver a paixão pela gastronomia e para servir o setor de hotelaria e restauração, dar a conhecer a gastronomia e sua diversidade em Portugal e ao mundo. Foi essencial arranjar esse propósito. Queremos trabalhar os produtores locais e regionais, dar a conhecer a competência e a riqueza dos nossos produtos e restaurantes e fazer isso não só para o mercado interno, mas também mostrar aos turistas tudo o que temos para oferecer.

Um segundo motivo pelo qual estou muito satisfeito tem a ver com trabalharmos muito os nossos princípios orientadores, a questão da liderança, da organização, de criar um pipeline de talento e, acima de tudo, definir princípios para trabalharmos em colaboração, sermos orientados para resultados e pensarmos no sucesso do cliente primeiro que tudo. Este trabalho reforçou muito a colaboração entre as equipas.

Por fim, o balanço é positivo porque a minha grande missão era fazer a companhia crescer em quota de mercado de uma forma sustentada. Quando cheguei a Portugal, a Makro crescia mas continuava ainda a perder quota de mercado, ou seja o mercado crescia e a Makro também crescia, mas o mercado crescia mais rápido do que a Makro. E já há dezoito meses consecutivos que crescemos em quota de mercado.

Pode concretizar?

Sim, quando cheguei tínhamos 9% de quota de mercado e o último relatório já nos mostra uma quota de mercado quase nos 12%. Obviamente, agora, temos que olhar para isto com um bocadinho de sal e pimenta, porque a medição da quota de mercado também integra um shift de vários canais para o canal cash&carry, durante esta fase de pandemia e confinamento. Temos agora de partir isto aos bocadinhos e perceber por categoria, por geografia, por cidade e por canal qual é o impacto. Mas, antes da pandemia começar, a Makro estava claramente a ganhar quota de mercado, numa fase de aceleração comercial fantástica, estávamos a bater os nossos números todos, em termos de topline, cash flow, de resultados e crescemos em quota de mercado antes da pandemia e durante a pandemia. Neste momento estamos a preparar-nos para acelerar com o setor.

Em que consiste essa preparação?

Acima de tudo é importante pensarmos no cliente. Com o que se está a passar no mercado de restauração e hotelaria em Portugal, diria mesmo que é o mais importante. Não temos que pensar Makro, temos é de pensar o setor. Isto é quase uma causa nacional. Temos de pensar na sobrevivência e no bem-estar dos nossos clientes. E isso passa claramente por preparar o melhor verão de sempre, ouvindo os clientes, percebendo as suas necessidades e trabalhando as soluções que eles vão precisar para o verão, seja de sortido, de equipamento ou de ferramentas, e ter o stock disponível para poderem acelerar.

Obviamente que também temos de pensar nisto para lá do produto e do serviço. A Makro tem vindo também a trabalhar com a AHRESP [Associação da hotelaria, restauração e similares de Portugal] no sentido de propor conteúdo, partilhar as nossas experiências, tudo aquilo que for possível para ajudar a acelerar o setor. Todos os intervenientes nesta cadeia de valor têm uma palavra a dizer, sejam fornecedores, distribuidores, como a Makro, sejam associações, o Estado e a própria imprensa. Temos de dar voz à restauração em Portugal porque eles estão a sofrer e há muita gente com a corda na garganta. E o mercado vai abrir na altura do verão e há que dar voz, há que aproximar as pessoas dos seus restaurantes e locais favoritos. Há que trazer novamente esta cultura e ADN de comer fora. Ou seja, os players têm de estar preparados, mas tem de haver aqui uma causa nacional para reviver a restauração em Portugal.

Tem boas perspetivas para o verão?

