A face visível das mudanças que trouxe a chegada da Mercadona

As alterações que a entrada de um novo player já trouxe – e ainda pode trazer – ao mercado português de retalho alimentar, pela lente de quem observa e acompanha o setor do lado de fora

A abertura dos primeiros dez supermercados da Mercadona em Portugal está agendada para o segundo semestre deste ano, mas desde que a empresa espanhola anunciou a sua entrada em território nacional, em 2016, que as principais cadeias de distribuição em Portugal estão a preparar-se para a chegada deste novo operador. “Todas as cadeias se estão a preparar, naturalmente, e a tomar as devidas medidas para a evolução do seu negócio. A face mais visível será, talvez, um realinhamento de tudo o que são os produtos de marca própria das diferentes insígnias, como seja o redesign das embalagens e o lançamento de gamas de produto em linhas muito específicas”, esclarece Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca. E dá um exemplo: “é muito notório o esforço quer do Pingo Doce quer da Sonae nos últimos tempos na área da cosmética. Não será certamente só pela entrada da Mercadona mas é também uma forma de antecipar aquilo que é percebido com um dos valores mais fortes que a Mercadona traz ao mercado, o valor das suas marcas próprias. Eventualmente iria acontecer sem a chegada da Mercadona, era um processo natural. Mas, provavelmente foi acelerado todo um processo para antecipar a entrada de um novo operador no mercado”.

José António Rousseau, docente universitário e presidente do Fórum do Consumo, corrobora. “Estou convencido que a entrada da Mercadona em Portugal irá exigir das outras empresas um desenvolvimento ainda maior e mais exigente das suas marcas próprias, pois a Mercadona é fortíssima neste particular”. Por outro lado, alerta que esta tendência “irá, infelizmente, também contribuir para aumentar o grau de competitividade, de exigência e de pressão nas relações produtor-distribuidor”. José Rousseau diz mesmo que, “nos últimos tempos, os fornecedores têm sofrido uma enorme pressão por parte da generalidade dos retalhistas portugueses”.

Expansão e remodelação de lojas aceleram

Por outro lado, é também visível o investimento que algumas cadeias têm vindo a fazer na abertura de novos supermercados e na remodelação do parque de lojas já instalado. “O reforço dos planos de expansão é mais notório no grupo Sonae do que no Pingo Doce, dado o elevado número de aberturas e de renovações de loja. No Lidl também, com um maior esforço na renovação do que propriamente na abertura de novos espaços”, comenta o diretor-geral da associação que representa os interesses dos produtos de marca. “Até porque tivemos um período longo em que as dificuldades económicas do país motivaram alguma contenção do investimento interno. Mas foi notória, nos últimos dois anos, a expansão dos formatos de comércio de proximidade. Há também aqui algo de antecipação da entrada de outros operadores, no fundo tentando ocupar espaços que poderiam ser ocupados pelos novos operadores”, revela Pimentel.

José António Rousseau acredita que a expansão dos formatos de proximidade está longe de esgotar. “Os maiores retalhistas portugueses, de uma forma geral, já se encontram muito bem implantados em Portugal, mas, naturalmente, ao nível dos formatos de proximidade a expansão ainda está muito longe da saturação”.

Fonte da Sonae MC confirma. A divisão de retalho alimentar da Sonae tem planos para abrir entre 50 a 60 lojas Continente Bom Dia, quatro a oito lojas Continente Modelo e cerca de 150 lojas de “formatos adjacentes” até 2021. “A expansão geográfica passará, preferencialmente, por localizações urbanas, em zonas residenciais e de elevado tráfego, procurando assim servir as necessidades de uma maior proximidade e conveniência dos clientes”.

Para o professor universitário, a influência que a Mercadona no mercado português será “muito positiva”. “Irá verificar-se na gestão de recursos humanos, nomeadamente quanto ao valor dos vencimentos praticados que terão tendência para subir”.

*Com FP