Não Alimentar

Quebra generalizada

Por a 19 de Setembro de 2005 as 13:04

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O comportamento do mercado de cuidado pessoal masculino reflecte as dificuldades sentidas no grande consumo. Após alguns anos de crescimentos sustentados, todas as categorias apresentam decréscimos nas vendas no ano móvel Março/Abril 05, confirmando a tendência já reportada pela Nielsen relativamente ao exercício de 2004.

É certo que alguns produtos estão em franco crescimento, com o consumo a alargar-se ao segmento masculino, como por exemplo depilatórios, cremes para a pele, etc. Tanto que surgiu o novo conceito de metrosexualidade, associado ao cuidado e preocupação do homem com a sua aparência. Contudo, nos produtos ditos tradicionais, a tendência é generalizada, e para descidas tanto em volume como em valor.

Começando pelos produtos de barbear, segmento que rendeu 12,6 milhões de euros no período em análise, regista-se uma quebra de 4,9% em valor, confirmando a descida já verificada nos volumes comercializados, desta feita de 3,7%. Ou seja, não só o mercado está em retracção como o valor desce a níveis superiores ao volume, o que representa, em termos práticos, uma descida dos preços de venda ao público, tanto mais que ainda se teria que contabilizar uma inflação de 2,4%, de acordo com os dados divulgados pelo Banco de Portugal relativamente ao último exercício.

Em termos de penetração nos lares nacionais, a categoria que mais desceu foram as espumas de barbear, depois de um significativo e preocupante decréscimo de 8,9 por cento em volume. A isto correspondeu igualmente uma quebra de 11,2% em valor, confirmando precisamente a necessidade de recolocar preço neste mercado. A situação explica-se em parte pela retracção de consumo, mas igualmente através do fenómeno de substituição a que se assiste. De facto, as espumas stão a dar lugar às referências gel, que no mesmo período subiram 8,5% em quantidade e 5,8 pontos em valor. Aliás, segundo a Nielsen o gel terá mesmo ultrapassado pela primeira vez as espumas em termos de valor de mercado, pois o volume de negócios cifrou-se nos 4,632 milhões de euros, ligeiramente acima dos 4,618 milhões vendidos em espumas.

A quebra global de mercado, todavia, é confirmada pelo comportamento dos cremes, descendo 6,2% em volume e 8,7% em valor. Com isto, juntando as quebras nas categorias cremes e espumas, não totalmente compensadas pelo acréscimo no gel, que basicamente substituiu as espumas, temos um mercado em ano de recessão, com uma quebra global do volume de negócios na ordem dos cinco por cento, o que é significativo no contexto de um sector bastante dinâmico há uns anos a esta parte. Em 2001 e 2002, por exemplo, estes produtos registam aumentos de cinco e quatro pontos percentuais em valor, tendo até subido para uma variação de sete por cento no ano seguinte. Em volume, já desde 2001 que este mercado vem denotando o elevado grau de penetração, com variações de um e dois pontos, mas sempre positivas. Ou seja, o mercado não aumentava volumes mas crescia com expressão ao nível do valor, situação que agora se inverteu, uma vez que as quebras deste último indicador são ainda maiores do que nas quantidades comercializadas.

Em 2004, é certo, já se havia registado a quebra confirmada agora pela IND (Índice Nielsen Drogaria) no ano móvel MA 05, mas sem dúvida que estamos perante um cenário pouco animador, na medida em que o sector deixou de conseguir criar valor de mercado, tendência que se manteve inalterável ao longo de toda a década de 90. Os produtos de barbear, portanto, espelham bem as dificuldades sentidas no grande consumo nos últimos tempos. Como veremos à frente, a situação é semelhante em todo o sector, nomeadamente nas lâminas de barbear e no after shave.

Excepção lâminas

Ainda assim, as lâminas de barbear constituem uma excepção na medida em que, apesar de uma quebra em quantidade de 4,7%, o valor de mercado manteve-se inalterado, após uma variação positiva de 0,3%, para montantes de 47,5 milhões de euros. O desenvolvimento de sistemas continua a ser a grande alavanca da categoria, mesmo que a apresentação de propostas tenha abrandado. De qualquer forma, as grandes marcas continuam a “revolucionar” o mercado com mais-valias do ponto de vista da utilização, conforto e eficiência, o que naturalmente traz os valores de venda mais para cima.

Os sistemas, como se disse, são neste momento o maior subsegmento, com vendas anuais a rondar os 28 milhões de euros, ou seja, já bastante à frente das descartáveis (18 milhões de euros) que ainda não há muitos anos dominavam. Em volume, obviamente, continuam a vender-se muito mais descartáveis – 41,5 milhões de unidades no período em análise contra 16,5 milhões de lâminas para sistemas – mas a fiabilidade do subsegmento sistemas tem vindo progressivamente a ser reconhecida. O ano móvel em consideração, contudo, confirma a tendência de mercado, pois desceu 5,9 por cento em volume, conseguindo, porém, aumentar em valor 1,4 pontos.

