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Opinião. A dicotomia entre as competências digitais e interpessoais

Por a 2 de Abril de 2019 as 10:00

Mara MartinhoPor Mara Martinho, Consultora de Retalho da Michael Page

Sobre a importância do profissional de retalho e a sua evolução, já aqui escrevi que: “os consumidores de hoje são, em regra, consumidores mais informados e mais conscientes do valor de cada produto, pelo que se tornam mais independentes de uma figura física que outrora foi crucial para a realização da venda e marcou a diferença em diversas cadeias comerciais. Esta figura física torna-se hoje relevante e pertinente quando se consegue diferenciar e oferecer algo mais ao consumidor. (…) São precisos profissionais cada vez mais informados sobre o produto que comercializam e que o sabiam interligar a um serviço de excelência”.

Nesta linha de ideias, existem duas formas de olhar o mesmo tema. Por um lado, pela ótica da grande e pequena distribuição e, por outro, pelo retalho em si, desde a moda têxtil e acessórios, à decoração, não esquecendo o retalho especializado.

Grande e Pequena Distribuição

Para melhor percebermos esta questão, nada como ouvir os próprios consumidores e a sua visão sobre a experiência de compra: “Para quem mora sozinho ou quem não tem a possibilidade de se deslocar de viatura própria, é mais cómodo optar por uma entrega em casa dos produtos de primeira necessidade. No entanto, sou sincero, frutas e leguminosas não consigo não ser eu a ir comprá-las. Gosto de ver a cor e sentir o cheiro, gosto de perceber o que estou a comprar. Por vezes, mesmo a própria carne ou peixe, prefiro ser eu, novamente, a deslocar-me à loja para poder optar por aquilo que compro. De resto, face ao detergente da loiça ou aos cereais, por exemplo, o ato de tirar da prateleira é o mesmo, seja eu ou um colaborador, por isso é-me igual”.

Este testemunho de um consumidor é um entre vários outros que justificam a existência de lojas de proximidade para a compra dos bens essenciais e de primeira necessidade. Contrastando com uma realidade passada, mas não muito distante, a comodidade era encarada como a ida a um hiper ou supermercado onde se pudesse comprar tudo de uma vez. Todavia, com a mudança de consciência daquilo que é entendido como cómodo, devido obviamente ao digital e ao seu automatismo, é fácil optar por compras online e deixar de perder tempo com deslocações à periferia da cidade para realizar esta atividade.

Retalho

Para podermos analisar a questão do e-commerce, podemos voltar a olhar para testemunhos de clientes: “Tive uma gravidez de risco e vi-me obrigada a ficar ‘presa’ em casa por vários dias. Depois de descansar por um longo período, senti-me sufocada por não conseguir dar uma volta ao shopping ou, simplesmente, passear. O meu consolo foi poder ir visitando alguns websites e poder comprar, mesmo que à distância, coisinhas para a minha bebé e igualmente para mim. Inclusive, lembro-me de uma das vezes não ter gostado do tecido de um dos babygrows que encomendei e o processo de troca foi muito rápido e simples, alguns dias depois tinha uma nova peça de roupa em minha casa”.

“Eu sou a pessoa, dentro do meu grupo de amigas, que mais compras online realiza. Adoro a rapidez do processo e, pelo menos dos websites de onde tenho mandado vir coisas, não tenho qualquer muita razão de queixa. Confesso que o que me faz falta é tocar e poder sentir certos tecidos e também pelos padrões que às vezes não são tão semelhantes quando expostos a uma luz natural. Outra coisa menos positiva é, em certas marcas, quando um determinado número não me serve e tenho de mandar vir outro – ou seja, executar uma troca/devolução – o processo complica-se (por exemplo, ter de me deslocar de propósito aos CTT, esperar, entre outros)”.

Neste ponto, a questão principal é tornar a experiência da compra digital mais idêntica à da compra física. Isto porque, antes de executar qualquer compra numa loja física, cada vez mais o consumidor já se informou online em termos de preços, tendências e experiências reais do produto (através de influencers). Cada vez menos, será necessária a existência de profissionais que sejam meros assistentes do cliente. Em alternativa, dever-se-á formar profissionais que sejam consultores exímios de moda e tendências, que saibam ouvir e aconselhar o cliente.

A conclusão é única – o futuro é a “omnicanalidade”. O mito de que as lojas físicas vão acabar, não passa disso mesmo, um mito, até porque o mercado português ainda consome bastante em lojas físicas. Não obstante, tem de existir uma consciencialização de que o futuro passa pela implementação de um canal digital e que todas as lojas físicas o têm de acompanhar, divulgar e suportar. Tem de ser visto como uma “parceria” entre o que já existe em termos de experiência de compra. O mesmo se passa com as competências digitais e interpessoais, onde umas não vão anular as outras, mas terão de se complementar. O colaborador, e, consequentemente, a empresa com maior sucesso, será o/a que melhor se adaptar a estas mutações constantes, não descurando a atenção ao detalhe perante um consumidor mais exigente e a consciencialização do comodismo e automação digital.

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