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Produção nacional não chega para crescimento do mercado biológico

Por a 22 de Agosto de 2018 as 11:49

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O mercado da agricultura biológica está a crescer em Portugal. Prova disso é o aumento dos produtos biológicos nas cadeias de distribuição. A Sonae está apostar em pontos de venda especializados. A Agrobio lançou recentemente em Lisboa um mercado biológico. E também já há plataformas na Internet para incentivar a produção e o comércio biológico. Mas muitos dos produtos comercializados ainda são importados

Os pontos de venda de produtos biológicos aumentam. A associação Agrobio tem doze mercados de rua ao fim-de-semana. No mercado do Lumiar, inaugurado a sete de julho, há agora uma zona especializada em alimentos biológicos, fruto de uma parceria entre a associação, a Junta de Freguesia do Lumiar e a Câmara Municipal de Lisboa. As cadeias da grande distribuição aumentam a quantidade de oferta de produtos biológicos nos seus lineares. A Sonae, que conta neste momento com dez supermercados especializados em produtos biológicos, abriu um restaurante de rua com a marca Go Natural. A empresa adquiriu ainda, no segundo trimestre do ano, a Amor Bio, uma empresa detentora de dois supermercados biológicos em Lisboa.

O reforço do número de pontos de venda especializados em produtos biológicos é um sinal claro de que existe mercado para estes produtos, mais ainda do que a produção nacional. Um dos papéis da Agrobio é fomentar a produção nacional de produtos biológicos. A entidade quer reverter uma situação em que ainda muitos dos produtos são importados. “O potencial de crescimento da agricultura biológica e dos produtos biológicos é enorme, porque temos muitas pessoas interessadas em consumir produtos biológicos. As pessoas consumem devido à saúde, pelo meio ambiente e pelos estilos de vida. Querem este tipo de produtos e, por isso, o mercado, está a crescer muito mais do que a produção. Logo aqui há uma grande indicação para a produção a dizer que é necessário produzir mais”, afirma Jaime Ferreira, presidente da Agrobio.

Embora não existam números de produção e de consumo de produtos biológicos em Portugal, o que se está a passar na Europa é revelador do crescimento do mercado. “Os números que temos na Europa são de 15% de crescimento de média ao ano do mercado, enquanto a produção cresce 5%. Há aqui um potencial enorme, haverá poucas atividades com este potencial de crescimento”, assegura o presidente da Agrobio.

Os números que existem em Portugal dizem respeito à área ocupada de superfície útil. São 245 mil hectares para produtos biológicos, que correspondem a 6,5% da superfície agrícola. A maior concentação de terrenos está no Alentejo, na Beira Interior, em Trás-os-Montes e no litoral. No mercado do Lumiar, as produções hortícolas e frutícolas são originárias de Rio Maior, Estremadura e Loures. “Uma das vantagens destes mercados é atrair produtores de proximidade para aqui. É possível. Há áreas para isso. É preciso haver estímulos, é preciso haver apoios melhorados, apoios diferenciados, é preciso mais sensibilização. Um dos trabalhos da associação é sensibilizar os novos e antigos agricultores a fazer a mudança para a agricultura biológica”, diz Jaime Ferreira.

A produção aumenta mas há constrangimentos no apoio aos agricultores

O aumento da produção poderá ser visível num espaço de quatro anos, acredita o responsável: “Sentimos e sabemos que, provavelmente dentro de dois, três, quatro anos, temos novos agricultores que estão agora a se instalar, mas as suas produções só vão chegar ao mercado dentro de dois três, quatro anos e nessa altura teremos obviamente muito mais produção”. “É preciso continuar a investir nisso. É preciso continuar a cativar novos agricultores. Os novos agricultores, sobretudo os jovens, estão muito interessados nesta agricultura. Foram pessoas que cresceram numa ideia absolutamente diferente do passado. Uma ideia da agricultura mais moderna, uma agricultura próxima das pessoas, uma agricultura ligada à saúde e ao ambiente”, acrescenta.

