FMCG Vinhos

Vindimas do mundo

Por a 13 de Dezembro de 2005 as 15:00

Vindimas

Com as vindimas concluídas nos mais importantes países produtores de vinho do mundo, a Organisation Internationale de la Vigne et du Vin prevê uma quebra na ordem dos seis por cento na produção mundial para a campanha de 2004/2005. Apesar da redução registada na quantidade, o mercado é curiosamente unânime em admitir um aumento da qualidade do vinho.

De acordo com a Organisation Internationale de la Vigne et du Vin (OIV), os “grandes” países produtores de vinho mundiais apresentam uma quebra na produção de vinho para a campanha de 2004/2005. Os últimos dados apontam para um decréscimo na ordem dos seis por cento face à campanha de 2003/2004, prevendo uma produção entre os 271,6 e os 287,7 milhões de hectolitros. Na realidade a campanha transacta – 2003/2004 – apresentou, segundo um relatório apresentado pelo OIV durante a realização da última assembleia do organismo que tutela o vinho a nível mundial, um recorde de produção, atingindo os 297,5 milhões de hectolitros, um crescimento de mais de 30 milhões de hectolitros face à campanha de 2002/2003, assumindo-se, assim, como o melhor ano da última década.

Na realidade e caso se confirmem as piores previsões do OIV, a campanha de 2004/2005 não representa uma cenário “catastrófico”, já que, analisando os últimos dez anos, os 271,6 milhões de hectolitros (pior estimativa) ficam acima da média dos últimos dez anos fixada nos 268,3 milhões de hectolitros. Por outro lado e caso se confirme o melhor cenário previsto pelo OIV para a presente campanha, esta confirmar-se-á como a segunda melhor produção do período em análise.

Velho Continente

A situação económica vivida em 2004/2005 dentro do espaço da UE-25 confirmou, depois de um “boom” na renovação e plantação de vinha no final do século passado, graças às ajudas dadas para o efeito pela Comissão Europeia, uma redução gradual nos direitos de plantação em diversos países produtores de vinho, sendo disto exemplo França, Espanha, Itália e, claro, Portugal. De facto, as ajudas dadas pela União Europeia permitiram a muitos países renovar a sua viticultura, permitindo um aumento gradual das produções e respectiva qualidade, apresentando-se a campanha de 2003/2004 como um reflexo desta situação, registando a melhor produção dos últimos dez anos.

Durante o presente ano, naturalmente que as condições meteorológicas sentidas na Europa em muito contribuíram para a quebra verificada na produção no Velho Continente, situação que terá sido particularmente sentida nos principais países produtores. Os dados do OIV apontam, de resto, para uma quebra generalizada na Europa, aparecendo Portugal, Espanha e Chipre, no top das variações negativas, apresentando quebras de 16, 21 e 42 por cento, respectivamente.

No caso português e confirmando as últimas estimativas do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), a produção nacional deverá ficar pelos 600 milhões de litros (o OIV estima a produção portuguesa em 625 milhões de litros), quando as primeiras previsões apontavam para uma campanha a rondar os 750 milhões de litros. A região nacional mais afectada será o Alentejo, prevendo-se uma quebra perto dos 30 por cento, fixando-se a produção total próxima dos 75 milhões de litros. Também as regiões da Estremadura (-26%), Douro (-22%) e Terras do Sado (-20%) registarão uma redução na campanha de 2004/2005, continuando a mais antiga região demarcada do mundo a apresentar a maior produção vitivinícola a nível nacional, com cerca de 130 milhões de litros.

O segundo maior produtor de vinho do mundo – França, depois de ter sido destronada pela Itália – apresenta igualmente uma quebra, estimando o OIV menos 305 milhões de litros, ou seja, uma variação negativa de cinco pontos, fixando a produção francesa nos 5,3 mil milhões de litros. A maioria dos produtores da região de Bordéus (responsável por cerca de ¼ da produção de vinho francês) é, no entanto, da opinião que, apesar desta campanha ser marcada pela quebra na produção, o aumento da qualidade dos néctares está garantida. Christian Delpeuch, director do Conseil Interprofessionnel des Vins de Bordeaux (CIVB), refere que a produção na região deverá ser ligeiramente inferior ao registado no último ano, posicionando-se, contudo, acima da média. O responsável salienta, no entanto, que esta situação «não é boa, já que os produtores possuem ainda cerca de um milhão de hectolitros de vinho armazenado nas suas adegas, o que juntando à forte quebra nas exportações, fará com que muitos agentes da região terão de ser muito comedidos na sua produção, existindo o “perigo” de aumentarem ainda mais os stocks de vinho existentes». Outra região francesa de renome – Borgonha – parece, de acordo com as previsões, poder vir a suplantar em termos qualitativos a região de Bordéus, destacando Odile Meurgues, responsável pelo departamento técnico do Bureau Interprofessionnel des Vins de Bourgogne (BIVB), a qualidade das uvas, «especialmente das castas Chardonnay e Pinot Noir».

Na vizinha Espanha, as estimativas apontam para uma redução de 21 por cento face à campanha transacta, fixando a produção total perto dos 3,4 mil milhões de litros, ou seja, menos 890 milhões. De acordo com os entidades oficiais, a situação assemelha-se muita à vivida em Portugal, com a produção a decair, mas a qualidade a subir. A seca e o calor afectou de forma significativa as vinhas, assegurando, contudo, a qualidade das uvas, realçando-se os cuidados que os produtores terão de ter com os níveis de acidez dos seus néctares. Na região de Ribera del Duero, os produtores prevêem uma quebra de 40 por cento na produção, apontando a pior seca vivida nos últimos 60 anos como a principal causa, afectando de forma bastante significativa as vinhas em todas as regiões do país. Os produtores de Rioja, por sua vez, revelaram que a região deverá ser poupada, devido à sua localização geográfica. Apesar das várias associações espanholas do sector vitivinícola estarem de acordo com os números apresentados pelo executivo liderado por Zapatero, são muitos os produtores que afirmam que a qualidade dos néctares irá compensar a queda em quantidade.

Novo Mundo

Tal como na Europa, também os países pertencentes ao denominado “Novo Mundo” vitivinícola registaram uma forte evolução na área de vinha plantada no final da década de 90 do século passado, aparecendo a Nova Zelândia, África do Sul, Argentina, Chile, Califórnia e, principalmente, Austrália como os líderes na produção de vinho. Este facto levou a uma evolução das exportações, registando-se uma “invasão” de vinhos provenientes do Novo Mundo no Velho Continente. Confirmação disto mesmo, é a Austrália que, em pouco mais de uma década, assumiu a liderança do mercado dos vinhos no Reino Unido, aparecendo o Chile e a Califórnia em lugares cimeiros em muitos países da “eurolândia”. Com o mercado europeu a absorver cada vez mais vinhos destes novos países produtores, os néctares produzidos na Europa vêem o seu espaço reduzido, aparecendo a exportação como a tábua de salvação para muitos agentes da fileira vitivinícola, mas onde as fortes campanhas de marketing e promoção realizadas pelos viticultores do Novo Mundo, suportadas por fortes investimentos, complicam as exportações para os vinhos produzidos nas adegas europeias.

Dos grandes produtores extra-europeus, os Estados Unidos da América, cingindo-nos praticamente à Califórnia, e o Chile aparecem, segundo dados do OIV, como os únicos países a registarem evoluções positivas nas produções, apresentando aumentos de sete e seis por cento, respectivamente. No caso da Califórnia, as opiniões dos produtores dividem-se entre uma previsão de vinhos «soberbos» ou mesmo «espectaculares». De acordo com as palavras do departamento de agricultura norte-americano, o equivalente ao nosso ministério da agricultura, «ao aumento da produção equivalerá uma produção de grande qualidade». As piores previsões apontam para uma produção perto dos 2,05 mil milhões de litros, enquanto o melhor cenário assegura cerca de 2,13 mil milhões de litros, isto, é a produção dos EUA aumentará entre 10 e 80 milhões de litros, equivalendo a uma evolução situada entre os seis e nove por cento.

Mais a Sul, o Chile apresenta um crescimento médio de seis por cento para a campanha de 2004/2005. As autoridades oficiais e muitos produtores apontam mais uma vez, para um aumento da qualidade, destacando-se neste capítulo os tintos. De facto e analisando os dados do OIV, o Chile poderá ver a sua produção aumentar entre 30 e 50 milhões de litros, fixando as estimativas finais apresentadas para a campanha e 2004/2005 entre os 660 e os 680 milhões de litros, superando assim a campanha de 2003, por muitos reconhecida como uma das melhores com 668 milhões de litros.

Na vizinha Argentina, muitos produtores confessam-se até surpreendidos pela qualidade das uvas, prevendo a vinificação de «excelentes brancos e ainda melhores tintos». Com a produção da campanha transacta a revelar-se como das melhores, as autoridades temiam pela actual campanha, situação que, contudo, não se veio a verificar, já que as estimativas apontam para uma produção entre os 1,50 e os 1,54 mil milhões de litros, isto é, uma campanha muito semelhança à anterior, mas uma evolução positiva na ordem dos 30 milhões de litros face a 2002/2003.

A África do Sul prevê uma descida na produção na ordem dos cinco por cento, passando de 928 milhões para aproximadamente 850 milhões de litros. Mas, tal como em Portugal, à quebra registada na produção equivalerá um aumento na qualidade dos vinhos a sair das adegas. De acordo com os dados divulgados pelas autoridades oficiais sul-africanas, as quebras de produção serão maiores nos brancos do que nos tintos, referindo Henk Bruwer da Wine Cellars que «iremos registar um decréscimo de 15 a 20 por cento nos brancos, mas no que diz respeito aos tintos, a produção será muito semelhante à da campanha anterior, mas com uma qualidade muito superior».

Com uma situação semelhante à verificada na África do Sul, isto em termos de volume, a Austrália deverá registar uma diminuição entre 30 e os 80 milhões de litros, fixando a campanha deste ano com uma produção entre os 1,30 e os 1,35 mil milhões de litros. A qualidade em ambas as cores dos néctares parece, no entanto, estar garantida, revelando Stephen Strachan, director-geral da WFA, que «a campanha de 2004/2005 demonstrará uma forte incremento na produção de brancos», salientando que a maioria das regiões «gozaram de condições excelentes durante todo o ano, especialmente na época das vindimas, prevendo-se um aumento significativo da qualidade dos vinhos a produzir».

Com a generalidade dos países a registarem uma diminuição da produção, as previsões quanto à qualidade são curiosamente unânimes: os vinhos vão melhorar bastante. Num quadro em que Portugal precisa “urgentemente” de ganhar quota de mercado nos principais mercados mundiais, com especial destaque para o Reino Unido e Estados Unidos da América (com enfoque na Florida e Nova Iorque), não esquecendo a Alemanha, Brasil e os países escandinavos, a conjuntura parece não ser das mais favoráveis para os produtores nacionais. Com um enorme desequilíbrio em termos de valores a investir em campanhas de marketing e promoção nos mercados prioritários, cabe aos nossos produtores tentar convencer os consumidores de todo o mundo com excelentes propostas vínicas e apostar cada vez mais no valor das castas nacionais.