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“Se entender o que é a blockchain, vai entender o futuro do retalho”

Por a 17 de Novembro de 2017 as 12:04

Por Pedro Ruivo, Professor na Universidade Nova Lisboa* e Solution Advisor na SAP Portugal para a transformação digital

Ao contrário da digitalização de processos que durante as duas últimas décadas foram essenciais para criar um digital core, baseado numa arquitetura de gestão de informação suportada por um sistema de registos históricos e transacionais (Ruivo el al, 2017; Mckinsey, 2015), a transformação digital é essencialmente a integração de dois novos sistemas de apoio à gestão (Gartner, 2012). Um sistema de diferenciação, que utiliza as novas capacidades tecnológicas – computação em memória, largura de banda e armazenamento dos dados, e que permite às empresas uma tremenda capacidade analítica em tempo real e, outro, o sistema de inovação, que pode combinar a utilização de um conjunto de tecnologias – mobilidade, IoT, Big Data, Machine Learning, AI e Blockchain (IDC, 2017; Forrester, 2017).

A blockchain é essencialmente uma base de dados distribuída, utilizada para gerir um contínuo e crescente número de registos, denominados blocks (blocos). Cada bloco contém o seu timestamp (carimbo com a hora de registo) e o link (morada) para o bloco anterior. A blockchain é tipicamente gerida de forma coletiva por uma rede peer-to-peer, ao invés do armazenamento num servidor, que estabelece previamente um protocolo comum para validação dos novos blocos (consenso). A tecnologia blockchain tem como base o chamado hash value – atribuição de um valor numérico fixo, único e imutável a cada bloco – que é passível de ser encriptado pela função Nonce.

Existem três tipos de blockchains: pública (como Bitcoin, Ethereum, Riplle), onde qualquer pessoa pode ler, enviar transações e participar no processo de consenso; privada (como SAP, NASDAQ, Hyperledger), em que as permissões de registo são mantidas e centralizadas numa organização e as de leitura podem ser públicas ou restritas (blockchains em ascensão) e; de consórcio (como R3CEV, 3BI, Everledger), em que o processo de consenso é controlado por um conjunto de nós pré-selecionados (uma abordagem híbrida ao blockchain público e privado).

A blockchain permite às empresas implementar um sistema inovador de registos com aplicações imensuráveis ao nível do retalho. É sabido que a lealdade e a confiança no retalho são as maiores preocupações. A blockchain permite ligar diretamente o vendedor ao comprador, sem qualquer intermediação e respetivos custos (como a Amazon). No entanto, este novo paradigma é uma oportunidade para o retalho inovar em novos processos (tal como aquando da tecnologia RFID e afins) e em novos cenários, como são exemplo disso os seguintes casos de aplicação:

–  Segurança alimentar e transparência: a autenticação de alimentos e manutenção de registos na cadeia logística, fornecendo um registo permanente e inviolável sobre cada transação ao longo da cadeia. Por exemplo, a blockchain permite um registo transparente não só sobre o método de pesca para cada peixe, como também sobre a sua frescura e a conformidade do seu manuseamento. Ou seja, permite identificar muito rapidamente uma possível contaminação, assim como que artigos em específico. Como referência, indico a Walmart no rastreio de carne de suínos provenientes da China.

– Artigos de alto valor: registo seguro para autenticação de itens de valor elevado, de forma a evitar a contrafação/falsificação (de vinho, arte, caviar, relógios, etc.). Localização de itens furtados, pois qualquer transação subsequente é registada na blockchain e o proprietário pode ser informado.

– Rastrear artigos de aluguer: e.g. vestidos, câmaras, ferramentas, equipamentos para eventos, etc. A blockchain permite identificar a pessoa atual e acompanhar o processo de retorno e a gestão dos contratos automaticamente.

– Gestão dos programas de fidelização e lealdade: isto é, pontos e cupões. Todas as atividades (emissão, resgate ou troca) são documentadas num registo de transações únicas e transparentes ao longo da cadeia de participantes. Sem a necessidade de intermediários ou base de dados centralizadas.

– Agendamento e receção: planear e gerir o tráfego de entradas e saídas nas lojas e armazéns, de forma eficiente e colaborativa entre todas as partes.

– Gestão de artigos da “economia circular”: baterias, embalagens, componentes, peças, resíduos, etc. A blockchain gere com transparência a propriedade destes artigos sem a necessidade de criar uma instância central.

Sendo a blockchain, a ”silver bullet” para o retalho, não deveremos esquecer que a sua adoção e implementação, como uma tecnologia importante para a transformação digital, assenta em três pressupostos, nomeadamente a existência de um digital core de registos (mais importante para empresas maduras), seleção do tipo de blockchain em que participar e, por último, a identificação e implementação dos casos de aplicação com maior potencial para a organização.

 

*Programa Gestão de Retalho e Consumer Analytics

 

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