Jaime Ferreira alerta, porém, para os constrangimentos existentes ao fomento da produção. “Um deles é a falta de conhecimento técnico, mais do lado do trabalho da assistência técnica aos agricultores. É difícil, para um agricultor que se quer instalar na agricultura biológica, encontrar assistência técnica. Até nos custos da assistência técnica, que no passsado foram apoiados, mas agora os agricultores têm de pagar completamente do bolso deles”, refere. O próprio Ministério da Agricultura, embora mais sensibilizado para as questões relacionadas com a agricultura biológica, sente dificuldades técnicas na análise dos projetos. “Não há muitas pessoas nos serviços do Ministério da Agricultura capazes de analisar projetos de agricultura biológica. Os projetos de agricultura biológica são diferentes dos projetos de agricultura tradicional. Fazemos aqui projetos de investimento para os nossos associados e, por vezes, deparamo-nos com respostas absurdas de quem não sabe o que está a analisar”, aponta o presidente da Agrobio.

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A maioria dos produtos vem do exterior

Da parte da Sonae, esta assume o compromisso de apoiar os agricultores portugueses, dando prevalência aos produtos nacionais. “Na Sonae MC pretende-se que cada loja se integre na malha urbana da região em que se instala.  Há, por isso, uma forte aposta ao nível dos produtos locais e na primazia à produção nacional nas nossas prateleiras. Este compromisso, em dar preferência a artigos portugueses, aplica-se também à área de produtos biológicos e saudáveis”, garante Frederico Paiva, head of healthy nutrition da Sonae MC.

Há, no entanto, produtos que têm primazia nas escolhas dos consumidores. As frutas e legumes são os mais consumidos pelos portugueses. “Os novos agricultores estão a chegar e isso vai trazer com certeza maior produção para a agricultura biológica, sendo que do nosso ponto de vista o que é mais necessário é o que as pessoas pretendem, que são sobretudo frutas e legumes”, diz Jaime Ferreira. Mas há ainda escassez de lactícinios. “Há que substituir as importações, como os laticínios, porque há potencial. Gostava que fosse aqui também no Continente, mas nos Açores já há dois projetos para a agricultura biológica e para o leite biológico. Futuramente vai haver leite biológico, mas se calhar já não é suficiente”, refere Jaime Ferreira.

Um dos indicadores desse potencial é a oferta destes produtos nas cadeias da grande distribuição. “Um dos consumos que vimos cada vez maior, e veja-se superfícies que também têm produtos biológicos, como o Aldi ou mesmo o Lidl, que têm produtos na gama dos latícinios que são dos mais consumidos”, observa o presidente da Agrobio. Os cereais e as leguminosas são outras categorias com muita falta de produtos nacionais. “Nos cereais também é tudo importado. Aquilo que as pessoas gostam mais são os cereais para o pequeno-almoço e outro tipo de alimentos e, na verdade, não há. É tudo importado. As próprias leguminosas, que há um interesse crescente no consumo, também são muito importadas”, acrescenta.

Faturação da Sonae cresce a dois dígitos

A avaliar pelo ritmo de crescimento de faturação da área de produtos biológicos na Sonae, é de deduzir que a agricultura biológica tem uma grande margem de crescimento. E isso é visível não só nos espaços especializados da Sonae, mas também nas lojas do Continente. Embora não sejam adiantados números sobre o quanto estes produtos valem na faturação, o seu ritmo de crescimento faz a Sonae querer continuar a sua política de investimento nesta área. “Esta área está presente na Sonae MC pelas lojas Go Natural, mas também na oferta já disponível na área Bio e Saudável nas mais de 270 lojas Continente, que também tem vindo a crescer em número de produtos no interior das lojas. É, seguramente, um dos setores de maior aposta da Sonae MC e atualmente regista já um crescimento de dois dígitos. Acreditamos que a área Bio e Saudável vai continuar a surpreender, sempre pela positiva”, revela Frederico Paiva.

