Outras Opiniões

Riscos para 2007 – inflação ou recessão

Por a 19 de Janeiro de 2007 as 16:15

alexandre mota

As actuais políticas monetárias da Reserva Federal Americana e do Banco Central Europeu elegem a inflação como o principal inimigo.

Nos EUA, as minutas do FED relativas à reunião de Dezembro relevam os riscos inflacionistas como os mais importantes na actual conjuntura económica, embora alertem para outros riscos relacionados com a desaceleração económica. Neste contexto, o FED não vislumbra sinais de contágio entre as quedas de preços do mercado imobiliário e do sector automóvel e os restantes sectores da economia. Todos os membros do comité votaram a favor da manutenção da tendência de subida das taxas de juro (“tight bias”), com a excepção de um elemento do comité que preferiria a adopção de uma postura neutral (“neutral bias”). Os recentes dados do emprego validam a actual postura do FED, pois a economia americana criou 167.000 postos de trabalho em Dezembro, acima do consenso que era de +100.000. Adicionalmente, os dados de Novembro também foram revistos em alta e a taxa de desemprego estabilizou nos 4.5%.

Na zona euro, o presidente do Banco Central Europeu tem alertado para os riscos inflacionistas, sinalizando mais subidas de taxas de juro em 2007. Os dados económicos divulgados validam a postura do banco central. A confiança dos industriais está perto dos máximos e a do consumidor está a recuperar. Há algum decréscimo no retalho, mas em termos genéricos os níveis de confiança estão nos máximos, revelando uma economia europeia dinâmica, impulsionada pelo investimento e pelas exportações. O impacto da subida do IVA na Alemanha é encarado como reduzido. Por último, o BCE continua a vigiar o comportamento da FED, aliando-se a este numa visão essencialmente anti inflacionista.

Poderão os bancos centrais estar errados?

Segundo alguns analistas os bancos centrais poderão estar a adiar demasiado uma inversão da política monetária, pois a inflação já não é um risco significativo. O principal risco é uma desaceleração económica mais profunda do que o antecipado. A argumentação também nos parece teoricamente sólida. Vejamos:

Nos EUA, a queda dos preços do crude e restantes produtos energéticos reduziu bastante a pressão sobre os preços. Contudo, a queda do mercado imobiliário poderá transmitir-se aos restantes sectores da economia, com efeitos significativos ao nível do emprego, do consumo e do produto. Neste contexto, taxas de juro a 5.25% revelam-se uma “overdose” de cura contra a inflação, mas que não resolve o problema de fundo: o potencial recessivo da actual conjuntura económica, com origem no mercado imobiliário. Segundo a abordagem destes analistas, o FED deveria cortar taxas de juro pelo menos 100 pontos base ao longo de 2007 (de 5.25% para 4.25%) e, no caso de levar a cabo mais uma subida (para 5.50%), as consequências poderão ser perversas.

No que diz respeito à Europa, o BCE acredita que a desaceleração económica americana continuará a ser suave, que a Europa não está demasiado vulnerável a essa desaceleração e que os efeitos do aumento do IVA na Alemanha serão diminutos. Neste sentido, o banco central prossegue a sua cruzada anti-inflação que, pelas mesmas razões referidas para o caso americano, poderá ir longe demais. Segundo a abordagem destes analistas, o BCE deveria manter as taxas de juro nos 3.5% durante algum tempo, vigiando conveniente o potencial recessivo duma desaceleração económica americana.

E Portugal?

A economia portuguesa continua a divergir dos parceiros europeus. Essa situação explica-se em grande parte por um processo de ajustamento orçamental do Estado e das famílias, claramente visível nos baixos níveis de consumo privado e público. De facto, o elevado nível de endividamento público e privado não convive bem com subidas de taxas de juro. A par disso, em Portugal é visível uma estagnação no mercado imobiliário, com um aumento significativo dos stocks de casa para venda e um declínio na construção. Estas fragilidades da economia portuguesa deverão continuar a prevalecer nos próximos anos, sendo que a actual política monetária do BCE não é uma boa notícia para o consumidor/devedor. Vejamos se essa política é ajustada e se prosseguirá sem “overdoses” especialmente penalizadoras para economia portuguesa.

Conclusão

Os decisores monetários já cometeram erros no passado. Neste momento não é claro que o caminho escolhido seja mais correcto. Uma alteração da política monetária demora algum tempo a surtir os seus efeitos e sempre nos parece melhor arriscar um pouco mais de inflação do que uma desaceleração económica significativa. Apesar dos sinais contrários dados ultimamente, é provável que ao longo de 2007 haja uma inversão de política.

Alexandre Mota, Analista da Golden Assets, Sociedade Gestora de Patrimónios