Outras Opiniões

A crise

Por a 14 de Novembro de 2008 as 9:30

alexandre mota

por Alexandre Mota,

3-2-1-0… É praticamente oficial: estamos em crise. Para já trata-se de uma crise financeira, em breve, será também económica, política e social. A cereja sobre o bolo seria mais uma “Guerrinha”. Oxalá que não.

Ao nível político, a crise trouxe à ribalta a necessidade de discutir o papel do Estado. Uma das razões pela qual esta crise se intensificou foi porque o Estado se dispersou por outras áreas em que não devia estar e descurou a fiscalização sobre o bom funcionamento do mercado (veja-se, por exemplo, a actuação lamentável da Securities Exchange Comission nos EUA). Todos nós sabemos que a ganância faz parte da Natureza Humana. Quem quis ter casa acima das suas possibilidades foi ganancioso, assim como o agente imobiliário que as vendeu, o banco que as empacotou com o capa de produtos de baixo risco e mesmo os clientes inebriados e sedentos de uns pozinhos a mais na rentabilidade. Isto foi, é e será sempre assim. O que é inaceitável é que toda esta deriva especulativa tenha passado ao lado dos reguladores estatais. Os que não sabiam ficaram a saber que o mercado é um bicho por vezes selvagem. Já o Estado não é o cão de guarda que devia ser, mas sim um monstro gordo, afogado no seu laxismo e sem noção do que faz e para que serve. Confirmamos isso nesta crise. Por outras palavras, não precisamos de mais Estado, precisamos de um Estado que cumpra o seu papel fiscalizador que defenda a concorrência e a transparência dos mercados. Se isso tivesse acontecido, não haveria necessidade de, agora e em desespero, intervir para salvar a economia.

Ao nível geopolítico, a crise coloca a nu as fragilidades dos mais antigos bastiões do capitalismo: os EUA e a Europa. Nesse sentido, é preocupante que algumas das novas potências emergentes no capitalismo global não tenham o liberalismo no sangue. Por exemplo, a China é uma ditadura que distorce o comércio mundial e ganhou um poder imenso no controle efectivo dos acontecimentos, a Rússia historicamente é uma pátria de oligarcas mais preocupados com o poder do que com a liberdade económica. Por último, os países árabes são geridos, a maior parte deles, por regimes déspotas que alimentam fundamentalismos religiosos perigosos e hostis ao Ocidente. Quando se fala em falta de liquidez e se pensa onde ela poderá andar, há que estar preocupado. Muito preocupado.

Ao nível da economia real, não nos salvamos de uma recessão, aumento do desemprego e agravamento das tensões sociais. É previsível que a Europa seja o epicentro deste fenómeno, com cada país, corporação ou sector de actividade reivindicando apoios, subsídios, direitos, favores, etc., em proveito próprio mas com prejuízo geral. A Velha Europa que viu nascer Mussolini, Hitler e Estaline vai de novo ser palco de movimentos radicais, desde os nacionalismos racistas aos saudosistas soviéticos, agora travestidos. Isto não é só política, é também economia, porque a própria União Económica e Monetária poderá estar em causa se pensarmos que o montante de resgate do sistema financeiro é cerca de 15% do PIB europeu e juntarmos o possível aumento astronómico dos deficits orçamentais resultantes do aumento das despesas sociais numa situação recessiva. Neste contexto económico extremo até que ponto os alemães estão dispostos a pagar a factura? É um pouco catastrófico, concedo que sim, mas valerá a pena pensar nisso.

Para terminar, ao nível dos mercados financeiros, há tendências que me parecem prováveis. No mercado cambial, deverá ocorrer a valorização das divisas dos países que têm superavits de conta corrente e maior margem orçamental para gerir a crise, mesmo que tenham taxas de juro pouco convidativas. Neste contexto, o iene e o franco suíço deverão revelar-se especialmente atractivos e as moedas dos países emergentes especialmente vulneráveis à desalavancagem e aos ataques especulativos.

Nos mercados accionistas, o futuro aponta para alguma normalização das condições de volatilidade (o índice de volatilidade VIX está nos máximos históricos) e para uma maior selectividade nos investimentos. Empresas com pouca dívida, elevada capacidade de auto-financiamento, com negócios sólidos e vantagens comparativas serão apostas muito mais seguras do que negócios muito dependentes de linhas de crédito outrora generosas e agora escassas.

Em termos do mercado monetário, esta crise pode bem ser denominada de 0-1-2-3. Explicando: mais depressa do que julgávamos as taxas dos bancos de referência dos principais bancos centrais poderão ser até ao 1º trimestre de 2009: 0% no Japão (actualmente 0.5%), 1% nos EUA (actualmente 1.5%), 2% na zona euro (actualmente 3.75%) e 3% em Inglaterra (actualmente nos 4.5%).

Consultor e Gestor de carteiras da Golden Assets

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