Segurança Alimentar

Biosegurança Alimentar: Organismos Geneticamente Modificados

Por a 10 de Novembro de 2006 as 12:03

joaquim dias

A manipulação genética de organismos superiores é algo que o Homem tem vindo a fazer desde há milhares de anos com o intuito de satisfazer as suas necessidades e interesses. Procedeu ao melhoramento de plantas, através da selecção de sementes, ao cruzamento de espécies relacionadas, resultando por vezes, na criação de um novo ser, mas sempre dentro dos limites impostos pelas barreiras naturais que cada organismo apresentava. Com o avanço da engenharia genética, foi possível obter fragmentos de ADN de determinados organismos e introduzi-los numa outra molécula de ADN de um organismo completamente diferente. O resultado é um ADN recombinado artificialmente, que vai fazendo várias cópias à medida que a célula onde foi introduzido se vai dividindo, permitindo ao organismo um desenvolvimento e características, que de uma forma natural era impossível tê-las – Organismo Geneticamente Modificado (OGM).

O impacto que os OGM têm sobre a biossegurança alimentar tem gerado muita controvérsia e receio. Biossegurança é o uso sustentável do meio ambiente, dos produtos biotecnológicos e as suas relações com a saúde humana. Os potenciais riscos que os OGM poderão ter ao nível da segurança alimentar ainda não são totalmente conhecidos, pois criar alimentos que contenham genes de organismos que nunca serviram de alimento ou combinações genéticas nunca antes existentes na natureza, pode ter como consequência a introdução, na cadeia alimentar humana, de novas proteínas e metabolitos que poderão ser tóxicas ou alergénias.

Os riscos ambientais que a produção de plantas transgénicas comportam é outro motivo que coloca em causa a biossegurança. O facto destas novas culturas serem tolerantes a herbicidas leva os agricultores a um uso abusivo destes químicos com consequências óbvias para o ambiente e para a saúde dos consumidores. Os próprios genes modificados destas plantas podem transferir-se para outras plantas, através de polinização cruzada, contaminando as culturas tradicionais e criar ervas daninhas resistentes a herbicidas, ou para microrganismos, como os vírus, adaptados para recombinar o seu material genético com o de outros organismos, podendo resultar no desenvolvimento de novas doenças. A progressiva substituição e supressão das variedades tradicionais, por novas variedades geneticamente modificadas, representa outro enorme risco ambiental, pois a sobrevivência das espécies e sua adaptação a novas condições depende da sua biodiversidade.

Assim, é natural que as pessoas se recusem a consumir alimentos geneticamente modificados. No entanto, esta intenção esbarra no facto dos produtos finais, cada vez mais, utilizarem ingredientes oriundos de OGM e de na alimentação do gado, utilizar-se rações e hormonas de crescimento geneticamente manipuladas, correndo os consumidores o sério risco de consumir ou já terem consumido este tipo de alimentos. Neste contexto, e no seguimento do acordado no Protocolo de Cartagena sobre a Biossegurança, a União Europeia decidiu criar os regulamentos (CE) 1829/2003 e 1830/2003 que obriga os géneros alimentícios, que sejam constituídos ou produzidos a partir de OGM numa proporção superior a 0,9%, a constar no seu rótulo o termo “geneticamente modificado”. Tenta-se garantir a rastreabilidade e preservar o direito à escolha por parte do consumidor. Ainda assim, não garante produtos 100% livres de transgénicos pois a presença de vestígios de OGM quer se deva por acidente ou por ser tecnicamente inevitável é possível.

Apesar dos receios causado pelos OGM ao nível da biossegurança e desta 1ª geração de plantas transgénicas apenas beneficiar os produtores, a sua evolução e utilização será inevitável. O crescimento populacional tem sido exponencial, estimando-se que em 2025 o número de pessoas no planeta passará, dos actuais 6 mil milhões para os 8 mil milhões. Desta forma será necessário produzir mais alimentos e de uma forma mais rápida com menores recursos, numa altura em que a degradação e desertificação dos solos e a cada vez menor disponibilidade hídrica se fazem sentir com mais intensidade. É também imperativo criar alimentos de onde se possam retirar mais rendimento, maiores e mais resistentes de forma a poderem ser distribuídas em longas cadeias de distribuição sem se danificarem. Para além disso, a nova geração de OGM irá focar as necessidades e exigências do consumidor, isto é, alimentos mais ricos em nutrientes, mais baixos em calorias e gordura e mais funcionais. Talvez assim, haja uma maior aceitação por parte das pessoas em relação a estes produtos, pois ainda ninguém se lembrou de criticar ou condenar o facto de terem sido criadas células geneticamente manipuladas capazes de produzir insulina numa quantidade e velocidade muito superior às das células tradicionais.

Joaquim Dias, Engenheiro Alimentar