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Mercadona: o “Chefe”, o Empregado e o fornecedor

Por a 24 de Fevereiro de 2012 as 9:31

A Mercadona foi fundada em 1977, mas tem sido gerido desde 1981 por Juan Roig, um dos filhos dos fundadores. Quando Roig assumiu a liderança, a Mercadona era um retalhista familiar, constituído por 8 lojas apenas em Valência. Hoje, 30 anos depois, o Mercadona é o líder do mercado espanhol e um caso de sucesso reconhecido em todo a mundo.

Na década de 90, com a entrada no mercado espanhol dos grandes grupos internacionais franceses, e dos hard discounts alemães, o grupo debateu-se com sérias dificuldades e quase se deixou comprar. No entanto, em 1993, Roig decidiu remar contra a maré e posicionar-se como uma cadeia de proximidade e com uma estratégia de “Sempre preços baixos”(SPB). A Mercadona cortou nas despesas em publicidade, cancelou promoções e comprometeu-se em praticar sempre preços baixos. O modelo exigia por isso estabilidade não só no preço, mas também nas relações com os fornecedores e empregados. Desta forma, a Mercadona criou um modelo próprio de “Qualidade Total”, segundo o qual, todas as decisões devem satisfazer cinco componentes da empresa: o “chefe [forma como a Mercadona designa o cliente], o trabalhador, o fornecedor, a sociedade e o capital e é esta ordem que indica a prioridade de cada um”. Ou seja, qualquer decisão que seja tomada não pode prejudicar o cliente, o fornecedor ou o empregado. Segundo Zeynep Ton, um professor de Harvard que estudou a Mercadona, o modelo do retalhista permite-lhe ser incrivelmente inovador, porque se baseia em valores sólidos.

Vários exemplos demonstram que estes valores são colocados em prática no dia-a-dia. Por exemplo, em 2008 a empresa não atingiu os objectivos por razões externas, mas mesmo assim os empregados receberam o prémio, porque não tiveram responsabilidade neste resultado. Isto fez com que a equipa nos anos seguintes se mantivesse coesa e não se alterasse a sua alta produtividade. Outro exemplo, é a relação que estabelece de “interfornecedores” com a maioria dos fornecedores de Marca Própria. Este conceito de “interfornecedor” baseia-se em explorar ao máximo as vantagens de colaboração entre o fornecedor e retalhista, baseando-se numa relação de confiança e de longo prazo. Não existe contracto, sendo que a principal garantia é o alto custo para a Mercadona de mudar de fornecedor numa categoria inteira. Esta relação permite que em conjunto sejam encontradas soluções que optimizem a logística e os processos produtivos.

O modelo de “Sempre preços baixos” implica uma oferta de sortido reduzida, mas que satisfaça todas as necessidades (“o carro completo”) do chefe. Por esta razão a Mercadona não se considera um distribuidor (para isso teria que ter muitas marcas), mas sim um “TOTALERS”, ou seja, a sua função é proporcionar soluções completas ao chefe, de forma que este encontre tudo o que precisa nas suas lojas e não sinta necessidade de ir a outro sítio.

As Marcas Próprias desempenham um papel muito importante neste modelo, sendo compostas por 4 marcas: Hacendado (tudo o que é alimentar); Deliplus (produtos de higiene e beleza); Bosque Verde (produtos de limpeza lar, roupa e loiça) e Compy (alimentação animal). Segundo um estudo recente da Havas Media “Meaningful Brands for Sustainable Future”, as Marcas Próprias da Mercadona são das preferidas dos consumidores espanhois e estão ao nível de Marcas de Fabricante reconhecidas internacionalmente como, por exemplo, Danone e Coca-Cola.

O modelo de Total Qualidade implementado na década de 90, permitiu que o grupo crescesse de uma forma sustentada, permitindo uma politica de confiança com todas as partes, bem como, inovar e ter uma alta produtividade. Por esta razão, um estudo de Harvard compara a Mercadona à Toyota da década de 70.

Em 2008, a recessão económica mundial afectou fortemente Espanha, que apresenta actualmente uma das maiores taxas de desemprego dos países industrializados (22,85%). Este contexto desafiou a Mercadona a ser mais criativo na forma de atrair clientes e aumentar as suas margens.