Sim, quero que o mercado tenha um grande verão. No ano passado, a primeira vaga da pandemia impactou bastante o negócio, os números são conhecidos. A Makro tem um ano fiscal que começa em outubro e acaba em setembro. E o trimestre abril, maio e junho foi difícil. Mas, depois, nos meses de verão, julho, agosto e setembro, tivemos já valores muito próximos do ano anterior. Acredito que tudo o que a Makro está a fazer no sentido de fortalecer as relações com os clientes e estarmos lá para eles nesta fase difícil, mais tarde, quando o mercado reabrir, vai fazer com que cresçamos juntos. A Makro ganhou muitos clientes na fase de pandemia. Começámos a trabalhar alguns clientes com os quais não trabalhávamos, como, por exemplo, embaixadas, bombeiros, polícia, cantinas, escolas, todos são clientes que a Makro quer manter para o futuro. A ideia aqui não foi trabalhar o curto prazo, mas investir nesta fase em que os clientes mais precisam para que mais tarde, nos tempos de bonança, possamos ter uma relação forte com os clientes e crescer em conjunto.

A minha grande expectativa é que o mercado português recupere. Somos um destino tão apetecível, que ganhou tantos prémios, e precisamos muito do turismo internacional.

 

“A hotelaria e restauração é hoje um setor com vários canais”DAVIDANTUNES

 

Há muitas diferenças entre a distribuição grossista portuguesa e a europeia e mundial?

O setor de hotelaria e restauração em Portugal está em franco desenvolvimento porque, desde há uns anos, Portugal tem sido um destino turístico muito apetecível, não só em termos domésticos, mas também internacionais. Se virmos o peso que o consumo doméstico e também o internacional têm no PIB [Produto Interno Bruto] português, percebemos que tem ajudado muito a economia a crescer.

A hotelaria e restauração é hoje um setor com vários canais, o canal cash&carry, mais consolidado, o canal de foodservice delivery, que está em franco desenvolvimento e uma grande parte do potencial de mercado está neste canal. É um canal que ainda está fragmentado e à espera de consolidação. Penso que há coisas que são iguais em Espanha ou França. Quer dizer, cada vez mais é um canal de valor e não de volume. É preciso trabalhar na qualidade, competência, inovação, diferenciação e na relação com os clientes. Penso que isso tem acompanhado o desenvolvimento nos mercados internacionais, no sentido de que cada vez menos é um negócio de transação e é mais um negócio de relação, da criação de relação com os clientes.

Nesse sentido, está a aproximar-se do modelo do comércio retalhista, que é também é cada vez mais relacional? Faço esta pergunta também porque tiveram a experiência de abertura ao público durante o estado de emergência?

A distribuição retalhista é um canal B2C [Business to Consumer], a comunicação e a oferta são massificadas e há programas de fidelização, entre outros. A distribuição grossista é mais um negócio B2B [Business to Business], cria-se uma relação individual com cada cliente. A nossa grande preocupação acaba por ser o sucesso do negócio dos nossos clientes. Se eles forem bem-sucedidos, nós também seremos. E aqui a questão é sempre trabalhar o cliente para crescer o share of wallet, a quota que temos dentro do cliente. Fazer crescer os clientes para nós crescermos também com eles.

Como correu a experiência da venda a retalho durante o estado de emergência?

A nossa experiência na área retalhista é algo pontual, foi abrangida pelo contexto de estado de emergência, em que a Makro oferece à comunidade mais uma alternativa com lojas grandes e seguras. Temos as normas bem implementadas para as pessoas na sua proximidade também poderem ir às compras. Para nós também foi bom, gerou alguma massa crítica para assegurar o emprego dos colaboradores, penso que foi bom também para fornecedores e outros players porque mantivemos a cadeia de valor a funcionar.

No ano passado, abrimos ao público em geral de abril a junho e quando o estado de emergência terminou fechámos as portas. Agora tornámos a abrir neste segundo estado de emergência, que renovou por mais quinze dias. A ambição da Makro não é entrar no mercado retalhista, estamos apenas a fornecer mais uma opção válida para as pessoas, e a nós também nos ajuda a fazer algum negócio, mas o nosso foco é o canal de hotelaria e restauração.

 

O impacto da pandemia no negócioMakro_DavidAntunes

 

Que impacto teve a pandemia no negócio da Makro no ano passado?

