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O novo normal, por Pedro Silva (Deloitte)

Por a 7 de Dezembro de 2017 as 12:43

O contexto económico e social, a demografia e a tecnologia estão a transformar os padrões de consumo. Pedro Miguel Silva, sócio de Consultoria de Retail & Consumer Products da Deloitte Portugal, explica na primeira pessoa como é que os distribuidores podem tirar partido das mudanças em curso

 

“Vejo que a minha mulher faz um enorme esforço em termos de refeições e de cuidados com ela própria. (…) deixámos de jantar fora,… não quer dizer que uma vez por outra não o façamos (…) mas hoje valorizamos a escassez. Mas depois, tudo bem, ela tem sido espectacular. Vai ao Continente, vê tudo o que está com preços mais baixos, faz as suas opções de compra em função disso.

Mafalda e Alfredo, 43 e 45 anos, 3 filhos, Lisboa*

A última década assistiu a mudanças significativas na estrutura económica, demográfica, social e tecnológica das famílias portuguesas, as quais tiveram um impacto significativo na forma como são avaliadas e concretizadas as suas escolhas de consumo.

Do ponto de vista económico, vivemos um período prolongado de maior instabilidade e incerteza face ao futuro, a que se alia uma elevada taxa de desemprego jovem. Em consequência, o consumidor tornou-se menos impulsivo e mais sensível ao preço, ponderando a escolha entre o que realmente necessita e o que deseja. Transferiu momentos de consumo de fora para dentro do lar e popularizou as refeições preparadas em casa e agora consumidas no local de trabalho.

A demografia mudou, assistindo-se a cada vez mais baixos níveis de natalidade e maior esperança média de vida. Somos uma população em envelhecimento e por isso mais consciente da importância de hábitos de vida saudáveis e da adoção de medidas que nos possibilitem uma melhor qualidade de vida. O aumento da informação disponível deu também aos consumidores maior conhecimento, sensibilidade e educação, encorajando alguns, normalmente os mais afluentes, a pagar mais por produtos que consideram mais benéficos.

Somos também uma sociedade mais igual, em que homens e mulheres se sentem mais livres para perseguir, nos seus próprios termos, os seus objetivos pessoais e profissionais. Estamos mais dispostos a pagar para evitar consumos de tempo desnecessários e diminuir o tempo consumido na concretização da compra e do consumo. A conveniência e a poupança de tempo tornaram-se fatores determinantes para as nossas decisões de consumo, levando a uma maior procura pelas lojas de proximidade e por serviços de take-away e entrega em casa.

A tecnologia passou a ter uma presença constante nas nossas vidas via o uso massificado de dispositivos digitais móveis (smartphones). O online ganhou importância nos hábitos de consumo, resultado da maior convergência entre espaços de compra físicos e digitais, mas também da ascensão aos mercados de consumo das gerações de nativos digitais. Os motores de busca e as redes sociais, em particular, são hoje os meios mais usados para a busca de inspiração, pesquisa e comparação de preços.

“Estou convencida que nós somos aquilo que comemos. Não sou fundamentalista mas preferencialmente prefiro ser eu a fazer a minha própria comida para controlar o que as coisas levam e, também, porque me sabe melhor (…) Sempre que posso tento consumir o que é português (…) Das coisas que me interessam mais é o contacto pessoal, saber exatamente quem é a pessoa que vem entregar as coisas [cabazes de frescos] a casa…”

Mariana, 30 anos, solteira, Lisboa*

Existe assim um novo normal, definido por um consumidor mais “inteligente”, que exige mais dos produtos que consome pelo mesmo preço. Atributos de marca que antes constituíam fatores de diferenciação – como Saúde, Conveniência e Confiança – foram assimilados pelo mass market e fazem hoje parte dos padrões mínimos dos alimentos que consumimos. O consumidor “elevou a fasquia”, revendo continuamente em alta os atributos mínimos que está disposto a comprar e espera que os mesmos lhes sejam disponibilizados ao preço de entrada na categoria.

Para se manter e continuar a diferenciar no mercado, a Distribuição Moderna deve ver nesta mudança uma oportunidade para captar novos segmentos de consumo, mais rentáveis e com maior potencial de crescimento. Os seus lineares têm de oferecer propriedades superiores em, pelo menos, um dos atributos valorizados pelos seus consumidores e comunicar de forma transparente e continuada o seu valor adicional.

Deve também ser mais inovadora e hábil na utilização de canais digitais, que são cada vez mais o veículo preferencial para consumo de informação e entretenimento. Deverá fazer deles não só um meio de comunicar ao público a sua mensagem, mas também um local onde mede as reações do consumidor, antecipa crises e testa novas oportunidades.

O consumidor tem hoje um conhecimento muito mais profundo, imediato e atualizado dos alimentos que consome e das empresas que os comercializam. Cabe agora às empresas responder na mesma moeda, redescobrindo e reapresentando-se aos seus consumidores.

*Entrevista recolhida pelo C – The Consumer Intelligence Lab

 

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