FMCG Marcas

William Kenneth Salvador, sócio-gerente da Taviusa

Por a 21 de Setembro de 2007 as 9:00

taviusa

«Queremos mostrar as vantagens do sal tradicional do Algarve»

Com uma cobertura superior a 80% no mercado britânico, a Taviusa, uma empresa portuguesa há mais de oito anos a actuar no sector do sal biologicamente produzido, quer agora servir o mercado nacional, numa altura em que os consumidores portugueses começam a despontar para a supremacia da opção biológica

A procura de produtos biológicos está a crescer acima da oferta» é a opinião de vários especialistas neste mercado. A Organic Monitor, consultora americana do sector, aponta para um crescimento anual de 5 biliões de dólares; e, de acordo com a empresa de consultoria KPMG, a quota destes produtos, no total dos produtos alimentares, deve atingir os 6% dentro de apenas três anos. Por todas estas razões, espera-se que o mercado dos produtos biológicos continue a crescer, passando o modo de produção biológico a estender-se a um cada vez maior número de bens.

No que diz respeito aos produtos alimentares, há produtos que não podem ainda utilizar o epíteto “biológico”, por não se tratarem de produtos agrícolas aos quais normalmente é associado o termo “biológico”. Porém, no âmbito do Parlamento Europeu tem estado a ser debatida uma proposta que visa a classificação de produtos como o sal, a lã ou as conservas como “produtos biológicos”.

Relativamente ao caso do sal, em Portugal, muito há ainda a fazer, não só para que sejam reconhecidas as vantagens de consumo associadas à alternativa biológica, como em relação à distribuição deste tipo de produto junto dos consumidores.

Hipersuper (H): O sal, enquanto mineral, pode ser certificado como um “produto biológico”?
William K. Salvador (W.S.): Sim, no caso do sal, estamos perante um mineral e não uma planta. Daí que seja menos imediato o reconhecimento de que o sal foi “biologicamente produzido”. Contudo, o sal pode ser certificado como produzido de acordo com o modo de produção biológico, procurando assim garantir ao consumidor que este foi obtido em salinas situadas em reservas naturais, sem risco de poluição, recolhido e limpo manualmente e cumprindo todos os requisitos em termos de análises clínicas. No caso da Taviusa, o sal é proveniente das salinas de Tavira e Castro Marim, ambas certificadas.

H: E quem pode certificar o sal?
W.S.: Há actualmente poucas empresas a conceder certificações neste domínio. Uma delas é a “Organic Farmers & Growers” que está acreditada pelo Departamento para o Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais, do Ministério da Agricultura do Reino Unido, o segundo país com mais consumidores de produtos biológicos. Nós temos esta certificação para o mercado britânico e temos ainda a certificação da Kosher, que certifica o nosso sal no mercado de consumidores de origem judaica. No mercado nacional somos certificados pela Certiplanet. No caso dos sais de banho, temos a certificação da Sativa.

H: Quais foram as razões por detrás da entrada da Taviusa neste mercado?
W.S.: A Taviusa foi fundada em 1999 em Tavira, junto à reserva da Ria Formosa, uns meses após a minha chegada a Portugal. Tinha acabado de obter um MBA nos EUA, país onde sempre residi. Chegado a Tavira, não se me apresentaram de imediato formas de poder usar a minha formação académica. À falta dessas oportunidades, decidi criar a minha própria empresa, ligada à opção saudável de alimentação que sempre defendi. Para além do sal e da flor de sal, produzimos sais de banho. São as 3 únicas categorias de produtos que produzimos.

H: Enfrentou alguns obstáculos por não ser português?
W.S.: Não dominava a língua portuguesa, pelo que tentei sempre agir com base na confiança. Mas, como tinha feito, durante um ano, estudos no México, falava um bocadinho de espanhol. Isso ajudou nos contactos iniciais, nomeadamente junto dos fornecedores de sal, normalmente salineiros a quem a faina nas salinas não permitiu obter outra formação senão a da “escola da vida”. Depois, iniciei contactos no Reino Unido onde, já na altura, os consumidores estavam muito cientes das vantagens do sal biológico sobre o industrial. Por isso, foi necessário trazer a Portugal os certificadores ingleses. Foi uma tarefa árdua porque os salineiros, alguns sem saber ler nem em português, tiveram de confiar na minha tradução…

H: Que formas de distribuição usam no mercado do Reino Unido?
W.S.: Temos cerca de 80% do mercado inglês coberto, estando o nosso sal em cadeias como a Sainsbury, a Waitrose, a Asda e a Tesco. Para além disso, é possível encontrar-se o nosso sal nalgumas lojas de produtos biológicos e naturais.

H: E no mercado nacional?
W.S.: Até há pouco tempo, toda a nossa produção era escoada para os mercados britânico, sueco e alemão. Para além de vender ao consumidor final, também vendemos sal para a indústria farmacêutica e para a indústria de panificação, mas aqui apenas para o sub-segmento dos produtos biológicos. No que diz respeito ao mercado nacional, só agora achamos que o consumidor português está a revelar interesse na alternativa biológica e apenas muito recentemente a perceber que há diferenças entre o sal biológico e o sal industrial.

H: E que diferenças são essas?
W.S.: O sal tradicional é produzido através de métodos ancestrais usados já há centenas de anos, quer por romanos quer por árabes. São várias as vantagens reconhecidas a estes métodos de recolha e tratamento do sal do mar, nomeadamente em termos de sabor. A natureza do sal tradicional é mais complexa do que a do sal processado industrialmente. No sal processado industrialmente quase todos os compostos são removidos no processo de limpeza e tratamento, com excepção do cloreto de sódio. Se se colocar uma pequena pedra de ambos os tipos na ponta da língua para sentir o sabor, é possível verificar que o sal tradicional tem um sabor forte, sem ser áspero. Permite, por isso, acrescentar um leque variado de aromas à comida. Já o sal processado industrialmente, tende a ser mais áspero e por vezes tem mesmo sabor a metal. O leque de sabores é também muito mais reduzido.