Uma das estratégias seguidas pela Mercadona foi dar mais espaço à Marca Própria, retirando das lojas todas as marcas que não tivessem rotatividade diárias, mesmo que fossem de líderes importantes. Esta medida não foi muito popular na opinião pública, mas sem impactos negativos para o grupo, que continuou a crescer. A Mercadona é, aliás, segundo um estudo recente da Kantar, a cadeia responsável pelo crescimento do peso das Marcas Próprias em Espanha, sendo o país com a segunda maior taxa de penetração de Marca Própria do mundo em 2010, ultrapassando o Reino Unido. Segundo uma fonte do grupo, os hábitos dos consumidores alteraram-se nos últimos anos, “os clientes já não querem uma grande variedade de produtos, mas sim uma selecção que lhes proporcione a melhor relação preço/qualidade do mercado. É nosso dever adaptar o sortido às necessidades do chefe”.

Outras medidas importantes para fazer face à recessão foram várias alterações no packaging, na logística e no transporte das mercadorias (alguns exemplos podem ser visto na Caixa 2), de forma a reduzir custos, tendo o grupo conseguido poupar entre 2009 e 2010 mais de 2.200 milhões de euros!

Por tudo isto não é de admirar que Roig tenha sido dado como exemplo de empreendorismo pelo editorial do El País em Março de 2011. Para Roig um alto padrão de vida exige uma alta produtividade e isso implica remover tudo o que não acrescenta valor, mesmo que seja impopular, ilustrando com o nível de absentismo do país que representa um desperdício de 18 milhões de euros dos salários pagos.

Com a crise a manter-se, será que outros retalhistas mundiais vão seguir o exemplo da Mercadona?

História da Mercadona
1977 – Fundação do grupo pelo pai do actual presidente, Francisco Roig
1981 – Juan Roig e a sua mulher compram o grupo Mercadona à família
1982 – Primeiro retalhista Espanhol a usar código de barras
1988 – Aquisição do grupo Superette
1989 – Aquisição do grupo Cesta Distribución, que permitiu ao Mercadona a expansão para Madrid
1991 – Aquisição dos retalhistas Dinos e Super Aguilar
1993 – Introdução “Todos os dias preços baixos”
1996 – Introdução da Marca propria
1998 – Aquisição do grupo Paquer na Catalunha
1999 – Processo de passar a quadros efectivos todos os quadros do grupo
2004 – Decisão de fechar aos Domingos de forma a proporcionar melhor qualidade de vida aos empregados
2006 – A cadeia abre a 1.000ª loja
2007 – A cadeia atinge 60.000 empregados, todos com contracto efectivo
2009 – Anúncio da maior redução de preços de forma a manter o nível de preços
2011 – Turnover de 16.485€ milhões. Lucro de €398 milhões (crescimento de 47%)

Poupanças de algumas medidas do Mercadona
O Mercadona poupou € 2 Mil Milhões através de medidas específicas de redução de custos. Alguns dos exemplos com maior impacto:

Anchovas: alteração do packaging de metal para plástico. Eliminação de caixas de papelão para plástico.
Poupança Anual: €3.000.000

Ovos: redução da tinta usada no packaging e eliminação do cartão da caixa no transporte.
Poupança Anual: 370.000€

Pizza fresca: alteração das caixas de transporte para serem também caixas de demonstração e melhoramento na logística.
Poupança Anual: €3.229.215

Peixe Congelado: alteração do packaging e melhoramentos na logística.
Poupança Anual: €3.328.931

Pasta de dentes: alteração da fórmula e do tamanho da embalagem para 125ml.
Poupança Anual: 1.800.000€

Agua Melhoramento da logística de transporte com mais unidades por palete.
Poupança Anual: 1.125.000€

Pão Fatiado: Transportar mais por menos, através de embalagens de 15 fatias em vez de 12.
Poupança Anual: 3.400.000€

Presunto: Melhoramento no processo e investimento em novas linhas de produção.
Poupança Anual: 2.700.000€

Catarina Cordas, [email protected]

 

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