A Sonae adquiriu, em 2016, uma posição maioritária na empresa Go Natural. No ano seguinte adquiriu a Brio, empresa que detinha seis supermercados especializados em biológicos. Mais recentemente foi a vez da Amor Bio, empresa com duas lojas especializadas em Lisboa. No caso da Amor Bio, Frederico Paiva diz que a Sonae está a estudar várias possibilidades quanto à denominação da marca. O mesmo sucede em relação ao sortido dessas lojas. “Acreditamos que o mais importante é apresentar uma ampla oferta nas lojas, que se distinga pela qualidade dos produtos, colocando assim ao serviço dos nossos clientes a melhor proposta de valor”, avança.

A cadeia de distribuição admite que, no futuro, possa prosseguir a expansão da rede de lojas em produtos biológicos. Mas não avança detalhes quanto aos planos da empresa. “Estamos atentos ao mercado e, sempre que surgirem oportunidades, pretendemos prosseguir com este caminho de expansão, com perspetivas ambiciosas de futuro”, refere Frederico Paiva. E explica porquê: “Atualmente há uma predisposição evidente para a temática e vemos os portugueses cada vez mais interessados nos produtos biológicos e saudáveis, o que se traduz numa excelente oportunidade para nós”. Frederico Paiva adianta ainda que a empresa está focada “em alargar o acesso dos consumidores a estes produtos sempre a preços atrativos”. É nosso objetivo democratizar o acesso a estas soluções que são cada vez mais prioritárias e não apenas uma alternativa”, acrescenta.

Da parte da Agrobio, a ideia da associação é também que o aumento da produção traga uma democratização do consumo de produtos biológicos. “Há muito trabalho a fazer e é possível produzir de forma mais acessível. Não é o preço ficar igual ao nível do convencional. A ideia é uma diferença de preço de 20 a 30 por cento. Acho que o consumidor está disposto a fazer essa diferença”, menciona Jaime Ferreira.

Para a Sonae, a democratização do consumo não é um mero chavão. Trata-se de ir ao encontro da mudança dos hábitos de alimentação dos consumidores portugueses. “Os hábitos de consumo estão a alterar-se substancialmente. Os consumidores de hoje são mais informados, mais atentos, mais exigentes. Procuram, de forma transversal, alternativas mais saudáveis como produtos com 0% de açúcares ou gorduras adicionadas, produtos provenientes de agricultura biológica ou free from”, refere.  Além da expansão das lojas especializadas, a Sonae está a aumentar o número de gamas e de referências de produtos biológicos e saudáveis. O lançamento da marca Continente Bio, com referências como ovos, bebidas vegetais, é um dos exemplos. “Representam a vontade de ir ao encontro das necessidades dos clientes”, explica Frederico Paiva.

A Sonae pretende ainda aproximar mais os clientes dos produtos biológicos. Daí o lançamento, em Lisboa, do primeiro restaurante de rua com a marca Go Natural. E a estratégia é para prosseguir. “Queremos que a Go Natural esteja junto dos clientes, num formato de proximidade. Acreditamos que o mercado de proximidade no retalho ainda tem espaço para ser explorado. Por isso é que inaugurámos um conceito fora dos centros comerciais. A loja de rua garante conveniência aos nossos clientes, vocacionado para as compras do dia-a-dia”, explica Frederico Paiva.

Para Jaime Ferreira, a estratégia da Sonae é elucidativa do potencial de crescimento do mercado de produtos biológicos, mesmo admitindo que todas as cadeias de retalho estejam a reforçar o leque de oferta de produtos biológicos nos super e hipermercados. “A Sonae percebeu, por exemplo, que, embora os produtos biológicos dentro dos espaços do Continente, em termos gerais são ainda poucos, mas a verdade é que esses produtos tinham uma taxa de venda de 60% face aos outros. Perceberam que havia aqui uma oportunidade enorme e que havia um desejo enorme de ter produtos biológicos”, observa. “Os outros também seguiram este caminho. Mas, para nós, na agricultura biológica e na comercialização, há claramente vários caminhos. “Há a grande distribuição, há os mercados de proximidade e estes locais, porque as pessoas têm interesse em consumir aqui”, finaliza.

*Artigo originalmente publicado na edição de agosto do Jornal Hipersuper

 

 

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