Foi um impacto brutal. Porque a Makro tem uma grande percentagem das suas vendas no setor de hotelaria e restauração. Com o confinamento, a proibição de restaurantes e bares de estarem abertos, e não só nestes segmentos porque as escolas e as cantinas também fecharam, o setor de hotelaria e restauração está a sofrer. Neste momento, mais de 50% dos restaurantes estão fechados até para delivery e take away. Mais de 30 ou 35% estão à beira da insolvência. É um setor que está em clara dificuldade e isso tem um impacto brutal nesta cadeia de abastecimento. A Makro tem uma grande dependência deste setor e, por isso, sofre com o setor. Houve a necessidade por parte da Makro de se reinventar não só dentro do setor, mas explorar outros canais para podermos mitigar parte da quebra nas vendas.

Que canais são esses?

Apostámos numa estratégia não só de produto, mas de serviços e soluções. Houve um ajuste de soluções de produtos no sentido de haver mais foco em produtos necessários neste momento, como copos descartáveis, por exemplo. Por outro lado, também criámos uma linha de consultoria [telefone e webinars] na qual temos um gastroconsultor e uma hotline a falar com restaurantes todos os dias para os ensinar a fazer a engenharia dos menus, a otimizar o food cost, a começar o delivery e o take away, a prepararem-se para a reabertura, entre outros.

Ainda dentro dos segmentos nos quais trabalhamos toda a parte de ferramentas digitais, temos uma plataforma que se chama digital inovation and solutions for hospitality, que tem muito a ver com ferramentas de backoffice e frontoffice que estamos a oferecer em Portugal, como sites e ferramentas de reserva. Neste momento, temos já 15 mil restaurantes em Portugal a quem damos website, mais de 1.500 a quem damos ferramentas de reservas e estamos a fazer o rollout de ferramentas como o menu kit, que permite fazer o download da receita para otimizar o seu food cost. Outra ferramenta também, denominada cockpit, uma ferramenta de gestão para gerir a produtividade dentro dos restaurantes. São ferramentas que a Makro tem dado ao setor no sentido de os ajudar. Lançámos também linhas de crédito para alguns clientes para ajudá-los na sua rentabilidade.

Sobre os novos canais começámos uma parceria com a hyper360 e com a Glovo, mais aqui a explorar os canais B2C, que, como lhe disse, ajuda a mitigar algumas vendas perdidas.

Há um outro segmento interessante, as pessoas começaram a procurar ainda mais o comércio de proximidade, como as mercearias nos seus bairros. E compraram mais produtos bio, healthy e premium. Por isso, essas mercearias têm necessidade de ter soluções diferentes, mais na vertente food, e isto também é algo que a Makro tem vindo a trabalhar, para que as mercearias estejam mais preparadas para fazer face à procura nas suas áreas de influência. Costumo dizer à minha equipa que a pandemia trouxe uma crise, as crises são boas no sentido de criarem oportunidades, eu próprio sou um gestor que gosta de viver de crise em crise. Por vezes, quando não há crise eu invento-a só para manter as equipas alerta. Eu gosto de crises. Esta é uma crise que está a impactar muito o setor, mas a nós obriga-nos a ser mais rápidos, pró-ativos, a reagir, e a antecipar e a reinventarmo-nos. E acelerar muita coisa que tínhamos em planos e que agora tem de estar a acontecer.

 

Quais as categorias que mais beneficiaram e quais as que saíram mais prejudicadas com a evolução da pandemia?

O que é que mudou no mercado com a pandemia? Por um lado, há mais desemprego, falta de dinheiro e as pessoas tem tendência a procurar artigos de primeiro preço ou de marca própria. Portanto houve aqui um impacto grande nestes produtos que ganharam mais quota. E devido a uma maior importância e perceção de fatores de higiene e segurança, e aqui a qualidade tem um papel ainda mais fundamental, aumentou a procura por artigos de limpeza, de desinfeção e de segurança. Por outro lado, este aumento da procura no comércio de proximidade fez com que aumentasse a procura de artigos bio, healthy e premium. Porque quando vamos a restaurantes é isso que queremos. Agora que não vamos a restaurantes, queremos procurar este tipo de artigos, no nosso hiper, supermercado, grossista ou mercearia. Descartáveis, papel, obviamente ganharam com a pandemia também pela aceleração do serviço de delivery e take away, mas houve também categorias, por outro lado, que perderam um bocadinho, tudo aquilo que é não alimentar desacelerou, também notámos na parte das bebidas. Há uma tendência quando as pessoas fazem uma encomenda em delivery ou take away de pedirem só comida, porque já têm a bebida.