H: Sendo que assistimos hoje em dia a campanhas para a redução do consumo do sal, como pode defender o consumo do sal tradicional ou biológico?
W.S.: O sal tradicional, para além do sabor, também traz vantagens para a saúde. Contém mais de 80 elementos que se podem encontrar na água do mar, como por exemplo o plâncton, o krill (pequeno camarão invisível) e restos de esqueletos de pequenos animais marinhos, fontes excelentes de cálcio natural, magnésio, zinco, cobre e molibdénio. E, enquanto alguns destes elementos se encontram apenas em quantidades reduzidas, outros nutrientes benéficos à saúde, como o magnésio, o cálcio e o potássio, estão presentes em quantidades expressivas. Estes importantes nutrientes perdem-se quando o sal é limpo por recurso a produtos químicos, como acontece com o sal industrial.

H: E há diferenças em termos ambientais?
W.S.: Sim, o consumo do sal tradicional e seus derivados também é melhor para o ambiente. O sal tradicional é recolhido manualmente, sem a intervenção de qualquer máquina ou combustível fóssil. Adicionalmente, as salinas ao mesmo tempo que permitem a obtenção do sal também funcionam como uma plataforma para a vida selvagem da região, designadamente para as populações de aves migratórias, como acontece, por exemplo, na região da Ria Formosa de onde o sal da nossa marca (Nutrimar) é proveniente. Por outro lado, a preferência pelo sal tradicional significa contribuir para a sustentabilidade dos pequenos salineiros, normalmente pessoas de idade avançada que dedicaram toda a sua vida à arte de obter o sal.

A propagação dos métodos industriais pôs em risco a continuidade desta tradição. Mas felizmente o reconhecimento de que o sal tradicional é superior à opção industrial tem conseguido reverter esta tendência.

H: O que é a flor de sal?
W.S.: Sal tradicional e flor de sal passam pelas mesmas etapas, com a diferença que a flor de sal é recolhida à superfície da água, através do uso de finas redes que normalmente se colocam na ponta de varas compridas. Normalmente, a flor de sal representa apenas de 7 a 10% do sal extraível de uma salina e, por isso, o seu custo é mais elevado. Estando acima do nível da água, a flor de sal é considerada “la créme de la créme” do sal. A flor de sal só pode ser recolhida quando o tempo assim o permite. Se existir demasiado vento os cristais vão ao fundo antes do salineiro ter tempo para os recolher. O facto dos cristais de flor de sal estarem no início do seu processo de formação explica o seu aspecto de pequenos flocos e a sua finura. Estes cristais podem ser considerados as sementes que dão depois origem aos cristais mais grossos que se encontram na parte mais inferior das salinas.

De acordo com a opinião dos nutricionistas, a flor de sal, apesar de mais cara, permite obter um sabor melhor e mais prolongado. Assim, a flor de sal deve substituir o sal refinado na cozinha, por ser mais rico em nutrientes, com vantagens para a saúde e sem que isso cause um rombo na cabaz de compras das famílias. E normalmente é necessária uma menor quantidade para se obter idêntico resultado em termos de sabor. Daí que a preferência dos consumidores vá normalmente para a flor de sal no tempero das saladas e até para cozinhar.

H: Quanto vale o mercado destes produtos?
W.S.: Apesar de as estimativas apontarem para um mercado de sal tradicional e flor de sal na ordem dos 500.000 euros, este mercado está a crescer acima dos 20% ao ano, um claro sinal de que os consumidores em Portugal estão a despontar cada vez mais para as preocupações com os produtos biológicos, a que o sal não é alheio. De facto, já vai sendo possível verificar a existência de alguns produtos de sal produzido de acordo com o modo de produção biológico nalgumas lojas gourmet das principais cidades portuguesas. A flor de sal nacional recebe o grosso das preferências dos consumidores portugueses que o preferem face a produtos concorrentes provenientes da Europa. A este propósito convém referir que a flor de sal de Tavira recebeu, no ano passado, o “Superior Taste Award” do ITQI – International Taste and Qality Institute, com sede em Bruxelas.

H: Actualmente, quem está a servir este mercado?
W.S.: Como é um mercado que só está agora a começar a despontar, há muito poucos operadores. Em termos internacionais, penso que o sal de Tavira é, sem sobrancerias, um dos melhores do mundo, comparável apenas ao que vem de algumas regiões do sul de França. Felizmente, trata-se de um mercado em que os consumidores portugueses preferem o que é nacional por saberem que o Algarve, para além das praias, possui salinas de excelente qualidade.

H: Que produtos constituem a vossa gama?
W.S.: Temos sal de cozinha, flor de sal e sais de banhos, todos produzidos de acordo com o modo de produção biológico. A flor de sal Nutrimar é comercializada em embalagens de 250, 500 e 750 gramas e ainda de 3 quilos (para hotelaria e restauração). Temos ainda o sal tradicional (fino e grosso) e sais de banho, em embalagens de 250g (com essências de limão e gengibre, rosas, lavanda e óleo de “tea tree”).

H: Como pensam servir o mercado português?
W.S.: Temos uma loja on-line em www.taviusa.com onde se podem adquirir os produtos da Nutrimar, mas estamos à procura de distribuidores para iniciar a sua distribuição nas cadeias de distribuição moderna que já disponibilizam uma área para os produtos biológicos.

Susana Costa

*Professora na Universidade Católica Portuguesa do Porto
[email protected]

Deixe aqui o seu comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *