Marcas & Patentes

A Contrafacção: Fenómeno crescente

Por a 16 de Fevereiro de 2007 as 15:57

joão mioludo

Falando de marcas, design ou outros direitos privativos de propriedade industrial, é quase inevitável falar das manifestações negativas que lhe estão associadas, e que obviamente se prendem com as infracções praticadas sobre os direitos de exclusivo deles resultantes.

Nesta perspectiva surge em particular destaque a contrafacção, que a lei portuguesa qualifica como crime no artigo 323º do Código da Propriedade Industrial (CPI), sob a epígrafe “Contrafacção, imitação e uso ilegal de marca”.

Quando falamos de contrafacção estamos, grosso modo, a referir-nos ao uso não autorizado do direito privativo, qualquer que ele seja, pelo respectivo titular.

A contrafacção é hoje um fenómeno à escala mundial. Arriscamo-nos mesmo a dizer que não haverá país no mundo em que a contrafacção não seja objecto de atenção, e não apenas pelas pessoas ou entidades mais directamente ligadas com este fenómeno.

«A contrafacção e a pirataria são hoje um fenómeno de dimensão internacional e representam 5 a 7% do comércio mundial. Este fenómeno prejudica o bom funcionamento do mercado interno, pois além de provocar desvios de tráfego e distorções da concorrência, conduz à perda de confiança dos operadores no mercado interno e a um decréscimo nos investimentos. As repercussões são importantes, não só no plano económico e social (100.000 empregos perdidos por ano para a Comunidade), mas também em termos de protecção dos consumidores, em particular no que diz respeito à saúde e segurança públicas» (Resumo do Livro Verde da Comissão das Comunidades Europeias, sobre o combate à contrafacção e à pirataria no mercado interno).

Actualmente, estima-se que a contrafacção, e os negócios por ela gerados, representam já mais de 10% do comércio mundial. E se estes números são por si só significativos, se tomarmos por exemplo alguns sectores de actividade, não podemos deixar de nos surpreender. O caso do mercado mundial de produtos audio é sintomático: estima-se que 30% desse mercado está nas mãos de contrafactores.

A contrafacção abrange na verdade todos os sectores de actividade económica, desde os artigos de luxo (porventura os mais apetecíveis) aos brinquedos, dos medicamentos às partes e acessórios de automóveis ou aviões.

Os estudos existentes sobre a contrafacção permitem chegar a duas conclusões: é um fenómeno crescente, e prejudica de modo significativo as economias.

Na sua origem estão diversos factores, cujo tratamento e exposição nos levariam certamente muito longe.

Para quem pretenda enveredar por este caminho, apenas pode esperar lucros. A actividade é extremamente lucrativa, e os riscos são mínimos. Desde logo, o contrafactor não faz investimentos, nem na inovação nem na publicidade, não se preocupa com a qualidade, porque não tem de a garantir ao consumidor, e se considerarmos a crescente liberalização do comércio e as facilidades tecnológicas, então as previsões não são de facto as mais optimistas.

As consequências sócio-económicas para as empresas, para as economias e consumidores acabam assim por ser graves.

Para as empresas, a contrafacção implica desde logo um decréscimo do volume de negócios e perdas significativas de mercado. Constitui além disso um forte desincentivo, porquanto vêem prejudicados todos os seus investimentos na inovação, publicidade ou marketing. Acarreta-lhes ainda prejuízos decorrentes da afectação da imagem da marca ou da qualidade do produto, particularmente grave quando se trate de marcas notórias. Claro que toda esta situação tem ainda graves repercussões no emprego por elas oferecido. As previsões sobre o desemprego provocado pelo fenómeno da contrafacção são na verdade assustadoras. Os números mais recentes de que pudemos dispor apontam para cerca de 100.000 empregos, só na União Europeia.

As consequências reflectem-se também ao nível das economias nacionais. São muitos milhares de euros que não são cobrados em IVA ou ao nível de direitos aduaneiros, com repercussões nas receitas públicas e previsões orçamentais. Também não podemos esquecer-nos das questões laborais associadas ao fenómeno. Muitas pessoas trabalham em absoluta precaridade, sem quaisquer garantias ou vínculos laborais, além de que não descontam para os sistemas de segurança social, assim se dando cobertura a práticas inaceitáveis de infracções à legislação laboral. Além disso, o fenómeno prejudica ainda os investimentos, porquanto gera uma desconfiança generalizada nos operadores económicos.

E, contrariamente ao que muitos possam pensar, também os próprios consumidores são prejudicados. Estes são desde logo enganados quanto à qualidade dos produtos. Depois não dispõem de serviços pós-venda, e por conseguinte de qualquer garantia em caso de defeito do produto. Isto é particularmente grave se tivermos presentes os casos dos medicamentos ou brinquedos, com graves consequências para a saúde e segurança públicas.

Também em Portugal esta questão reveste particular acuidade, como aliás o demonstram as recentes reportagens televisivas. Sendo certo que, de um ponto de vista sócio-cultural muito haverá a fazer para mudar a consciência social do público consumidor português nesta matéria (em Portugal existe essa “crença generalizada” no produto de contrafacção, mais barato, e que por acaso até imita muito bem o produto original!), do ponto de vista, por assim dizer, institucional, impõem-se alterações significativas, sob pena deste fenómeno se estender cada vez mais, com nefastas consequências para a economia e que são sobejamente conhecidas.

Voltaremos seguramente a este tema numa próxima oportunidade.

João Paulo Mioludo

FURTADO – Gabinete Técnico de Marcas e Patentes – [email protected]