Têm um parque de dez lojas em Portugal. Em 2019, Olaf Koch, diretor executivo da Metro Cash&Carry, falou na hipótese de ter lojas na Madeira, Serra da Estrela e Covilhã. Em que pé está o plano de expansão?

Se olharmos para a hotelaria e restauração, 70% do mercado está na área da Grande Lisboa, Porto e Algarve. E a Makro já tem neste momento dez lojas físicas nestas regiões. Já estamos presentes nas áreas de maior potencial. De facto, se olharmos para o território nacional e também para as ilhas há potencial por explorar, seja na Covilhã, na Guarda, no Fundão ou Castelo Branco. Aquela zona tem instância de ski, universidades. E também há potencial na Madeira. Mas para já não há planos para a Makro abrir mais lojas físicas. Temos ainda espaço para crescer não só em termos de penetração nos clientes que já temos nessas dez lojas, como também fazer crescer o número de clientes que temos nessas dez lojas. Fazer crescer o nosso serviço de entregas e as nossas ferramentas e plataformas de encomendas, como o MShop, a partir das quais estamos disponíveis para ir a esses sítios entregar. Já fazemos entregas, por exemplo, na Serra da Estrela e na Guarda, no Fundão, a partir das lojas de Coimbra e Leiria. A estratégia passa por crescer nas zonas existentes e explorar essas áreas através dos nossos serviços de entregas. O que não quer dizer que daqui a amanhã não se reequacione este cenário, mas para já esta é a estratégia.

Depois como sabe, há a questão da aquisição da Aviludo por parte do grupo Metro, há também aqui um crescimento do grupo Metro em Portugal através da aquisição da Aviludo.

 

É preferível tê-los como parceiros do que como concorrentes”Makro+David

 

Sim, foi em outubro de 2020 que o grupo Metro comprou a Aviludo. Como está a correr a integração?

É tudo ainda muito recente. Pessoalmente, estou muito satisfeito por ter a Aviludo no grupo Metro. Porque é preferível tê-los como parceiros do que como concorrentes. E acredito que há aqui uma grande complementaridade entre a Makro e a Aviludo. Se olharmos para os valores institucionais as duas empresas têm uma grande preocupação com a qualidade e a relação com os clientes. O ADN é o mesmo. Depois, há uma grande complementaridade regional porque a Aviludo é muito forte no Algarve e em Lisboa e no Algarve não somos tão fortes. E, depois, a Aviludo tem centros de produção de carne onde faz corte e calibração individualizada e isto é uma área que certamente a Makro pode beneficiar. A ideia não será integrar as empresas, mas manter as empresas separadas com a sua própria cultura e ADN. Agora, trabalhamos em mercados alvo que são similares, temos muitos clientes partilhados. Acima de tudo, as estratégias comerciais das duas empresas têm de trazer mais valor acrescentado para o cliente.

Já estão a trabalhar em parceria?

Ainda não. Porque a Autoridade da Concorrência só aprovou o negócio há um par de semanas. Apesar de já termos comunicado a transação há algum tempo, a aprovação oficial só aconteceu no final de fevereiro. Só agora é que nos vamos sentar à mesa e conversar e há muita coisa que podemos fazer juntos. Podemos procurar sinergias na forma como construímos o nosso sortido, a nossa estratégia comercial para os clientes na área da logística e distribuição, por exemplo, ou na criação de competências e treino para as pessoas. Há muita coisa que se pode fazer em conjunto sem integrar as empresas. Esse momento ainda não chegou e estou ansioso por me sentar com eles e de começar a conversar. Penso que os próprios clientes da Makro e da Aviludo estão à espera de perceber qual vai ser a proposta de valor que estas empresas vão trazer em conjunto.

Quantos trabalhadores tem a Makro Portugal?

Cerca de 1.000 funcionários, 100 na estrutura central e o restante nas lojas.

Em cerca de um ano foram comunicadas mudanças na estrutura organizacional em Portugal. Nuno Loução assumiu a posição de head of sales, Filipa Herédia a liderança da comunicação, David Albert a direção comercial, só para dar alguns exemplos. A que de deve estas mudanças e se tem a ver com a questão da redefinição do propósito que mencionava?

