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Vegetais equilibram mercado

Por a 7 de Outubro de 2005 as 15:50

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O mercado de conservas e enlatados tem vindo a fazer um esforço no sentido do desenvolvimento de novos segmentos de mercado, essencialmente devido à elevada maturidade dos produtos mais tradicionais. As conservas de peixe continuam a ser dominantes, mas os vegetais e produtos de tomate estão a aumentar penetração, ainda que com claras políticas de reposicionamento de preço.

As conservas de vegetais têm vindo a dinamizar este mercado, pois estão a ganhar importância face aos restantes segmentos de mercado. Ao comparar directamente os principais segmentos deste universo, verifica-se que os vegetais valem 62% (43.404 mil euros) do conseguido nas vendas de conservas de peixe, as quais atingem 69.667 mil euros. Percentagem significativa e que se torna ainda mais expressiva ao olhar para os dados de 1995, altura em que valiam cerca de metade (32%) do total de negócio das conservas de peixe (68.616 mil euros).

Esta análise, contudo, apenas é válida para o mercado em volume, com os vegetais a aumentarem 5, 1% e os produtos de tomate a crescerem 2,5% neste indicador, ao mesmo tempo que as conservas de peixe desciam 1,2 pontos. Em valor, todavia, registam-se decréscimos nos três segmentos (ver quadro), o que mostra a necessidade de recentrar preço. Paralelamente, é possível verificar que os segmentos tradicionais encontram-se em fase de maturidade, com o mercado a ser impulsionado pelas novas propostas que as empresas têm vindo a desenvolver.

Este facto (o crescimento de cinco pontos sentido nos vegetais em conserva) demonstra que o segmento não só suportou o desenvolvimento de outras formas de apresentação (frescos, ultracongelados, etc.), mantendo o crescimento próprio de forma positiva, como os vegetais consolidaram a sua presença no mercado por meio de propostas diversificadas, o que lhes permitiu manter vendas acima da média do mercado ao longo dos últimos anos.

O ano de 2005 foi, no entanto, uma excepção nesta tendência no segmento de vegetais em conserva, ao apresentar uma ligeira declinação em valor (-0,9), indiciando que o mercado caminha para a estagnação, apesar do aumento de cinco por cento nas quantidades transaccionadas (28.410 mil kg). Isto significa que houve necessidade, por parte da indústria, de repensar as políticas de posicionamento de preços, mediante o cenário generalizado de retracção no consumo e que atingiu também a performance deste mercado.

Estagnação que, segundo Luísa Silva, gestora de marca da divisão de negócios vegetais e tomate da Compal, «provoca a desvalorização do espaço de linear». Situação que se deve «à aposta em marcas de menor valor, que tem reduzido o espaço de produtos com “Marca” e de maior valor, o que faz com que a rotação e reposição dos lineares aumente, ou seja, implica maiores custos logísticos, sem trazer maior retorno à categoria». De acordo com a responsável, «a marca pode ser vista como um factor relevante no momento do consumidor escolher uma determinada referência. No entanto, tem sido colocada cada vez mais num segundo plano, dando-se maior relevo ao preço, visto que a categoria em causa é considerada uma “commodity”. Em relação ao preço praticado, com o aumento da importância das marcas que conquistam consumidores via preço e com o aumento das acções promocionais, deparamo-nos com autênticas “guerras” entre marcas e insígnias, o que para o consumidor resulta numa descida de preços». Também a nível da apresentação do linear tem-se testemunhado a evolução deste mercado, com os fabricantes a disponibilizarem produtos com imagens e embalagens mais apelativas e que têm contribuído para a fidelização dos consumidores a esta categoria.

Outro motivo de interesse, diz respeito à segmentação da categoria que não se resume, presentemente, à divisão tradicional entre feijão e grão que há alguns anos atrás perfazia a sua totalidade e que hoje, no seu conjunto, contribuem com 68% em quantidade e 47% em valor para o volume de negócios. Os cogumelos são uma referência em crescente e valem 20% em quantidade, com as principais marcas de mercado e as marcas de distribuição a contribuírem decisivamente para as 5,7 mil toneladas comercializadas (+6,4%; 13, 8 milhões de euros). Embora numa escala mais reduzida, as gamas complementares de vegetais têm vindo a reforçar a sua contribuição para a totalidade das vendas, ao apurarem 1,9 mil toneladas (+14,2%), volume representativo de um total de 5,6 milhões de euros (+12,9%). Ao apresentar os mais significativos níveis de crescimento da categoria, é possível afirmar que, num mercado pautado pela maturidade e onde as principais categorias se encontram estagnadas, as grandes novidades terão origem na expansão do formato a novas famílias de produtos.

