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ADN da Distribuição: A Estratégia, por José António Rousseau (5ª parte)

Por a 26 de Dezembro de 2013 as 11:19

Por José António Rousseau, consultor e docente no IPAM/IAD

ADN da Distribuição

18º Gene: Estratégia

5ª Parte

– Leia aqui a 4ª Parte –

(…continuação…)

Abordemos agora as estratégias verticais. Estas estratégias obrigam os retalhistas a invadir o território de seus fornecedores, mantendo o seu foco tradicional de retalhista, mas voltando a sua atenção para os seus fornecedores e outros operadores do circuito. Dois tipos de estratégias verticais podem ser identificados:

A integração e mudanças nas relações comprador-fornecedor que podem envolver a aquisição de fornecedores ou de outros distribuidores. Adquirir um fabricante que fornece uma ampla gama de produtos ou um produto-chave terá em vista facilitar o desenvolvimento de produtos de marca própria, oferecer novas opções de sortido e a redução de custos. Os retalhistas também podem optar por desenvolver a sua distribuição física e capacidades de armazenamento, funções normalmente controladas no passado pelos fabricantes ou pelos operadores logísticos. A centralização da Distribuição tem contribuído e muito para fortalecer a posição negocial com fornecedores, melhorar a eficiência da operações e melhorar os serviços ao cliente.

Outra maneira dos retalhistas seguirem uma estratégia vertical é através do controle dos seus fornecedores por via de mudanças aplicadas na relação comprador-fornecedor. Até ao final da década de 70, em Portugal, os fabricantes dispunham de um poder considerável sobre os retalhistas, controlando não só os preços de venda ao público mas também as inovações de produtos, a distribuição física e a comunicação e publicidade de produtos.

É verdade que a situação se alterou bastante mas quaisquer mudanças no poder de negociação dos compradores em relação ao dos fornecedores dependem do tamanho e concentração dos compradores em relação aos fornecedores e à qualidade de informação que possuam sobre eles, seus produtos e custos.

As grandes superfícies alimentares têm beneficiado de grandes descontos preferenciais dos fabricantes que são mais consequência do poder de mercado e da concorrência horizontal dos fabricantes do que do poder de mercado vertical dos retalhistas. No entanto, relacionamentos mais sofisticados ou subtis, podem ser ainda mais interessantes para os retalhistas, através, por exemplo, da celebração de acordos de exclusividade com fornecedores para o abastecimento de certos produtos ou para o desenvolvimento das marcas próprias dos distribuidores.

Estes acordos podem envolver considerável partilha de conhecimentos e gerar contratos de longo prazo constituindo-se mesmo como uma fonte de relações de parceria com forte potencial de benefícios recíprocos como o paradigmático caso da Mercadona em Espanha tão bem evidencia.

Passemos agora para as estratégias migratórias. Estas estratégias movem o retalhista a sair das suas actividades domésticas ou mais conhecidas, para uma dimensão operacional com características e comportamentos competitivos radicalmente diferentes. Aventurarmo-nos no desconhecido pode acarretar riscos consideráveis mas pode também permitir colher grandes benefícios.

As estratégias migratórias são pois naturalmente extra-territoriais e evolutivas. Por exemplo, a decisão sobre a dimensão de ponto de venda é uma estratégia migratória chave uma vez que, quando um retalhista opta por abrir um novo ponto de venda de dimensões significativamente maiores ou até menores que as das suas operações normais, está fazendo uma escolha estratégica migratória. A alteração do tamanho do formato pode equivaler a um verdadeiro salto quântico de fortes implicações estratégicas e operacionais. Por exemplo, a complexidade da gestão aumenta drasticamente quando se desloca a gestão de um supermercado para um hipermercado pois estes exigem diferentes abordagens no que se refere a qualquer das variáveis do “retailing”-mix destes conceitos.

Por sua vez, a mudança na tipologia das localizações, nomeadamente entre centros de cidade, periferias ou para fora das cidades, constitui outra opção estratégica migratória que altera e afecta muitos aspectos da operação retalhista. E pior ainda quando a decisão consiste em entrar num mercado externo usando uma estratégia multinacional uma vez que como se sabe, de uma forma geral, os conceitos retalhistas, as suas estratégias e os respectivos estilos são fortemente nacionalistas e não viajam bem. Daí que a implementação de uma estratégia multinacional dependa da capacidade da empresa para alcançar a eficiência nas funções operacionais e de suporte, apesar de reconhecer diferenças importantes nos mercados de consumo e suas condicionantes de funcionamento.

Por fim, outra estratégia migratória, como a da mudança de foco, isto é, a mudança de uma oferta generalista para uma oferta de nicho de mercado, ou vice-versa, envolve uma combinação de estratégias internas.

Um retalhista especializado numa gama de produtos claramente definida, escolhe para a desenvolver servir um determinado tipo de cliente ou um segmento geográfico. Caso não encontre a fórmula certa nesta opção, os concorrentes não especializados ou aqueles que consigam oferecer maior valor acrescentado irão obviamente roubar-lhe os clientes.

A especialização arrasta consigo uma série de riscos, incluindo a dificuldade de julgar as necessidades dos clientes, o excesso de concentração do capital investido e alguma rigidez estratégica resultante da natureza do sortido de mono-categoria. Contudo, os benefícios da especialização são impressionantes, uma vez que a resposta dos clientes no que se refere à lealdade é elevada e a cooperação dos fornecedores poderá ser mais relevante nomeadamente quanto a condições preferenciais de abastecimento.

Em jeito de conclusão, podemos dizer que a natureza, por vezes conflituante e sobreposta das escolhas estratégicas, complica obviamente a tomada de decisão dos distribuidores configuradas nas quatro grandes direcções referidas.

As estratégias horizontais impelem a empresa na direcção de expansão, enquanto as estratégias verticais transformam a empresa capitalizando as relações com seus fornecedores. Estratégias migratórias transportam a empresa para dimensões diferentes, exigindo mudanças na missão corporativa da empresa. Qualquer delas pretende alcançar vantagens competitivas mas diferem e muito nos objectivos e na abordagem estratégica.

As estratégias internas têm um mais limitado alcance e impacto externo enquanto as estratégias horizontais fixam a empresa em territórios conhecidos e, a menos que a empresa se aproxime de uma eventual situação monopolista, o que é sempre muito difícil de acontecer no sector retalhista, permanecem relativamente incontroversas.

Por sua vez, as estratégias verticais mudam a definição da chave dos limites operacionais da empresa e, em alguns casos, podem provocar preocupações públicas sobre situações de abuso de poder de mercado ou de posição dominante e conduzir a alterações legislativas mais rígidas e interventivas.

Por fim, as estratégias migratórias envolvem maiores riscos para a empresa porque a conduzem para territórios desconhecidos e exigem um rigoroso planeamento para transformar esses perigos em vantagens para a empresa.

Categorizar todas essas escolhas estratégicas e fazer o mapeamento das opções pode ajudar as empresas a identificar eventuais áreas de conflito ou sobreposição, evitar erros graves e permitir localizar possíveis fontes de sinergias. FIM

José António Rousseau

Consultor e docente no IPAM/IADE

www.rousseau.com.pt

 

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