Distribuição

Consumidores ditam mudanças

Por a 10 de Janeiro de 2006 as 18:00

Cap Gemini

Nos próximos cinco anos, os produtos frescos, fáceis de preparar ou prontos a cozinhar, vão conhecer uma nova dinâmica no mercado alimentar, de acordo com um estudo da consultora Cap Gemini. Assim, a Grande Distribuição vai apostar cada vez mais nas marcas próprias e na qualidade e segurança alimentar, para responder às crescentes exigências do consumidor final. As grandes marcas, essas, vão estender-se a novas categorias de produto, assim como adicionar submarcas às actuais.

Pode ser uma autêntica revolução na cadeia alimentar. Um estudo da prestigiada consultora Cap Gemini Ernest & Young, intitulado “State of the Art in Food”, traça os novos desafios, a curto prazo, que produtores e distribuidores terão de enfrentar para fazerem face às novas exigências dos consumidores, nomeadamente em termos de saúde, segurança e qualidade alimentar. Os produtos frescos e regionais vão ter maior protagonismo nas grandes superfícies e os alimentos prontos a cozinhar, sinal dos tempos modernos, conquistam espaço e ditam regras nas prateleiras.

O canal Tradicional enfrenta o desafio dos novos formatos de distribuição alimentar. Despesas elevadas, baixo e limitado número de produtos frescos e lucros reduzidos, estão a tornar difícil a subsistência das lojas, sobretudo as mais pequenas. Para sobreviverem, terão de adoptar uma nova linguagem mais próxima do consumidor e que assenta em valores como verdade, respeito e dignidade, sugere o estudo.

Com o objectivo de ultrapassar a tendência que aponta o modelo como esgotado, alguns mercados, como é exemplo a estratégia americana já em curso, aumentam e modernizam a área de venda dos supermercados, com vista à inclusão de novos produtos e serviços. Desta forma, «espera-se que num futuro próximo operem quatro ou cinco grandes empresas de distribuição alimentar à escala mundial, assim como dez indústrias de produção alimentar que vão apostar em 25 marcas fortes nas várias categorias de bens de consumo de grande rotação». O estudo vai ainda mais longe: estas marcas, segundo o documento, vão deter a posição de liderança em mais de 100 países.

O poder da área do retalho vai revelar-se com especial evidência nas categorias de alimentos frescos e congelados. A Grande Distribuição deve apostar em força na monitorização do processo de produção por parte de especialistas, sendo que qualidade e segurança vão constituir as palavras de ordem no mercado alimentar dos próximos anos. Como consequência, esperam-se alterações significativas na cadeia de abastecimento alimentar em todo o mundo. Wal-Mart, Tesco, Carrefour, Safeway USA, Safeway Reino Unido (RU), Delhazise, Royal Ahold, Aldi, Lidl e Kroger, companhia que ainda não opera no mercado internacional, são algumas das empresas com posições de destaque no novo mercado que se avizinha. No entanto, este conceito de inovação vai abraçar também operadores regionais, como a Wegmans (USA), Superquinn (Irlanda) e Waitrose (RU). A par do “salto” previsto para o retalho alimentar, prevê-se também que as grandes marcas mundiais vão continuar a crescer, sobretudo nos países mais desenvolvidos.

Tendências

Quanto às tendências de consumo, o documento revela que o consumidor vai tornar–se cada vez mais exigente e disposto a comprar mais produtos nacionais. Mas é a conveniência que vai ditar as regras, sendo que, muito mais do que variedade, o consumidor procura alimentos embalados em pequenas quantidades, fáceis de preparar ou prontos a comer. São os desejos e necessidades dos consumidores que vão conduzir a cadeia de abastecimento. O estudo aponta algumas tendências que caracterizam os tempos mais próximos: conforto, saúde, variedade, individualidade, divertimento e segurança e qualidade alimentar.

A comunicação dos parceiros de negócio com o consumidor final, assim como o desejo de influência do comportamento do consumidor, são factores que vão sofrer alterações neste novo mercado. Segundo a Cap Gemini Ernest & Young, os distribuidores têm de possuir algumas características especiais: habilidade para se adaptarem apenas a um único formato, direccionados para grupos-alvo bem definidos; poder de compra e quotas de mercado significativas; funcionalidade; habilidade para captar a imaginação do consumidor e, por último, uma estratégia clara e diferenciada.

A iniciativa de uma empresa de produção de carne de porco americana é disso um bom exemplo. A frase “Pork: The other White Meat” faz parte de uma campanha de marketing que alcançou muito sucesso junto dos consumidores. Justin King, director da área alimentar da Marks & Spencer, garante: «Não acredito que exista uma empresa no Mundo que pretenda outra coisa senão ver que o dinheiro investido é bem canalizado. Ou seja, a melhor forma de usar o dinheiro é gerir um negócio que satisfaça os consumidores».

“Grande distribuição regula cadeia”

Este novo cenário vai desencadear uma batalha pelo poder da cadeia alimentar entre as marcas “gigantes” e as grandes empresas de retalho internacional, «na disputa pela carteira e memória do consumidor». No entanto, a ideia de «cooperação entre estes intervenientes é tida como fundamental para a evolução construtiva do mercado alimentar».

Para a concepção do estudo, foram recolhidos depoimentos de representantes dos grandes intervenientes no sector alimentar – Produção e Distribuição. Grande parte dos produtores inquiridos revelam recear as consequências do aumento de volume de negócios para os distribuidores, alegando que esta situação os força a providenciar descontos extra, assim como perdem privilégios de localização nos lineares. Os retalhistas, por sua vez, defendem que os produtores abusam do poder que alcançaram e que não mostram respeito pela importância do papel dos lojistas.

A grande maioria dos entrevistados acredita ser a Grande Distribuição a regular a cadeia alimentar nos próximos cinco anos. Contudo, este domínio vai ser mais evidente no sector dos alimentos frescos e congelados, onde os retalhistas vão apostar nas marcas próprias. No sector das bebidas, cosméticos, cuidados pessoais e tabaco vão continuar a ser os produtores a deter a maior quota de mercado. Os retalhistas vão gerir de forma mais eficiente o processo de produção, sobretudo em termos de qualidade e segurança. O objectivo é fazer com que o produto final vá de encontro às reais necessidades do consumidor. A fidelização do consumidor e a inovação na imagem das lojas vão também constituir preocupações constantes.

Atentos às novas realidades, os produtores estão a reunir esforços no sentido de influenciar o estilo de vida do consumidor. Este fenómeno vai manter-se no futuro, implicando um investimento avultado para sensibilizar a consciência dos consumidores para a importância da saúde. Assim, prevê-se que as grandes marcas vão estender-se a novas categorias de produtos, assim como adicionar submarcas à actual panóplia de produtos.

Os produtores acreditam que a única forma de balancear o crescimento da Grande Distribuição passa por aperfeiçoar o sistema de inovação e acompanhar as evoluções tecnológicas. Contudo, alerta o estudo da consultora, isto implica um investimento duplamente superior ao orçamento corrente. Assim, os produtores preferem usar o “know-how” como vantagem competitiva, a inserir marcas privadas no portfólio.

O estudo da Cap Gemini Ernest & Young foi desenvolvido com base em inquéritos junto de 10 mil consumidores americanos e 6 mil europeus e sucede a outro documento realizado em 1999, que visava apenas o mercado alemão, e dois anos mais tarde alargado ao resto da Europa, Estados Unidos e Ásia/Pacífico.