Quanto às descartáveis, assinalam uma quebra menos pronunciada na quantidade (2,9% que explica uma procura por preços mais baixos em função da crise), tendo descido apenas 0,3 por cento em valor. No fundo, o subsegmento acompanhou a inflação em matéria de preços, o que já não pode ser considerado um resultado negativo face a todas as condicionantes da envolvente económica. Finalmente, as lâminas de duplo gume têm já uma expressão insignificante no mercado, com vendas anuais à volta do milhão de euros e em clara quebra, depois de descidas de 16,5 por cento em volume e de 15,8% em valor.

O caso das lâminas, apesar de ainda ser a categoria que consegue manter valor no mercado, não deixa de ser elucidativo, uma vez que nos anos anteriores a evolução tinha sido bem mais significativa, nomeadamente de 17% em 2001, de 10% no ano seguinte e de 13 pontos em 2003. Estes números reflectem o enorme sucesso de alguns lançamentos como a Mach3 ou a Quattro, para falar dos mais mediáticos. Em 2004, todavia, o abrandamento já foi nítido, pois o mercado apenas evoluiu um ponto percentual.

Referência ainda para o crescimento evidenciado pelas máquinas de barbear. Se há uns anos o segmento estava estagnado, passou a crescer consideravelmente em 2003 e 2004, com aumentos de 28 e 30 por cento em valor, respectivamente. Estes incrementos reflectem a crescente tecnologia utilizada pelos fabricantes, aumentando o grau de eficácia destas propostas. Este sinal foi especialmente evidente em 2003, pois em volume a variação foi de apenas três por cento, por comparação com uma oscilação em valor quase dez vezes maior. No ano seguinte, os dois indicadores equivaleram-se, mas em acréscimos significativos de 30%, num mercado que representa vendas anuais à volta dos quatro milhões de euros.

Já na categoria after shave, os resultados também não são animadores, pois o mercado, no seu global, evoluiu negativamente, nomeadamente 4,7% em quantidade e 5,7% em valor. O único subsegmento em evolução é a formulação em creme, apesar de representar ainda pouco num universo global à volta dos 12 milhões de euros. De facto, e apesar das subidas de sete por cento nas quantidades comercializadas e de 8,4% em valor, o volume de negócios rondou apenas os 500 mil euros. Todos os restantes segmentos evidenciaram as dificuldades do mercado, registando variações negativas e sempre mais expressivas em valor. Os after shave, em 2001 e 2002 também cresceram favoravelmente, mas nos anos seguintes o valor de mercado já desceu, acentuando-se o registo em 2004, com uma quebra de seis por cento, sensivelmente o mesmo comportamento que no ano móvel em análise.

Tendência confirmada

Não sendo produtos especificamente para o segmento masculino, merecem ainda uma palavra as categorias de champôs e de desodorizantes pessoais, pois obviamente são importantes no contexto do cuidado pessoal. No primeiro caso, regista-se uma descida de dois por cento nos volumes e uma variação idêntica de 2,2% no valor, com o segmento a gerar montantes de 81 milhões de euros. O subsegmento 2em1 revela um comportamento particularmente negativo, com quebras de 14 pontos em ambos os indicadores, ao mesmo tempo que o anticaspa também desce, cerca de 5% em volume e 2,5% em quantidade. Apenas o champô normal evoluiu positivamente neste período, mas em variações modestas de dois pontos em volume e 0,8% em valor. Mais uma vez, fica demonstrada a contracção de mercado, na medida em que a categoria evoluía em ritmos entre os seis e os nove por cento entre 2001 e 2003.

Nos desodorizantes pessoais, depois de um aumento de 16% em 2001 e de sete pontos nos dois anos seguintes, em 2004 a Nielsen reportava já uma quebra de 2%, que no ano móvel considerado ainda se acentuou mais, para uma variação negativa de 3,6 pontos, o que corresponde a vendas de 44 milhões de euros. Em volume, também se verificou uma oscilação negativa de 3,4 por cento no período em análise. Pormenorizando, verifica-se que as propostas roll-on, constituindo o maior subsegmento com vendas de 21 milhões de euros, são ainda assim o único segmento que cresce favoravelmente, mas em ritmos moderados de 1,9% em volume e 1,2% em valor.

Estas variações, contudo, não chegam para contrariar as quebras sentidas em todas as outras propostas dentro do universo de desodorizantes. De facto, aerosol, creme, gel, stick ou vaporizador, foram todos segmentos que desceram tanto em quantidade como nos montantes comercializados, com particular incidência nos casos do creme, gel e vaporizador. O mercado de cuidado pessoal masculino, portanto, encontra-se em nítida contracção. E não são esperadas grandes inversões de tendência enquanto o contexto económico não se alterar.