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Inovação na indústria alimentar e distribuição

Por a 18 de Abril de 2012 as 16:38

A grande parte da inovação na indústria alimentar envolve o desenvolvimento de novos produtos. Para que o “inovador” atinja o objectivo de fortalecer a sua posição competitiva, é necessário que o negócio adicional criado com o novo produto recupere todos os investimentos feitos com o seu desenvolvimento e lançamento: só a partir dessa altura é que a inovação valeu de facto a pena.

Sendo o sector agro-alimentar dos que opera com margens de negócio mais baixas, uma empresa altamente inovadora pode cavar a sua própria ruína se a inovação não recuperar os seus custos. Infelizmente, o sucesso de novos produtos no mercado não é muito animador: grande parte dos produtos falha em menos de 2 anos (as estimativas variam com o país e a época, entre 2/3 e 90% de “falhanços”). Consequentemente, uma empresa inovadora precisa de recuperar com uma inovação bem sucedida não só os seus custos, como também os custos de todas as que não resultaram tão bem.

Esta realidade não é exclusiva da indústria alimentar. A farmacêutica dispõe de mecanismos que permitem a quem desenvolva um novo produto recuperar custos e conquistar bastante valor, através da concessão de patentes, um direito à exclusividade de produção do novo produto por um período muito alargado.

Infelizmente, as empresas agro-alimentares raramente têm esta hipótese. Não se pode propriamente patentear um polvo à lagareiro ou um iogurte de beringelas. Se uma empresa descobrir uma mistura excepcional de sabores com beringelas e mais uns ingredientes num iogurte, qualquer competidor pode repetir muito rapidamente essa receita. Existe alguma possibilidade de patentear tecnologias, e há empresas multinacionais que têm algumas, mas não é por essa via que se têm conseguido grandes resultados. A apetência das cadeias de distribuição por marcas brancas não ajuda: são as primeiras a saber se um novo produto vende bem ou não e, se vender, quererão naturalmente ter a sua versão em marca do distribuidor.

Poder-se-ia dizer que não vale a pena pensar como se vai conseguir fazer um determinado produto novo, sem saber como se vai recuperar o investimento em o desenvolver e lançar.

Obviamente, a distribuição moderna passar para o fornecedor os custos de referenciação (entrada em linha) não ajuda. A ineficiência da distribuição moderna aumenta drasticamente os custos do produto ao consumidor final, o que limita as vendas. Essa ineficiência resulta da prática bem intencionada para com o consumidor de garantir que os produtos em cada loja são os mais baratos. Através da fiscalização mútua de preços e dispondo contratos que garantem ao distribuidor poder aplicar os bónus, descontos ou multas que quiser de modo a assegurar que o preço final ao consumidor é o mesmo na cadeia A que na cadeia B, etc., o que acontece na prática é que as cadeias de distribuição mais eficientes andam a subsidiar as menos eficientes.

A tendência é pois que as cadeias mais eficientes se tornem também mais ineficientes: não há estímulo para melhorar de facto se os custos da ineficiência poderem ser atirados para montante. É pois pouco provável que os custos de referenciação diminuam.

O estímulo à concorrência franca, justa e leal entre cadeias de distribuição seria uma excelente via de melhorar o ambiente para a inovação. A concorrência entre supermercados faz com que estes procurem atrair consumidores. Se os preços são essencialmente os mesmos, mais desconto, menos catálogo, um para cima e outro para baixo, o que é que atrai os consumidores? Pode ser a existência de produtos únicos e apelativos. Nesse caso, uma cadeia de distribuição poderia interessar-se por garantir fornecimento de um produto que considerar inovador e atractivo em condições de exclusividade. Obviamente, isso obriga a um nível de confiança mútuo muito superior ao que existe agora. Com fornecedor e distribuidor ambos empenhados no sentido de vender muito, podia criar-se uma situação semelhante à das patentes da farmacêutica se os contratos tivessem uma duração de vários anos em que o industrial consiga nesse horizonte ver como o investimento na inovação vai ser recuperado. A cadeia de distribuição terá de confiar que o produto novo é “ganhador” e vai dar vantagens competitivas relativamente aos seus concorrentes; o produtor terá que confiar  que passado um ano o distribuidor não substitui o seu produto por uma imitação por causa de um par de cêntimos no preço, ou que não vai querer tê-lo em linha branca.

Há mais exemplos de ideias de colaboração para a inovação entre a indústria e a distribuição que se podiam citar. Efectivamente, a única forma efectiva de assegurar um nível de inovação que beneficia todos: fornecedores, distribuidores e consumidores, é assumindo que hoje em dia a concorrência se faz melhor entre fileiras, não entre fornecedores para cada distribuidor, ou entre distribuidores com todos a monte e fé em Deus. Esperemos que não leve muito tempo para que se possam estabelecer os níveis de confiança mútua necessários para termos casos de sucesso de fileiras integradas, inovadoras e efectivamente competitivas. O consumidor agradece.

Jorge Oliveira, Director do Departamento de Eng. Química da Universidade Nacional da Irlanda, Colégio de Cork e Administrador da Ernesto Morgado, S.A.

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