Distribuição

Hegemonia renovada

Por a 2 de Setembro de 2005 as 18:07

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A Wal-Mart voltou a dominar o retalho internacional em 2004, liderando o ranking dos principais operadores mundiais com uma facturação de 249 mil milhões de euros. Valor que coloca o gigante norte-americano numa posição destacada em relação ao segundo classificado, Carrefour. De realçar, ainda, os bons desempenhos de Tesco, Aldi e Schwarz Group que contribuíram para a dinâmica do mercado.

Suportado por uma rede de seis mil lojas espalhadas por treze países, a Wal-Mart reforçou, no ano passado, a posição de líder incontestável do retalho internacional com uma facturação bastante acima do seu rival mais directo, Carrefour, que não conseguiu ultrapassar a fasquia dos 91 milhões de euros. O operador norte-americano registou acréscimos nas vendas na vertente alimentar (responsável por 45% das vendas no exercício do ano transacto) através da expansão e conversão do seu formato de desconto em lojas Supercenter e da aquisição dos hipermercados Bompreço, no Brasil, à holandesa Ahold. Apesar do forte crescimento evidenciado em alguns dos mercados externos, o mercado interno continua a representar o núcleo das vendas do grupo (reunindo cerca de 78% da receita global), que para uma maior penetração no espaço europeu não descarta a hipótese de estabelecer parcerias, além de continuamente procu rar oportunidades para entrar em novos mercados com representação directa, casos de Itália, Rússia, Turquia, América Latina e Índia.

A distância face ao segundo maior distribuidor continua a ser enorme – quase três vezes mais vendas – mesmo que a Wal-Mart se mantenha bastante concentrada no seu país de origem, o que, aliás, constitui uma tendência generalizada dos operadores daquele país. O desempenho dos norte-americanos, registe-se, é fortemente conseguido através das vendas não-alimentares, que representam mais de metade da sua facturação.

Desempenhos modestos

Com um crescimento modesto nas vendas apuradas no mercado doméstico e América Latina, o Carrefour registou um acréscimo de três pontos percentuais. Perante um depressivo mercado interno, a insígnia acredita que o crescimento terá que advir de actividades fora de portas, na medida em que o mercado francês representa apenas 35% da receita global. Nesse sentido, o grupo procura tomar o controlo das operações dos retalhistas Gima e Endi na Turquia, situação que, caso aprovada, poderá catapultar as insígnias para a frente do mercado turco. No entanto, as movimentações do grupo francês na Turquia não se ficam por aqui, especulando-se, presentemente, acerca da possível tomada de posse do operador Tansas, o que iria consolidar a posição de liderança desta insígnia no respectivo mercado.

A holandesa Ahold continua a sofrer os efeitos da má gestão corporativa e financeira, com as saídas da Ásia, América Latina e Estados Unidos a causar uma quebra de 5% nas vendas, a que correspondeu um total facturado de 70 mil milhões de euros, 83,4% dos quais com origem em mercados externos. A insígnia germânica Metro viu as vendas crescerem 3%, ultrapassando a fasquia dos 60 mil milhões de euros e assegurando a quarta posição da tabela. Na base do crescimento assinalado esteve o volume de vendas apurado no mercado interno, Europa de Leste e Ásia, impulsionado pelo sucesso das operações de cash&carry e dos formatos de bens electrónicos de consumo, Media Markt e Saturn.

Tesco em alta

No entanto, a verdadeira dinamizadora do topo da classificação foi a Tesco, ao destronar a Kroger do quinto lugar com um acréscimo de 10% nas vendas e uma facturação a rondar os 55 mil milhões de euros. Diversos factores estarão na base do sucesso da insígnia britânica, entre os quais se inclui um conjunto dinâmico e flexível de formatos extensível desde hipermercados a lojas de conveniência em mercados desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, preços agressivos, uma forte marca própria e uma extensa oferta não-alimentar. A insígnia continua a obter bons resultados no mercado doméstico, responsável por cerca de 80% do total de vendas, enquanto que a recente entrada nos mercados japonês e chinês assegura o seu posicionamento estratégico nos crescentes mercados asiáticos. Apesar do sector não-alimentar, especialmente roupa e equipamento eléctrico, desempenhar um papel importante no acréscimo das vendas, é a alimentar que continua a ser a principal área de negócio, tendo sido responsável por cerca de 74% da receita total.

No Reino Unido, a Tesco tem manifestado argumentos para competir com o titã Wal-Mart, quer no canal alimentar quer no não alimentar, situação que não se verifica nos mercados asiáticos. Apesar de ultrapassada pelos norte-americanos no Japão, China e Coreia do Sul, a dimensão dos mercados e as diferentes abordagens de penetração adoptadas pelas insígnias, confere a ambas francas oportunidades de crescimento. Futuros encontros poderão ocorrer, ainda, na Turquia, Rússia ou Índia, existindo rumores de que a Tesco poderá entrar no mercado norte-americano através de uma possível parceria com a Target, sendo esta hipótese, presentemente, meramente especulativa.

