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Quando a geografia dá coordenadas ao marketing, por Susana Costa e Silva (Católica Porto) 

Por a 12 de Fevereiro de 2014 as 16:59

Por Diogo Cruz e Daniela Leite, alunos do Mestrado em Gestão da Faculdade de Economia e Gestão da UCP – Porto, e Susana Costa e Silva, professora, investigadora e directora do Departamento de Marketing da mesma escola

O geomarketing ou marketing geográfico não é mais do que uma abordagem diferente de marketing que vem alterar a forma como o marketing-mix de determinada empresa é definido.

Mas, afinal, o que é o marketing geográfico? Quais são as implicações benéficas que esta abordagem traz às empresas? De que forma é que pode ser usado? Quais são, realmente, as suas aplicações? São estas algumas das perguntas que pretendemos esclarecer neste artigo.

O marketing geográfico, também conhecido por geomarketing, é uma abordagem do marketing que surge da junção das disciplinas do marketing com a geografia. Assim, o marketing geográfico vem trazer uma nova dimensão, a dimensão espacial, ao estudo e à análise dos fenómenos sócio-económicos, comportamentais, demográficos e estatísticos de um determinado mercado, fenómenos estes que sempre estiveram presentes nos estudos e estratégias de marketing.

O geomarketing combina diversas variáveis, tais como as informações de cariz social (como a idade, o sexo e o nível de escolaridade), informações de cariz económico (como o nível de salários e o potencial do mercado), com a geografia (sobretudo mapas e plantas). Esta combinação permite, assim, uma melhor compreensão da realidade do mercado, podendo as empresas tirar um grande partido desta situação, uma vez que várias camadas de informação sobre os clientes, numa dada zona geográfica, permitem aceder a um maior conhecimento dos seus clientes actuais e potenciais.

Assim, é possível verificar qual a influência de determinada localização sobre os concorrentes, actividades de consumo e sobre as variáveis do marketing-mix. As empresas utilizam os SIG (Sistemas de Informação Geográfica), constituído por um conjunto de ferramentas que permitem integrar e sobrepor vários tipos de informação com a informação geográfica (espacial). Esta sobreposição, tal como já foi referido, permite cruzar a informação, tendo assim, um maior conhecimento sobre uma determinada zona geográfica. A utilização dos SIG estende-se a vários sectores de actividade, mas destaca-se a sua utilização nos sectores da banca, seguros, imprensa, empresas de logística (retalhistas, grossistas, transportes, entre outros), sector imobiliário, publicidade, administração pública e regional, educação, entre outros.

A geografia tem como função dar as coordenadas ao marketing, coordenadas estas que permitem a uma empresa conhecer melhor o seu mercado, nomeadamente quem compra e onde é que compra, com que frequência o faz, entre outros. Permite ainda responder a questões como “onde estão localizados os clientes ideais?” ou “ onde estão as áreas de potencial inexplorado no mercado?” ou ainda, “onde estão as condições ideais para abrir um determinado negócio?”, permitindo assim uma melhor adaptação do seu marketing-mix.

Assim, à medida de cada segmento de mercado é identificado e delimitado no mapa identificam-se também quais os locais que têm um maior potencial de consumo depara o serviço ou produto em questão. De facto, esta informação é importante, senão vejamos: não seria lógico abrir uma ourivesaria num local onde não existissem potenciais clientes em número suficiente para justificar o seu investimento, ou num local onde os custos de mão-de-obra e de transporte encarecessem de tal modo o custo unitário do produto que não justificasse a exploração do negócio.

Quando se fala de marketing geográfico, o primeiro pensamento que nos surge é uma segmentação por países ou regiões. No entanto, esta abordagem é muito redutora uma vez que, apesar de pertencerem a um determinado país ou até região, os clientes não têm, necessariamente o mesmo perfil e as mesmas necessidades, ou seja a delimitação fronteiriça geográfica não tem que coincidir com a delimitação por segmentos que é feita pelas empresas. Cada vez mais o estudo para a segmentação geográfica é feita ao nível do município, freguesia, código postal e até mesmo morada individual, para assim, se conseguirem definir as oportunidades reais de uma determinada zona geográfica consoante as necessidades reais dos clientes e respectivas condições de vida, poder de compra, entre outros.

