Outras Opiniões

Consumo marca passo

Por a 8 de Dezembro de 2006 as 12:11

alexandre mota

Alexandre Mota, Analista da Golden Assets, Sociedade Gestora de Patrimónios

A economia portuguesa está a passar uma fase em que os indicadores macroeconómicos dão sinais mistos. O ritmo das exportações, à semelhança dos nossos parceiros europeus, regista uma dinâmica muito apreciável. Contudo, no que diz respeito ao consumo privado e ao investimento, ainda não há sinais de reanimação.

Como sustentáculo das exportações temos uma conjuntura externa francamente favorável, o que poderá ser confirmado de várias formas:

– Na zona euro, os dados relativos ao crescimento económico, embora com oscilações pontuais (por exemplo, em França o crescimento do PIB no terceiro trimestre foi nulo), confirmam uma tendência positiva na actividade económica, a qual se situa ligeiramente acima do crescimento potencial. Esta conjuntura tem sido sustentada pela dinâmica das exportações e pela reanimação do consumo privado.

– Na Alemanha, a confiança dos empresários, medida pelo índice IFO, atingiu um novo máximo, com destaque para uma avaliação positiva da situação presente devido à dinâmica da procura interna. Em termos sectoriais foi positiva a avaliação da situação presente no sector do retalho, o que deverá estar relacionado com a antecipação de compras antes de entrar em vigor o aumento do IVA. As expectativas para 2007 registaram uma melhoria em termos gerais, embora estejam deterioradas na área do retalho que deverá ser a mais atingida pelo aumento do IVA. Na indústria, as expectativas continuam a apontar para o crescimento das exportações, reforçando a tendência recente.

– A confiança económica que reina no espaço euro poderá ser resumida nas palavras de Joaquin Almunia (comissário europeu para os assuntos monetários) que, à margem do “World Economic Forum”, exprimiu o seu optimismo relativamente à recuperação económica da Europa, apesar do aumento do IVA na Alemanha assim como a possível desaceleração da economia americana poderem criar alguns sobressaltos. Relativamente à política monetária, o comissário europeu considerou que esta não está a criar quaisquer entraves ao crescimento económico, acrescentando que, embora esteja a ser retirada alguma liquidez aos mercados, as condições monetárias continuam benignas e assim devem continuar no futuro.

– Mais recentemente, o presidente da associação dos exportadores alemães instado a comentar a recente subida do euro e a política monetária respondeu que os exportadores alemães poderão viver bem com o eur-usd a 1.3000 (uma subida de cerca de 10% este ano), assim como com a actual política monetária do BCE.

A conjuntura interna revela, por sua vez, um cenário bem diferente. O Banco de Portugal divulgou recentemente as suas previsões para 2006. No que diz respeito ao crescimento do PIB o Banco de Portugal manteve a sua previsão de 1,2% para 2006. Em termos de componentes do produto registe-se a revisão em alta das exportações e a revisão em baixa do investimento (designadamente em construção) e do consumo privado.

Relativamente ao consumo privado, o Banco de Portugal considera que as pressões negativas são significativas, designadamente a subida das taxas de juro, aumento da carga fiscal, estabilização/diminuição dos salários reais e restantes medidas de contenção da despesa pública.

O Banco de Portugal estima que a subida das taxas do BCE de 2% para 3,25% contribuiu negativamente para o crescimento em 0,1%. Este impacto revelou-se modesto devido a mecanismos de engenharia financeira promovidos pelos bancos (por exemplo: deferimento do capital nos empréstimos a habitação). No entanto, o Banco de Portugal alerta que o processo de ajustamento dos orçamentos familiares e da despesa de consumo das famílias pode ser moderado (ou seja, sem grandes sobressaltos), embora mais prolongado no tempo. Em 2007, o Banco de Portugal prevê um crescimento do consumo privado de apenas 1,2% versus uma taxa de crescimento do PIB prevista em 1,5%.

Quanto ao investimento privado, o desfasamento entre o crescimento desta rubrica da PIB e as exportações está em linha com a média histórica, revelando que os empresários pretendem aferir da sustentabilidade do crescimento das exportações. Em termos de países há um aumento das vendas para parceiras tradicionais como a Espanha ou Alemanha, mas também a conquista de novos mercados, designadamente Angola com um crescimento de 60%.

Conclusão, a economia portuguesa tem e terá nos próximos tempos duas faces. Uma face mais risonha, que beneficia da conjuntura externa favorável e de ganhos de quota em novos mercados e uma face menos risonha que é a do consumidor médio, simultaneamente devedor médio que vive um processo de ajustamento orçamental eventualmente longo.