Dinâmica de discount

Um pouco mais abaixo na tabela, a presença em 15.º e 16.º lugar da classificação, respectivamente, dos discounters alemães Schwarz Group e Aldi não pode ser ignorada, reunindo as insígnias um total combinado de cerca 74 mil milhões de euros. Ao longo do ano transacto, o Schwarz Group apurou uma variação positiva nas vendas de 10,4%, o que lhe permitiu aproximar da fasquia dos 37 mil milhões de euros e ultrapassar a Aldi, ainda que por uma margem mínima.. A sua presença externa estende-se a 19 países, estimando-se que dê entrada em mais seis ao longo deste ano, reforçando a sua aposta nos mercados em desenvolvimento do Leste europeu. Assinale-se que os mercados externos são responsáveis por cerca de 42% do total de vendas do grupo. Com menor presença nos mercados externos, 12 países mais concretamente, a Aldi encara como potenciais mercados a Noruega, Polónia, República Checa e Suíça, recebendo indicadores positivos da recente entrada nos mercados espanhol e australiano. Embora não se assuma como uma insígnia com ambições expansionistas, a Aldi procura com esta abordagem a novos mercados impedir a saturação do formato no país de origem, Alemanha, e, simultaneamente, recuperar das quebras nas vendas e lucros apurados no mercado doméstico. Portugal é outro dos objectivos da companhia, que já está registada comercialmente no País, especulando-se sobre uma possível aquisição a Sul.

Os discounters têm causado algum impacto nos grandes operadores (principalmente na Europa Central, região onde a sua presença e consequente influência é mais sentida) conduzindo a que parceiros de mercado, como a Tesco, por exemplo, accionem mecanismos de resposta de modo a combater a sua popularidade crescente, através de reduções agressivas no preço e actividades promocionais. Em termos de previsão do mercado, o formato de desconto afigura-se como o mais dinâmico na segunda metade desta década, com o número de lojas a evoluir cerca de 30% entre 2004 e 2009, enquanto que o número de aberturas de supermercados será comparativamente mais moderado.

Previsões a cinco anos

Segundo os valores actuais e não contabilizando aquisições ou entradas em novos mercados que poderão alterar os dados disponíveis, previsões de mercado até 2009 apontam para que a Wal-Mart continue a dominar o retalho internacional, através da significativa expansão dos formatos Supercenter nos EUA, Asda no Reino Unido e da consolidação de todos os formatos da insígnia no país vizinho, México. Estima-se, ainda, que a Ahold caia para o quinto lugar da tabela, sendo superada pela Metro (cujas vendas nessa data deverão ser maioritárias nos mercados externos, com 54,1%) e pela britânica Tesco, que deverá manter a dinâmica de crescimento evidenciada nos últimos tempos. O grupo constituído por AEON, Casino, Sears e Schwarz Group deverá fechar o leque dos dez principais retalhistas mundiais em 2009, substituindo a Kroger, Rewe, Target e Costco, cadeias muito concentradas nos mercados domésticos. A provável entrada do Schwarz Group no top 10 é ilustrativa da evolução que deverá marcar a actividade da insígnia um pouco por todo a parte, através da exploração dos formatos Lidl e Kaufland.

Independentemente da dimensão das respectivas redes, uma das alterações mais visíveis no contexto das futuras vendas diz respeito à contribuição dos mercados externos para a receita global. De uma forma geral, a importância das vendas dos mercados externos irá aumentar, tornando-se mesmo maioritárias no caso da Ahold com 82,4% (à semelhança do que se tem verificado até aqui), Carrefour (mais 6,9% em 2009) e Metro Group (mais 6,4% em 2009). O Schwarz Group deverá atingir um equilíbrio nas vendas com 50,6% para o mercado doméstico e 49,4% para o externo, cenário que no caso da francesa Casino não deverá ser muito diferente (55,7% mercado interno e 44,3% externo). Estas alterações no mix de vendas terão as naturais repercussões a nível dos contratos estabelecidos, preços e actividades promocionais. Os esforços da Wal-Mart para reduzir preços, em conjunto com um forte crescimento dos formatos de desconto, estão a ter um impacto visível no panorama retalhista internacional, existindo ao longo do ranking sinais de como os operadores estão a reavaliar a sua operação, de forma a reduzir custos e a oferecer preços mais baixos, através da introdução de marcas próprias, novos formatos de loja e da racionalização da cadeia de valor.

Paralelamente, diversos operadores procuram aumentar a escala das operações, por meio de fusões, aquisições e crescimento orgânico, quer no mercado doméstico quer nos mercados externos, de forma a possuirem uma base de negociação mais sólida com os fornecedores. A internacionalização é vista como uma solução inevitável face à saturação dos mercados mais desenvolvidos.