O marketing geográfico vem dar ao marketing as condições para que seja possível refinar o marketing-mix para diferentes segmentos, bem delimitados num mapa, segmentos estes muito mais específicos do que aqueles que resultariam de uma mera segmentação por países, como foi referido antes. Por isso, é uma ferramenta cujo contributo se faz sentir em qualquer um dos tradicionais 4 P’s.

Relativamente à variável produto, o geomarketing permite uma adaptação deste às características específicas de uma determinada zona/segmento de mercado ou até às características de uma área de influência de uma determinada loja.

Neste caso, o marketing geográfico é especialmente útil para empresas de retalho, permitindo assim que estas adaptem o seu sortido de produtos às características dos clientes que fazem parte da área de influência da sua loja. Por exemplo, é muito diferente o sortido que gera uma maior rentabilidade a determinada loja se esta estiver localizada perto de um pólo universitário ou se estiver localizada numa zona em que existam muitos reformados.

Relativamente à variável preço, o geomarketing permite uma adaptação do preço dos produtos à estratégia de vendas definida para uma determinada zona/segmento de mercado, seja de penetração, manutenção da posição, entre outras. Assim, consoante, por exemplo, a demografia, poder-se-ão definir descontos de preços e campanhas promocionais por exemplo.

No que toca à comunicação, o facto de esta ser direccionada apenas para a zona/segmento que realmente tem influência para uma determinada loja, permite à empresa reduzir custos e aumentar a eficiência nos contactos. Por exemplo, o Google Adwords, permite às empresas direccionarem os seus anúncios apenas para as zonas geográficas pretendidas. As empresas só necessitam escolher as palavras-chave que definem o seu negócio e a zona geográfica para onde se dirigem. Desta forma, as empresas conseguem aumentar a eficácia da sua comunicação uma vez que quando um potencial cliente (que esteja na zona geográfica definida pela empresa) for ao Google pesquisar uma determinada palavra-chave relacionada com o negócio dessa empresa, a probabilidade do anúncio aparecer como resultado de pesquisa na primeira página é muito maior. A empresa só paga por cada vez que alguém “clique” no seu anúncio, por isso consegue baixar significativamente os custos com a comunicação (comunicação/promoção direccionada). Assim, quanto fazemos uma pesquisa no Google com as palavras “dentista porto” aparecem, para além dos resultados habituais, resultados patrocinados, relacionados com as palavras-chave utilizados para a pesquisa em cima ou ao lados dos resultados habituais.

Já sobre a distribuição, através do estudo da localização ideal para determinado negócio, é possível as empresas optimizarem o seu investimento em infra-estruturas (o preço por metro quadrado é uma componente de custo fixo a ter em conta, assim como o custo de transporte), escolherem as melhores rotas para a entrega de mercadoria, optimizarem as visitas a clientes, assim como estudarem a prospecção de mercado que desejam levar a cabo, sempre tendo em conta o tipo de negócio e o público-alvo.

O marketing geográfico é uma ferramenta importante e fulcral, pois ajuda a perceber qual a área geográfica em que determinado produto vai ter maior aceitação, a que preços, que tipo de promoção deve de ser aplicada, como pode servir como base de estudo para determinar a melhor localização para um negócio, o que pode constituir uma enorme vantagem competitiva para quem o adopte.

Segundo Ray Kroc, fundador da McDonald’s, os três factores decisivos de um negócio fast-food são “location, location, location”. A McDonald’s faz a sua expansão de negócio, de forma internacional e sobretudo através de franchising, sendo que para nos candidatarmos ou propormos um franchising de um negócio num determinado local, o mesmo tem que obedecer a vários critérios, nomeadamente em termos de demografia, densidade populacional, raio de abrangência/sobreposição de outros restaurantes da marca, concorrência na vizinhança, localização de fornecedores, entre outros. E o grau de sucesso de um restaurante de McDonald´s é elevadíssimo. Assim, a marca, para a sua expansão, tem duas alternativas: na primeira, potenciais franchisados propõem ou fazem licitações para abrir um estabelecimento, sendo que a McDonald’s analisa o cumprimento dos pré-requisitos dos possíveis franchisados, (através das ferramentas de marketing geográfico. Na segunda alternativa, a multinacional pode abrir novos estabelecimentos sendo que, para isso, escolhe determinadas localizações, avançando depois sozinha ou permitindo que eventuais franchisados invistam em seu nome.