Por outro lado, a oferta em lata dever-se-á manter e desenvolver, fruto da conveniência desta família e também do fim da comercialização da embalagem de vidro por parte de algumas marcas, como, por exemplo, a Compal. «Por opção, a Compal deixou de comercializar esta embalagem que expõe o produto à luz solar e obriga ao recurso de tratamentos especiais para obter um aspecto “limpo” do produto nos lineares. Sendo o nosso lema “Compal é mesmo natural”, a Compal escolheu a embalagem em lata por considerar ser a que melhor mantém a qualidade com que sempre habituou os seus consumidores», considera Luísa Silva. Assinale-se que a embalagem de vidro representa cerca de 20% da oferta do mercado.

Conservas de Peixe.

O sector das pescas sofreu durante os anos oitenta e inícios dos anos noventa uma enorme transformação, tendo as decisões comunitárias conduzido à redução da frota pesqueira e consequente diminuição do número de pescadores, os principais abastecedores da indústria conserveira. Indústria que se caracteriza «pela redução do número de unidades nos últimos anos, com tendência para a estabilização», ideia defendida por José Miranda, director-financeiro da Ramirez e reforçada por Margarita Hermo, responsável de marketing da Jealsa Rianxeira, para quem o mercado de conservas é «um mercado maduro, em que as marcas de distribuição tendem a aumentar a sua quota».

Com um total de 79 milhões de unidades de 120gr, o atum em posta continua a ser a principal categoria deste sector ao crescer 0,7% face a 2004, apurando um total de mais de 55 milhões de euros (participação de 80% em valor e volume no total de negócios do segmento). O atum foi, aliás, a única categoria que resistiu à retracção do consumo, o que evidencia o seu profundo grau de penetração na rotina alimentar dos portugueses. De resto, as restantes categorias que constituem este segmento (sardinhas, lulas, cavala, sub-produtos de atum) apresentaram fortes decréscimos em valor e volume (quebras de dois dígitos), com a sardinha, outra das categorias tradicionais deste sector, a ser única a facturar acima dos 6 milhões de euros (-7,8% em valor), tendo, no entanto, visto a sua participação face ao total de mercado baixar para os 9% (–4% em quantidade, 10.648 mil unidades de 120gr transaccionadas). Além destas variedades tradicionais, verificou-se um alargamento da oferta, com espécies como a lula, a cavala e o polvo a serem hoje em dia presença habitual nos lineares das superfícies comerciais.

A inovação tem sido um dos motores da categoria, verificando-se, também aqui, uma preocupação crescente com a saúde. «Os produtos mais procurados são o atum em óleo, notando-se uma procura crescente nos produtos em azeite e ao natural, possivelmente por parte de uma clientela mais atenta aos benefícios com a saúde. O mercado tem de uma maneira geral correspondido aos esforços de I&D da empresa, que resultaram quer na melhoria dos produtos existentes quer na introdução de novos produtos e apresentações (toda a linha de conservas da empresa beneficiou de um restyling total, utilizando agora uma embalagem em alumínio mais fácil de abrir), como é o caso dos filetes de sardinha sem espinha que atraíram e rejuvenesceram uma nova clientela, nomeadamente, as camadas mais jovens de consumidores», observa o responsável da Ramirez.

Também a Rianxeira considera a inovação fundamental, contando a empresa espanhola «com uma equipa de 40 profissionais no departamento de investigação e desenvolvimento com cerca de 0,5% de investimento sobre o total das vendas.» Em termos de produtos inovadores, «apresentámos as Saladas de Atum e a nova linha Baixa em Sal, além de um novo sistema de abertura, o “solapin” que permite abrir as latas de atum de uma forma fácil e segura», considera a responsável espanhola.

Apesar da melhoria verificada em termos de qualidade da oferta e diversificação dos produtos, no que diz respeito ao preço o responsável da Ramirez considera que «os produtos tradicionais têm-se mantido, ao longo de anos, a níveis anormalmente baixos, ao passo que em produtos de inovação e de especialidades a distribuição tem praticado preços mais elevados». Uma possível solução passaria pelo «equilíbrio e ajustamento de marcação de preços destas variedades que certamente proporcionaria aos consumidores verdadeiras alternativas de escolha, que se traduziria num aumento generalizado de vendas da globalidade da gama de conservas, com ganhos para todos os intervenientes à imagem do que ocorre, por exemplo, em Espanha, onde o consumo per capita de conservas de peixe é quatro vezes superior ao nosso país, resultado, sem dúvida, de uma gama alargada, toda ela a preços acessíveis», analisa.

Preço que constitui uma das principais queixas do sector que, além da forte concorrência espanhola e marroquina nesta matéria, ainda tem de enfrentar a escassez de subsídios e apoios por parte do Governo, que constantemente parece esquecer a qualidade e o prestígio além-fronteiras da produção nacional. Com os principais segmentos em fase de maturidade, é de prever que os eventuais crescimentos venham da capacidade de inovação das empresas, nomeadamente apresentando propostas diferenciadoras ao consumidor final.