Outras Opiniões

Mercados em Fevereiro: Entrada de leão saída de sendeiro

Por a 16 de Março de 2007 as 14:34

alexandre mota

O mês de Fevereiro parecia confirmar o melhor dos mundos: bons dados macroeconómicos e resultados das empresas, bolsas nos máximos. Em suma, euforia. Mas apenas num dia (27 de Fevereiro), o mercado cedeu os ganhos do mês e em alguns casos do ano.

Comecemos por passar em resumo os dados macroeconómicos divulgados recentemente:

1) O banco central europeu manteve as taxas inalteradas em 3.5%, mas deu indicações de que em 8 de Março subirá as taxas de juro em 25 pontos base. Na conferência de imprensa, o BCE referiu que está em forte vigilância relativamente à inflação e que as taxas de juro permanecem a níveis baixos num contexto de política monetária acomodatícia. O BCE tem focado a sua atenção nos riscos inflacionistas para 2008, já que 2007 parece mais influenciado pelos custos da energia. Estes custos devem ter um impacto desinflacionista durante os próximos meses, apesar do efeito do aumento do IVA na Alemanha. Em Março, veremos se a política monetária continuará a ser caracterizada de acomodatícia e se as previsões de crescimento/inflação continuam a sustentar taxas de juro mais elevadas.

2) Apesar da recente desaceleração da confiança dos agentes económicos, que ficou aquém do esperado em Janeiro, as condições económicas da zona euro permanecem sólidas:

– o crescimento económico continua acima do potencial.

– a taxa de desemprego atingiu o mínimo histórico de 7.5% com destaque para a evolução positiva na Alemanha e França. As perspectivas são positivas, quer ao nível da avaliação que os consumidores fazem do mercado de trabalho quer ao nível da componente de emprego nos inquéritos PMI. A melhoria ao nível do mercado de trabalho levou vários banqueiros a alertarem para a necessidade de moderação salarial nas negociações que estão em curso com os principais sindicatos. O IG Metall, um dos maiores sindicatos alemães, reivindica aumentos de 6.5% em 2007, versus 5% exigidos em 2006 e 3% verificados.

– os indicadores de confiança estão acima da média histórica e em alguns casos bateram as expectativas (por exemplo PMI dos serviços). Neste enquadramento é previsível uma estabilização do crescimento da economia europeia em torno do potencial.

3) A inflação europeia continua abaixo de 2% (1.9%). Em Janeiro, o efeito do aumento do IVA na Alemanha foi compensado pelos baixos preços da energia e pelos saldos de Inverno. O foco da política monetária continua a estar no médio prazo, pelo que os riscos inflacionistas continuam a ser relevantes para as decisões do BCE.

4) A reserva federal americana manteve as taxas de juro inalteradas em 5,25%, numa decisão tomada por unanimidade. A actual conjuntura económica é caracterizada por uma economia em fortalecimento e um mercado imobiliário em estabilização. No que diz à inflação o FED considera que deve haver alguma moderação, mas menciona que os riscos permanecem no sentido de uma inflação mais elevada. O FED está satisfeito com os actuais níveis das taxas de referência, as quais devem permanecer estáveis nos próximos meses.

A visão benigna quanto à inflação reduz espaço para subidas de taxas e o outlook positivo para a economia reduz espaço para descidas. A FED mantém uma atitude neutral, confirmada no testemunho de Bernanke ao Senado.

Os mercados tiverem um excelente comportamento durante a maior parte do mês, mas sofreram uma forte correcção significativa nos últimos dias de Fevereiro. Os principais motivos para as quedas nos mercados foram:

– indicações negativas no mercado de crédito americano, designadamente ao nível do aumento dos mal parados e consequentemente aumento dos spreads de crédito. Este factor não nos surpreende, tendo alertado para esse facto no nosso artigo anterior (ideia nº 1 para 2007);

– eceios de recessão nos EUA, acentuados pelas palavras do ex-presidente da FED (Alan Greenspan);

– aumento da instabilidade política no médio oriente, designadamente no Irão há riscos acrescidos de uma escalada militar;

– instabilidade no mercado chinês com rumores que dão conta de possíveis restrições à entrada de capitais, devido à excessiva especulação.

Em resumo, o movimento de queda dos mercados decorre de um processo de correcção (abrupta é certo) da exuberância exibida nos últimos meses. O início do ano exuberante, não nos surpreendeu, nem a correcção (embora um pouco mais cedo e mais forte do que o esperado) pois está em linha com o que tínhamos referido no artigo anterior (ideia nº 2 para 2007).

Numa perspectiva de longo prazo os fundamentos da economia mundial são bons. A economia mundial está mais resiliente do que há nas crises anteriores, embora a globalização torne os ciclos económicos mais interdependentes. Os lucros das empresas têm crescido a bom ritmo e não há comparação com a bolha especulativa dos finais dos anos 90, porque os múltiplos das empresas não estão historicamente altos.

Numa perspectiva de longo prazo (mais de 1 ano) aos actuais níveis parece-nos mais interessante comprar do que vender acções, mas mantemos as ideias anteriores: títulos defensivos, se possível com bom histórico de dividendos. No mercado português continuamos a preferir títulos como a Brisa e EDP e nos mercados internacionais defendemos empresas com baixos múltiplos e baixo endividamento (ainda as há), em detrimento de empresas com pouca geração de cash flow.

No mercado cambial, defendemos uma recuperação rápida do iene durante o mês de Março devido à liquidação de posições vendedoras na divisa nipónica.

Alexandre Mota, Analista da Golden Assets