A razão das mudanças tem muito a ver com o ajuste da estrutura à estratégia que desenhamos. Uma das principais preocupações quando cheguei foi trabalhar os perfis de liderança e o pipeline de talento no sentido de promover o talento na organização, desenvolver programas de retenção, e criar funções críticas na organização nas quais não tínhamos competência. Trabalhou-se muito a parte da comunicação, marketing digital, foodservice delivery, supply chain, master data, princing. Eram áreas onde estávamos carentes e houve necessidade de ir ao mercado e trazer talento para juntar ao já existente. Acima de tudo, passa por ter as pessoas certas nos lugares certos e, mais importante, ter uma química na equipa em que se trabalhe em conjunto e colaboração. E é aqui que entram os princípios orientadores que há pouco estávamos a falar, ou seja, ter uma equipa de head office que está ao serviço das lojas e das plataformas, o não termos silos organizacionais e ter nas lojas pessoas que estão mais focadas nas relações com os clientes e menos na transação ou na parte operacional.

Tem havido um grande investimento não só na reestruturação, mas também na criação de competências. Por exemplo, a Makro criou há dois anos a Makropédia, um centro de partilha de conhecimento, com três objetivos: treinar e certificar os nossos colaboradores, seja em competência de produto ou de serviço, criar relações internas e ter um sítio para criar relações com os clientes através de showcookings e seminários e também com outros fornecedores e parceiros. Criou-se uma Makropédia na loja de Alfragide e outra em Matosinhos. E tudo isto foi inserido num programa de transformação cultural em que não só se trabalha toda a parte de liderança e talento, mas também toda a parte de venda ativa e a competência das pessoas. Houve uma grande preocupação de há dois anos para cá de investirmos nesta área e de fazermos crescer o nosso ativo principal que são as pessoas.

Os resultados são visíveis? Está satisfeito?

Sim, os resultados são visíveis. Medimos os resultados através de duas ferramentas, uma é o NPS (Net Promoter Score), fazemos medições todos os meses acerca do feedback dos clientes e temos vindo a subir o nosso score consecutivamente. E também através do programa de mistery shopper, pessoas que vão às lojas e verificam o que se está a passar e temos tido um bom feedback.

Temos também internamente o engagement score, medido de três em três meses e, também aqui, ouvimos a organização e o feedback interno tem vindo a melhorar. E, por fim, isso reflete-se em mais vendas e quota de mercado.

 

Marca própria cresce em todas as categoriasMakro_David

 

Há pouco disse que em termos globais o setor vendeu mais marca própria, como é que isso se refletiu no negócio da Makro?

Temos cinco marcas próprias: Metro Chef (alimentar), Metro Professional (não alimentar), Metro Premium (produtos com valor acrescentado), Aro (entrada de preço) e Sabores Lusitanos, marca lançada para os produtos regionais. A marca própria tem vindo a crescer basicamente em todas as categorias, representa já 23% do nosso volume, e se me pergunta se é suficiente, ainda não.

Que meta gostaria de alcançar?

Gostaria de alcançar valores na ordem dos 30 a 35%.  Estou a falar em termos globais, porque no canal foodservice delivery e no canal horeca tem até mais peso. Não estou, no entanto, a dizer que quero crescer através da criação de novos SKU’s, acho é que há muito espaço para as marcas próprias crescerem dentro do sortido existente e substituir muitas marcas Bs e Cs. Porque a marca própria é um excelente fator de fidelização e de relação entre a Makro e os seus clientes. E, por outro lado, são marcas que dão aos clientes mais rentabilidade e produtividade, não só para venda nas mercearias, mas também para toda a parte de transformação nos restaurantes, uma vez que oferecem mais qualidade a um preço reduzido.

Qual o peso dos fornecedores nacionais no sortido?

No total, mais de 90% dos nossos fornecedores são nacionais. Na marca própria há duas fontes: os fornecedores nacionais com os quais desenvolvemos projetos locais e as marcas que vêm das nossas plataformas internacionais. Andará à volta dos 50/50 ou 60/40. Há ainda um peso muito grande dos nossos centros de distribuição em Valência, para a parte das frutas e verduras, e em Roterdão, para a área da carne. Mais e mais se está a trabalhar na parte da verticalização no sentido de trabalharmos com fornecedores e produtores locais, essa será a tendência.

Em junho de 2019, o presidente executivo do Metro AG estimava, em entrevista à Lusa, uma faturação de 400 milhões para 2020. Como fecharam o exercício fiscal?

Em 2019, fizemos 398 milhões de euros e, na altura, alargámos claramente as expectativas. Quando essas previsões foram feitas ainda não estava fechado o exercício de 2019 e ultrapassámos largamente o objetivo desse ano. O objetivo em 2020 já seria perto dos 420 milhões, mas depois a pandemia veio e desacelerou. Em outubro, novembro, dezembro e janeiro tivemos meses fantástico, mas depois a pandemia veio e mudou o cenário. Ou seja, fechámos o exercício de 2020 com 351 milhões de euros e esse foi o impacto da pandemia na Makro. Agora aqui só há oportunidade de crescer.

Quais as expectativas até ao final do exercício fiscal?

Os exercícios de previsão neste momento são quase uma bola de cristal. Porque fazemos previsões todos os meses e os números são muito dinâmicos e já percebemos que há aqui uma grande dependência entre o PIB e o mercado Horeca e a Makro. A minha grande expectativa é que agora, a partir de abril, com as medidas de desconfinamento já comunicadas, o setor comece a crescer. A 4 de abril já podem abrir os terraços, a partir de dia 19 podem abrir o interior dos restaurantes. Agora é estar com os nossos clientes e aproveitar isto e acelerar para ter um grande junho e um grande julho, vamos ter o Campeonato da Europa e esperemos que Portugal ganhe o título novamente e eu espero que os portugueses aproveitem e que os nossos restaurantes e a Makro vendam muito.

Se tivesse que fazer uma previsão, seria em linha com o ano anterior?

Sim, seria em linha com o ano anterior.

Que principais desafios enfrenta este setor a prazo em Portugal, na Europa e no resto do mundo?

Da experiência que temos acumulada de outros países, um dos grandes desafios passa por haver a passagem de um negócio de transação para um negócio de relação. Isso é observável em Portugal, como em Espanha, França e Itália. Diria que França está uns passos à frente. Se olharmos para a Makro, por exemplo, grande parte daquilo que estamos a fazer agora passa por fazer menos volume e mais valor, fazer mais qualidade, mais competência, mais inovação, para ser clara a diferença entre ir a um hipermercado e ir a um grossista especializado no setor de hotelaria e restauração. E isto tem de ser perceber quando se olha para os produtos, para o packaging, para a competência dos produtos, e tem de ser perceber, acima de tudo, quando se olha para as pessoas, em que há um atendimento personalizado e as pessoas conhecem e trabalham os seus clientes. Grande parte do desafio passa por transformar um modelo de transação num modelo de relação. No caso da Makro grande parte do desafio passa por acelerar aquilo que estamos a fazer. O que quero dizer com isto é que a Makro deixou de ser um mero prestador de preço e de produto, neste momento já é um prestador de serviços e soluções, já tem ofertas que neste momento mais ninguém tem no mercado, como as nossas ferramentas digitais e os serviços de consultoria. Há que continuar a trabalhar e a acelerar isto, não só em termos de quantidade, mas também de qualidade. Grande parte do desafio também passa por olhar para lá do nosso umbigo, o setor precisa de nós e temos de perceber qual é o nosso papel para ajudar o setor, para mobilizar, para facilitar, para criar movimentos com as associações, o Estado e outros parceiros, para ajudar o setor a sair da crise e tornar a acelerar. E há pouco falámos do caso da Aviludo. Para a Makro passa ainda, em parceria com a Aviludo, perceber como é que, em conjunto, vamos criar uma proposta de valor ainda mais interessante para os nossos clientes. São estes, diria, os principais desafios: olhar para o produto, para a consultoria, para os serviços, as ferramentas digitais, a aceleração do Marketplace e toda a parte com a Aviludo, como é que vamos trazer mais valor ao mercado.

*Entrevista originalmente publicada na edição 389 do Hipersuper

 

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