A aplicabilidade e a importância do geomarketing como ferramenta de negócio são relevantes. De facto, possui uma amplitude de aplicação enorme pelo que constitui uma importante componente da estratégia de marketing de empresas em sectores como a banca, seguros, retalho alimentar, transportes, extracção mineira, fast-food, imobiliário, hotelaria, entre outros tantos, seja de empresas que efectuem negócios B2B ou B2C. Abaixo estão dois exemplos da aplicação prática do geomarketing:

1) A administração pública como um todo utiliza o marketing geográfico para gerir de forma eficiente por exemplo a localização de escolas e universidades, no caso do ordenamento do território e nos gabinetes de planeamento municipais e regionais.

2) Campanha Publicitária CTT. Nesta campanha temos como cliente uma cadeia de lojas de produtos de beleza e estética com lojas em Portugal Continental e cujo público-alvo são mulheres de classe média entre os 25 e 65 anos de idade. A forma de actuar aqui consistiu na entrega porta-a-porta (GeoIndex CTT) em moradias com mulheres de 25 a 65 anos (INE) de classe média (Sales Index Marktest) que estivessem na área/raio de cobertura das lojas (Cliente). Adicionalmente, dentro do limite de actuação dos CTT houve uma distribuição para cada carteiro consoante o código postal para entregar nas portas certas.

A aplicação ou aplicabilidade do geomarketing ou marketing geográfico pode assentar na adaptação da oferta dos produtos, adequando-se a disponibilidade dos produtos, a sua apresentação, o preço e outras características às características do local, ao perfil dos clientes de determinado local, à localização dos clientes, à forma como os mesmos interagem entre si (numa comunidade unida podemos tirar partido do boca-a-boca), divisão do território de vendas, adaptando-se assim os recursos da organização, ou definindo-se o território de vendas de forma a rentabilizar o máximo possível os recursos da empresa. Com o geomarketing, também é possível a (re)formulação do preço por zona ou segmento, a redução de custos e implementação de melhorias da promoção de produtos ou serviços através de uma publicidade direccionada e adaptada à localização dos clientes ou potenciais clientes. Assim, o marketing geográfico traz às empresas a possibilidade de, cada vez mais, adaptarem o marketing-mix à medida de uma determinada região bem segmentada num mapa e espera-se que num futuro próximo seja possível através de diversas tecnologias, como o GPS, RFID, geoposicionamento e outras ferramentas, adaptarem o seu marketing-mix à medida de cada cliente individual (morada individual), a exemplo do que assistimos no filme Minority Report, em que a publicidade era dirigida ao indivíduo através de reconhecimento por leitura da íris. Actualmente, já existem empresas que utilizam técnicas que permitem obter informações acerca dos seus clientes para, desta forma, obterem mais informações sobre estes e utilizarem essas informações para adaptar o seu marketing-mix à medida dos seus clientes.

Temos como exemplo a empresa italiana Almax que tem uma câmara embutida no olho de um manequim, conseguindo identificar a idade e o sexo e a cor de pele do consumidor. Outro exemplo acontece no Japão, onde a empresa NEC utiliza o reconhecimento facial para medir quantas vezes as pessoas compram numa determinada loja. Em 2012, em Londres, a empresa Plan UK, instalou numa estação de metro de Oxford, câmaras de reconhecimento facial de alta definição que analisavam e adivinhavam o sexo baseado em características faciais específicas do queixo, maçãs do rosto, nariz e olhos e, consoante o resultado, o dispositivo mostrava uma publicidade específica para o sexo da pessoa em questão.

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